Tema que tem suscitado indagações frequentes e polêmicas sem-fim é a forma de recrutamento para os tribunais superiores, com especial interesse pelas vagas no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, o que, atualmente, se faz por ato de nomeação do presidente da República, após sabatina do Senado Federal, de pessoa portadora de notório saber jurídico e ilibada reputação.

Chama atenção o fato de tão poucos magistrados de origem estadual serem escolhidos, no decurso dos dois últimos mandatos presidenciais, para ocupar posições nas mais altas cortes do país. Breve levantamento informa que, nos dois mandatos do presidente Lula, foram guindados ao Superior Tribunal de Justiça seis magistrados estaduais, dentre seus desembargadores.

Ao Supremo Tribunal Federal, apenas um magistrado estadual, originário da carreira, teve reconhecida dignidade para ascender, o ministro Cézar Peluso, natural do Estado de São Paulo, que ingressou no Judiciário paulista em 1968 e, no STF, em 2003. Todos os demais ministros são originários de outras carreiras jurídicas.

No Superior Tribunal de Justiça, por força de regras constitucionais próprias, há maior número de magistrados com origem no Judiciário estadual, vez que reservada terça parte de suas vagas a desembargadores dos Tribunais de Justiça, a serem escolhidos pelo presidente da República a partir de lista tríplice formulada pelo próprio Tribunal da Federação.

Curiosidade constitucional se verifica ao cotejar as regras de recrutamento do Superior Tribunal de Justiça (art. 104) com as relativas ao recrutamento para o Tribunal Superior do Trabalho (art. 111-A, acrescido pela Emenda Constitucional 45, de 2004), que determina reserva de uma quinta parte de suas vagas ao Ministério Público e à advocacia, devendo as demais serem preenchidas, exclusivamente, por “juízes do Trabalho dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior”.

Em se tratando de critérios de provimento de cargos de tribunais superiores, o descompasso entre as normas de acesso referentes à Justiça Comum e à Justiça do Trabalho indica a necessidade de um caminho corretivo, que harmonize com igualdade de soluções a identidade de situação. Aparentemente, o poder constituinte derivado indicou uma tendência de observância da origem, carreira ou quinto constitucional, para investidura nos tribunais superiores, que, no caso do STJ, harmonizaria os incisos do art. 104 da Constituição de 1988.

Noutro vislumbre da questão, a minguada consideração da Justiça estadual na composição dos tribunais superiores, com observância quase que só do mínimo constitucionalmente reservado à classe, está a expor um cenário de encruzilhada para opções igualmente intrigantes: ou o Chefe do Executivo federal desconhece a importância da Justiça Estadual e o valor dos seus integrantes, e, por isso, negligencia na escolha dos nomes postos ao seu escrutínio; ou a cultura personalista do nosso presidencialismo atenta mais à conveniência de governo que à boa formação e aperfeiçoamento do magistrado. Qualquer das alternativas, sem embargo das qualidades ostentadas por nossos atuais ministros, induz necessidade de revisão de critérios e de cultura no processo.

Nota-se, ainda, para tristeza e reflexão da magistratura mineira, que nenhum dos seus membros, em tantas indicações para os tribunais superiores, foi lembrado nos últimos dois mandatos presidenciais.

Neste cenário, como novidade, tramita no Congresso Nacional a PEC nº 68, de 2005, de autoria do saudoso senador Jefferson Peres, que disciplina novo processo de indicação para o STF, segundo o qual caberá às entidades representativas das classes da magistratura, Ministério Público e advocacia a eleição de dois candidatos cada uma, formando lista sêxtupla a ser encaminhada ao próprio STF, que escolherá um nome e o encaminhará ao presidente da República para nomeação. O escopo da PEC, tal como declarado na exposição de motivos por seu autor, é o de conferir autonomia à corte e salvaguardar a nação de nomeações motivadas tão somente por sentimento político, em detrimento da excelência de qualidade que se exige do serviço que presta.

Se aprovada, a PEC 68, de 2005, representará avanço significativo no processo de recrutamento para o STF, devendo ser adotado também para o STJ, com isso evitando tantos dissabores que a via atual vem suscitando. O que importa é superar barreiras que confinam a presença do Judiciário estadual à mínima participação, constitucionalmente prevista, na composição dos tribunais superiores.

Todos estes temas, bem como a composição do CNJ em face do princípio federativo (sub-representação da magistratura estadual), novo Estatuto da Magistratura, democratização do provimento dos cargos diretivos nos tribunais e outros serão debatidos no Ano Temático instituído, neste mês, pela diretoria da Amagis. Trata-se de oportunidade para fortalecimento de laços com o Congresso Nacional e exposição das ideias, valores e nomes do judiciário estadual mineiro.