*Jarbas Soares Júinior, promotor de justiça e membro do Conselho Nacional do Ministério Público

Talvez a mais bela função do sistema de justiça esteja reservada à Defensoria Pública, instituição essencial ao seu funcionamento, à qual compete a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV, da Constituição federal.

A missão do Poder Judiciário é sublime e complexa. Em tese, só Deus poderia julgar as pessoas. A defesa difusa da sociedade, atribuição do Ministério Público, é de grande relevância social e para a afirmação do Estado democrático de direito. Mas a assistência judicial aos necessitados, aos que a Bíblia diz “que têm sede e fome de justiça”, parece-me ser a mais gratificante. Assisti-los é trazer a esperança de volta àqueles a quem a vida e o Estado deram as costas.

A campanha que a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, em parceria com a Secretaria de Estado de Saúde, realiza hoje, denominada “Mutirão direito a ter pai”, demonstra, claramente, a grandeza do órgão, a função magna dos seus membros e a importância da sua ação institucional para a vida das pessoas. Serão feitos exames de DNA, em vários municípios, com a finalidade de confirmar a paternidade que o destino negou a milhares de pessoas —, crianças, jovens e adultos. No primeiro mutirão realizado em 2012, em Belo Horizonte, a Defensoria Pública atendeu 1.102 pessoas, quando foram realizadas 168 coletas. Desse material, resultaram 118 reconhecimentos espontâneos e 101 ações de investigações de paternidade, segundo dados coletados.

Esse é um belíssimo exemplo que a Defensoria Pública de Minas Gerais dá ao país do alcance do seu papel, da importância dos investimentos crescentes que o Estado promove na sua estruturação, na qualificação e remuneração dos seus membros, embora essa ainda não seja a ideal face à relevante função desempenhada pelo órgão. Ao direcionar seus recursos humanos e materiais, prioritariamente, ao cidadão individualmente considerando, a Defensoria Pública mineira demonstra, também, que a missão maior da instituição é cuidar dos legítimos interesses das pessoas carentes, que vivem, normalmente, nas vilas, becos e favelas do nosso pais.

Nos últimos tempos, tendo notado uma perda de identidade da Defensoria Pública brasileira ao se enveredar por outros caminhos, notadamente ao patrocínio de ações civis públicas para a defesa de direitos difusos, função delegada pelo arcabouço constitucional ao Ministério Público, também instituição do Estado. Respeitando as opiniões divergentes, penso que o legislador, ao autorizar o aJUIZamento de ações coletivas à Defensoria Pública teve em mente o sentido de promover e facilitar a defesa, em juízo, dos direitos das pessoas vulneráveis, quando possível identificar um interesse que os reúna em grupos ou comunidades de pessoas.

Parece-me, assim, ilógico e desvirtuado do propósito constitucional da Defensoria Pública que o órgão permeie as suas iniciativas, por exemplo, para o campo das ações de improbidade administrativa, como se tem visto país afora, ou ações civis públicas para a proteção de interesses difusos, em prejuízo da tutela individual dos direitos das pessoas que não têm acesso ao Poder Judiciário, o carente de recurso, o vulnerável. Devido à enorme quantidade de pessoas, individualmente, ainda sem acesso à Justiça, é impossível realizar as duas tarefas. Por isso, penso eu, o constituinte criou distintas instituições para tais missões do Estado.

Está sob a relatoria da Ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármem Lúcia Antunes Rocha a ADI nº 3943, proposta pela Associal Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), que visa que a Corte Constitucional dê interpretação conforme a Constituição à norma que conferiu à Defensoria Pública legitimidade para as ações coletivas. Ou seja, caberá ao STF substituir a própria Defensoria Pública e balizar esse caminho, ao meu juízo, equivocado, trilhado institucionalmente por alguns defensores públicos.

A Defensoria Pública de Minas Gerais, tão bem dirigida e orientada, mostra ao Brasil o caminho correto a seguir: nada é mais digno do que cuidar do indivíduo, de seus anseios, sonhos e necessidades; olhar nos olhos do trabalhador, da dona de casa, da criança atendida e saber que a nossa ação restaurou a sua dignidade. Nesse campo, cuidando das pessoas, a Defensoria Pública mineira manterá a legitimidade social de todos os seus justos pleitos, orgânicos ou não, e conquistará o status institucional reservado a seus membros.

Artigo publicado no Caderno 'Direito e Justiça', do jornal Estado de Minas, nesta sexta-feira, 18.