Foco, concentração, disciplina e autocontrole. Essas características tão imprescindíveis dentro de um gabinete, na lida diária como juiz, também são fundamentais em cima de um tatame. A prática de artes marciais, além de trabalhar o condicionamento físico, ajuda a obter o equilíbrio emocional que a carreira de magistrado tanto exige.
O juiz Mauro Riuji Yamane, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Divinópolis (Oeste), é faixa verde no karatê e pratica o esporte há 27 anos, desde que começou a estudar para prestar concurso público. Com o karatê, ele passou a dormir melhor e a ter mais disposição durante o dia. “A endorfina injetada no cérebro traz uma grande sensação de euforia, alegria e paz ao mesmo tempo. Com o esporte, a vida se torna muito mais rentável e prazerosa”, destacou o juiz.
Segundo Mauro Yamane, o karatê também está alinhado à arte de julgar, uma vez que aprimora a disciplina, a tenacidade, o raciocínio rápido e até a tranquilidade, pois se aprende a controlar as emoções nas horas mais difíceis.
Juiz Mauro Riuji Yamane
“Depois que comecei a praticar o karatê e tomar consciência das técnicas de ataque e defesa, passei a ser uma pessoa mais tranquila e pacífica. Hoje, não tenho medo de situações físicas de risco, especialmente nas audiências. Já vivenciei situações em que poderia ter usado o que domino, mas me afastei tranquilamente, vencendo sem ter lutado”, contou o magistrado, que se prepara para fazer, neste ano, o exame de troca de faixa.
Faixa preta no judô, o presidente do Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais (TJMMG), juiz Fernando Galvão da Rocha, foi apresentado ao esporte aos sete anos de idade na tentativa de amenizar problemas respiratórios. Ele deve ao judô a melhora de seu condicionamento cardiorrespiratório e o fim do uso de medicamentos para asma.
“O judô trouxe tantos benefícios para a minha vida que chega a ser difícil sintetizar. Ele influencia tudo o que faço, inclusive o trabalho como juiz. Disciplina para manter as rotinas de estudo e atenção para com os detalhes dos processos são influências positivas que atribuo aos anos de judô”, afirmou Fernando Galvão.
Juiz Fernando Galvão da Rocha
Superação
O equilíbrio entre a força da mente e do corpo é um dos pontos trabalhados pelas modalidades e é encarado por muitos de seus praticantes como uma importante ferramenta para enfrentar os desafios da vida. O contato com as técnicas de projeção – arremesso de um praticante por outro -, por exemplo, ensina o atleta a cair e a levantar, em movimento que simboliza os momentos de dificuldade e superação de obstáculos.
Quando está no tatame, o juiz André Luiz Alves, da Comarca de Conceição do Mato Dentro (Central), deixa de lado as tensões vividas ao longo do dia e se concentra apenas no treino. “No tatame, esqueço todos os problemas e foco somente naquele momento. Isso alivia o estresse diário e me ajuda a enfrentar melhor os desafios”, afirmou o juiz.
O magistrado conseguiu emagrecer 15 quilos após iniciar a prática de jiu-jitsu, em outubro de 2015. Antes da luta em si, ele faz exercícios que aceleram a capacidade cardiovascular e respiratória para conseguir aguentar a carga intensa do treinamento que virá em seguida. “A demanda física que o esporte exige é muito grande. Com pouco tempo de prática, obtive um preparo físico muito bom”, ressaltou o magistrado.
Juiz André Luiz Alves (à direita)
Relacionamentos
A prática de artes marciais também diminui o isolamento social e favorece o relacionamento entre pessoas com um interesse em comum. “O esporte aumenta muito o rol de amigos, especialmente fora do âmbito forense, o que é muito bom para quem vive a solidão da toga, dadas as inúmeras restrições da função”, disse o juiz Mauro Yamane.
Para Fernando Galvão, entre tantos benefícios proporcionados pelo judô, o maior deles foi poder treinar com seu filho e fortalecer o vínculo entre eles. “Embora meu filho, como os rapazes de sua geração, goste mesmo é dejiu-jitsu, não recuso nenhum convite dele pra fazer um ‘rolinha’ no tatame que temos em casa. Mas, para não ser injusto com o esquecimento, também não recuso uma ‘provinha’ de corrida com a minha filha. Espero ter saúde para aproveitar estes momentos por muito mais tempo”, disse o magistrado.
Valores
As artes marciais ainda são encaradas com um certo preconceito por quem acredita que as modalidades incitam a violência. O que essas pessoas não sabem é que as artes marciais se fundamentam em valores éticos e morais que orientam a conduta dos praticantes para além dos momentos de competição. O respeito à hierarquia, ao adversário e às regras do jogo são pontos fortemente trabalhados.
“Quando se está no tatame, o respeito ao grupo e ao mestre, que é quem possui a maior graduação, é bastante exigido. E isso eu levo para a minha vida pessoal e profissional, onde preciso lidar com um grupo de trabalho diversificado”, afirmou o juiz André Luiz Alves.
“Os treinos são tranquilos, visando à parte física e técnica. Aliás, eu parei de jogar futebol porque machucava muito mais que o karatê. O contato corporal forte existe, mas sempre de forma respeitosa e preservando a integridade do adversário. Por isso, recomendo a todos os colegas, homens e mulheres, a praticarem uma arte marcial com profissionais sérios e competentes”, destacou Mauro Yamane.
Para Fernando Galvão, os valores cultivados pelo judô, por exemplo, reforçam a postura que se deve ter diante de pessoas de perfis tão diferentes, que, no ambiente de treino, se tornam igualmente merecedoras de respeito. “Os valores cultivados pelo judô ressaltam o respeito que se deve ter por todos e, em sua forma vibrante de expressão, nos mostram a complexidade e a beleza da interação social. Essa influência também é útil na tarefa de julgar a conduta do outro. Para quem tiver interesse em saber mais sobre a filosofia que fundamenta o judô, recomendo a leitura do livro ‘Energia mental e física - escritos do fundador do Judô’”, indicou o magistrado.