O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, nesta terça-feira (31/5), durante a 232ª Sessão Plenária, uma resolução que contém diretrizes para implementação e difusão da prática da Justiça Restaurativa no Poder Judiciário. A resolução é resultado de uma minuta desenvolvida desde agosto do ano passado pelo grupo de trabalho instituído pelo presidente do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski, por meio da Portaria 74/2015, e encaminhada à Comissão Permanente de Acesso à Justiça e Cidadania do CNJ.
O Grupo de Trabalho (GT) responsável pela elaboração da minuta contou com a participação de juízes auxiliares da Presidência do CNJ e magistrados de diversas regiões brasileiras que se destacam pela difusão da prática. A Justiça Restaurativa busca a conscientização quanto aos fatores e dinâmicas relacionais, institucionais, sociais violentos e desumanos, que se apresentam como motivadores de insatisfações e de outras violências, como aquela da criminalidade. “A aprovação da resolução é um avanço muito importante que o CNJ dá na área da Justiça Restaurativa”, disse o ministro Lewandowski.
A partir de técnicas autocompositivas de solução de conflitos, a Justiça Restaurativa promove aproximação entre vítima, agressor, suas famílias, a comunidade, a sociedade e a Rede de Garantia de Direitos, e, a partir da escuta ativa e da compreensão das responsabilidades, busca-se a reparação dos danos advindos da transgressão e o atendimento das necessidades de todos os envolvidos, construindo-se novos caminhos de convivência, pautados pelo bem e pela paz.
Pacificação social – A Justiça Restaurativa busca, também, prevenir e evitar a violência ou que o ato se repita. “Trata-se de importante marco normativo para o Poder Judiciário, que, ao difundir a aplicação coordenada e qualificada dos procedimentos restaurativos em todo o território nacional, assume relevo decisivo para a mudança do atual panorama de nosso sistema de Justiça criminal e infantojuvenil, além de consubstanciar-se como meio de concretização de princípios e direitos constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, o acesso à Justiça e o exercício da cidadania, com vistas à pacificação social”, disse o conselheiro Bruno Ronchetti, relator da resolução.
Diferentes metodologias – A Justiça Restaurativa foi implementada e vem sendo executada há mais de dez anos no país, mas, atualmente, apenas seis dos 27 Tribunais de Justiça (TJs) possuem normatizações a respeito, seja por meio de resoluções ou de portarias. Uma das preocupações do grupo de trabalho durante a elaboração da minuta foi justamente contemplar as diferentes metodologias de implementação e de práticas restaurativas, levando em consideração as normas já existentes nos tribunais a respeito. Entre os princípios que orientam a Justiça Restaurativa estão a corresponsabilidade, a reparação dos danos, o respeito e o empoderamento.
Definição do conceito – De acordo com o texto, a Justiça Restaurativa constitui-se um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência. Por meio desse instrumento, os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado, com a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como, das suas famílias e dos demais envolvidos no fato danoso. A Justiça Restaurativa tem como foco a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou indiretamente para o fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade de reparação do dano.
Nos oito capítulos da resolução são abordados temas como as atribuições do CNJ e dos tribunais em relação à prática, o atendimento restaurativo em âmbito judicial, o facilitador restaurativo, a formação e capacitação e o monitoramento e avaliação. O texto foi elaborado considerando, entre outros motivos, as recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU) para fins de implantação da Justiça Restaurativa e a relevância e necessidade de buscar uniformidade, no âmbito nacional, do conceito de Justiça Restaurativa, para evitar disparidades de orientação e ação.
Mudança de paradigmas – Segundo o Juiz Marcelo Salmaso, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), relator da minuta da resolução no âmbito do GT, o trabalho tomou como base as poucas normativas existentes nos Tribunais, como o Provimento nº 35/2014, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, e as diversas experiências trazidas pelos juízes, tendo como preocupação fundamental traçar diretrizes que garantam identidade à Justiça Restaurativa. “Um outro ponto importante foi manter o entendimento da Justiça Restaurativa, não como uma técnica de solução de conflito, mas como uma verdadeira mudança dos paradigmas de convivência, voltada à conscientização dos fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores da violência e da transgressão, de forma a envolver todos os integrantes da sociedade como sujeitos protagonistas da transformação rumo a uma sociedade mais justa e humana”, disse o juiz Salmaso.
Núcleos nos tribunais – A resolução estabelece que os Tribunais de Justiça implementarão programas de Justiça Restaurativa, que serão coordenados por órgão competente, estruturado e organizado para tal fim, com representação de magistrados e equipe técnico-científica. Os tribunais, por meio das Escolas Judiciais e Escolas da Magistratura, deverão promover cursos de capacitação de facilitadores em Justiça Restaurativa, bem como, manter a equipe de facilitadores, escolhidos entre os servidores do próprio quadro funcional ou designados por instituições conveniadas.
De acordo com o ato normativo compete ao CNJ, dentre outras atribuições, organizar um programa com objetivo de promover ações de incentivo à Justiça Restaurativa e prever mecanismos de monitoramento, pesquisa e avaliação.
Esfera Judicial – Uma das condições fundamentais para que ocorra a prática restaurativa, de acordo com o texto da resolução, é o consentimento livre e espontâneo dos participantes, que têm o direito de solicitar orientação jurídica em qualquer estágio do procedimento. Caso não seja obtido êxito na prática restaurativa, o processo judicial pode ser retomado na fase em que foi suspenso, ficando proibida a utilização desse insucesso como fator para a majoração de eventual sanção penal. Também é vedada a utilização de qualquer informação obtida no âmbito da Justiça Restaurativa como prova processual.
A resolução estabelece ainda que, quando os procedimentos restaurativos ocorrerem antes da judicialização dos conflitos, as partes podem optar se querem submeter os acordos e os planos de ação à homologação pelos magistrados responsáveis pela Justiça Restaurativa.
Prioridade de gestão – Contribuir com o desenvolvimento da Justiça Restaurativa é uma das diretrizes prioritárias da gestão do CNJ para o biênio 2015-2016, prevista na Portaria nº 16/2015, do ministro Ricardo Lewandowski. O ato estabelece as 12 diretrizes que devem influenciar a elaboração do planejamento estratégico do órgão e a formulação de novas metas nacionais para cumprimento da Estratégia Nacional do Poder Judiciário 2015-2020.
Fonte: CNJ