Infelizmente, “Justiça lenta” é expressão pleonástica no Brasil. A notória morosidade do Judiciário causa enormes transtornos e compreensível indignação dos cidadãos. Contudo, aflige intensamente os magistrados brasileiros. Nossos juízes, em sua maioria, são extremamente operosos e se angustiam com sua tarefa diária de “enxugar gelo”. Por que?

Há que se considerar o aspecto positivo da questão. A redemocratização brasileira, há duas décadas, fortaleceu a cidadania. A Constituição de 1988 incrementou consideravelmente o elenco de direitos e garantias individuais e sociais. Para sua efetivação, ampliou de maneira inaudita o acesso à Justiça. Todavia, o Poder Judiciário não estava – e nem está até aqui – suficientemente estruturado para absorver essa incomensurável demanda.

Reconheça-se o desmedido empenho das autoridades judiciárias para melhorar a prestação jurisdicional. O Conselho Nacional de Justiça, atualmente presidido pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, instituiu em 2009 a chamada “Meta 2”, no sentido de que fossem julgados todos os processos ajuizados até 2005. O objetivo foi razoavelmente cumprido pelos juízes e tribunais, no limite da sobrecarga. Todavia, mais processos julgados na primeira instância implicam mais recursos para as instâncias superiores. Como num “passe de mágica”.

Nosso sistema processual é deveras arcaico. Os procedimentos dos códigos de processo civil e penal são desmedidamente ritualistas. Atravancam a marcha processual, em detrimento da agilidade. São incontáveis os recursos postos à disposição das partes. Se o juiz da causa espirrar, certamente haverá um recurso interposto à instância superior...

Mais eficaz do que a chamada “Meta 2”, portanto, seria a implementação do “Pacto Republicano” ajustado entre os presidentes da República, Senado, Câmara dos Deputados e Supremo Tribunal Federal. Referido pacto, entre diversas outras medidas, prevê o comprometimento do Poder Executivo em evitar medidas administrativas ilegítimas e a resistência protelatória nos milhares de processos judiciais nos quais é parte.

Com efeito, o Poder Público, em níveis federal, estadual e municipal, congestiona a Justiça porque insistentemente viola direitos dos cidadãos contribuintes, servidores públicos e aposentados. É péssimo pagador, que se ampara no obsoleto artigo 100 da Constituição Federal: “os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios”.

Outrossim, poderosas empresas e instituições financeiras protelam o quanto podem o desfecho das ações em que são rés. Poderão recorrer até a quarta instância. Nesse percurso, chega-se ao absurdo de haver, em um único processo, mais de vinte recursos com barrocas denominações. À falta de instrumentos para espernear, ingressam até mesmo com “recursos inominados”.

Por derradeiro, a estrutura hermética e não-democrática de governo dos tribunais, o carreirismo propiciado pelas promoções sem critério de juízes e a contratação viciada de servidores são problemas administrativos recorrentes nos tribunais brasileiros.

*Rogério Medeiros Garcia de Lima é desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, doutor em Direito pela UFMG e professor universitário; este artigo foi publicado pelo jornal Hoje em Dia, edição de 24 de janeiro de 2010, seção de Opinião, p. 5.