Bruno Terra Dias*

Minas Gerais, como é próprio de sua história política, apresenta-se, neste momento da disputa pela presidência da AMB, por duas correntes de pensamento poderosas, como ponto de equilíbrio, dando o tom ao embate. Dificilmente se encontrará, nos registros das campanhas pretéritas em nosso Estado, algo tão relevante como o debate ocorrido na noite de 20 de agosto, na Amagis, como evento do Ano Temático (implantado para discussão de temas relevantes para a magistratura nacional, com especial enfoque nos interesses da magistratura estadual).

O desembargador Henrique Nelson Calandra, de São Paulo, ex-presidente da Apamagis, e o juiz Gervásio Santos, do Maranhão, presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão, representando as distintas opções do cenário político-associativo nacional, atenderam ao convite que lhes foi feito, com antecedência de mais de duas semanas, para debater o tema: ‘Democratização das relações internas no Poder Judiciário’. O resultado do encontro, transmitido pela internet e contando com o elevado grau de discernimento do público presente (magistrados das mais distintas especializações e de diversos estados da federação, assim como profissionais do direito de outras áreas da atuação), foi a celebração da democracia.

A dualidade existente poderia encaminhar, a princípio e teoricamente, a dois posicionamentos distintos: a simples negação e o reconhecimento. A eventual e teoricamente possível negação - caminho mais curto e conveniente para quem se encontra na administração, celebra a paz do silêncio, tradicional expediente que, transportado à ambiência das nacionalidades, resultou em regimes ditatoriais, tanto de direita como de esquerda, como o fascismo e o stalinismo - jamais foi sequer pensada ou considerada na Amagis. Uma tradição que sempre foi referência entre as maiores expressões do associativismo democrático mineiro e que não permitiria postura negativista.

Já o reconhecimento da diversidade de opções, ofertando a todos a possibilidade de acesso para escolha consciente, não configura uma trilha de facilidades, mas é justa cobrança da responsabilidade pela condução dos destinos associativos. Abrir-se à diversidade e superar adversidades são desafios da construção do regime das liberdades cidadãs, a serem reconhecidas e praticadas em todos os ambientes da nossa vivência.

Em verdade, para construção e celebração da democracia (a democracia jamais se completa, está sempre em demanda de mais legitimação, e a comunicação de qualidade, com a melhor tecnologia disponível, é instrumento indispensável), não há possibilidade de negar os benefícios do debate de ideias. Neste contexto, após exposição de seu pensamento, cada orador respondeu às indagações dos debatedores e da plateia; por vezes, questões duras foram expostas, mas sem perder de vista o princípio de lealdade que funda nossa unidade como classe, sendo todas respondidas com a expressão das convicções sinceras dos expositores.

Mais que um bom e justo debate, houve respeito e preservação da verdade, afastando polêmicas estéreis. Como é sabido, a polêmica, quando se instaura desnecessária e sob clima de histeria, sugere inutilidade à boa discussão de novas ideias e torna-se obstáculo à busca e ao reconhecimento da verdade. O que obtivemos foi algo bem diverso de qualquer julgamento unipessoal e irretorquível, lastreado em autoridade auto-atribuída, uma "verdade inquestionável", como é tão comum no meio político em sentido lato. Afastadas pretensões a privilégio auto-atribuído da verdade e a visão turva que enxerga apenas ameaças e inimizades no embate político, obtivemos o diálogo possível entre correntes de pensamento que refletem tanto experiências do passado como apontamentos para o futuro.

Algo desponta no horizonte das responsabilidades político-associativas: o encontro sadio, democrático, disposto a ouvir a diversidade e mesmo a adversidade, construindo algo novo a partir da reelaboração da experiência e do conhecimento de cada um. A atitude meramente polemista de que nos afastamos, todos nós que apreciamos a verdade e o progresso, conduz o semelhante como tutelado, instilando-lhe o preconceito e demonizando o desconhecido, para que assim a verdade não surja e o progresso se distancie. Esse ethos, ainda aceso na memória política do país, já nos condenou a décadas de atraso institucional e dele não pode haver recorrência, especialmente em nossa magistratura.

Com esta disposição, de fazer surgir, do jogo de argumentos por princípios e ideias, a verdade da nossa geração de magistrados, que influenciará os novos e nos responsabilizará por tudo o que deixarmos como legado político, seguiu-se o sucesso do segundo debate do Ano Temático 2010.

(*) Presidente da Amagis