Mas a memória tem também a função de alertar a consciência, evitando recidivas que comprometam o presente e o futuro. Por vezes, mesmo sem desejar mentalizar experiências doloridas, algo nos diz que prosseguir em determinado caminho nos levará ao fracasso ou a destinos lúgubres. Superior, embora por vezes complicada, é a situação quando, analisando fatos e personalidades sob crivo de critérios objetivos de liberdades e garantias cidadãs, conclui-se pelo desacerto do caminho pretendido por maioria ocasional. Essa é a hora em que a coragem cívica de negar-se ao compartilhamento do erro distingue quem resiste consciente e firmemente à conveniência do discurso fácil e adesista, ao fisiologismo político, deixando legado nobre e ético por essência.
O dia 13 de dezembro, quando reportado a 1968, é data de se recordar sempre, para que não se repita. Mas é, também, data em que se registrou, isoladamente, em reunião plena dos 24 componentes do então existente Conselho de Segurança Nacional, o voto disruptivo de um brasileiro insuficientemente lembrado nos tempos que correm.
A data do AI-5, o ato institucional que rasgou de vez a Constituição de 1967, instituiu o golpe dentro do golpe de Estado de 1964, instrumento reconhecidamente utilizado para cassar 321 políticos, afastar 3 ministros do Supremo Tribunal Federal (Hermes Lima, Evandro Lins e Silva e Victor Nunes Leal), condenar professores do quilate de Caio Prado Júnior e causar estragos políticos até o presente ainda sentidos, foi também a data em que o vice-presidente Pedro Aleixo teve a coragem cívica de dizer não, de demonstrar, em discurso histórico, por ato de consciência, sob todos os ângulos (ético, jurídico, político etc.), a violência que o então presidente Costa e Silva estava propondo contra o povo brasileiro A declaração de Pedro Aleixo, na ocasião, essencialmente política, solitária, merece resgate na memória nacional, como legado de sobriedade em momento capital.
Homem profundo, cujo feito deve ser sempre lembrado nas encruzilhadas e perplexidades da vida da Nação, Pedro Aleixo tinha naturalmente em seu espírito gravada a advertência que Calderón de la Barca, em pleno século XVII, tão bem sintetizou: “Ao rei, a vida e os bens devem ser dados, mas a honra é patrimônio da alma, que pertence apenas a Deus”.