Luiz Guilherme Marques

A época atual se caracteriza, não pelas mudanças, mas, pode-se dizer, sem medo de errar, pelas verdadeiras mutações, ou sejam, transformações tão grandes e significativas como a que ocorre quando a disforme crisálida se transforma em maravilhosa borboleta, cuja variedade e beleza de cores realmente encanta os olhos e enfeita a Natureza.

Com relação ao Judiciário, que, praticamente, manteve-se repetindo o modelo dos séculos passados, quando acabava sustentando as desigualdades sociais, de forma indireta, agora tem de encarar de frente os graves problemas da miséria, do crime organizado, da falta de oportunidades para as minorias e a despreocupação com a inclusão de afro-descendentes, mulheres, indígenas e deficientes dos mais variados tipos.

A multiplicação do número de processos em progressão geométrica demonstra o desenvolvimento da idéia de Cidadania, quando cada membro da sociedade se sente injustiçado por outro cidadão ou até pelo próprio Estado, que, infelizmente, é o grande vilão dessa história, uma vez que, atulhando as Varas Especializadas, recorre ao instituto antiético do precatório para postergar quase que indefinidamente suas dívidas, contribuindo para desacreditar o próprio Judiciário, ao contrário do que acontece em países como a Inglaterra, onde a Coroa Britânica paga imediatamente seus débitos judiciais como questão de honra.

A Justiça tem que começar a preocupar-se com a prioridade que a lei garante aos processos em que os idosos são partes; com aqueles outros em que as mulheres são vítimas de violência doméstica; aqueles em que crianças e adolescentes são abandonados ou encontram-se em situação de risco moral; aqueles em que o Direito Penitenciário deveria ser aplicado observando as regras dos Direitos Humanos insculpidas na Lei de Execução Penal; aqueles dos Juizados Especiais, onde os princípios máximos da conciliação, celeridade e informalidade normalmente não são levados tão a sério; os inventários e partilhas, que deveriam receber agilidade especial; aqueles relacionados ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e artístico e assim por diante.

Ocorre que as populações manifestam sua insatisfação, todavia, de forma acanhada e que não chega ao conhecimento dos Dirigentes dos Tribunais, resumindo-se a murmurações entre amigos, não detectadas pelas estatísticas realizadas pelo próprio Judiciário, que acaba acreditando estar satisfazendo a população, o que não corresponde à realidade.

A Constituição Federal de 1988 pretendeu elevar a Cidadania ao grau máximo possível, todavia, a realidade do dia-a-dia tem demonstrado que o direito dos cidadãos brasileiros é menosprezado a cada minuto no nosso imenso território, seja através das discriminações contra aqueles que não têm vez nem voz ou que falam e não são ouvidos, reclusos que vivem nas favelas onde a miséria campeia junto com a criminalidade ou cujos direitos são tratados apenas em discursos por ocasião de solenidades que não atingem a concretude das soluções verdadeiras.

Os cidadãos deveriam ser ouvidos em audiências públicas periódicas para manifestarem seus anseios, talvez imitando as idealizações de Platão, que sonhou com comunidades ideais, onde cada um pudesse falar e ser ouvido, participando da vida política, jurídica e econômica das coletividades onde viviam.

Leis são editadas sem consulta aos interessados, medidas administrativas são tomadas “de cima para baixo” e os próprios operadores do Direito se sentem manietados por regulamentos que têm de cumprir já sabendo da sua inanidade e falta absoluta de sentido prático.

Chegamos ao ponto da necessidade das mutações, porque as mudanças de superfície não resolvem mais e nem convencem a quem quer que seja.

Juiz de Fora, por exemplo, necessita urgentemente da instalação das 10 Varas previstas na Lei de Organização e Divisão Judiciárias, não sendo possível mais aguardar indefinidamente.

Em meu nome próprio e, acredito, em nome dos demais magistrados desta Comarca, além dos promotores de justiça, advogados, defensores públicos, delegados de policia e servidores em geral da Justiça local, assino este manifesto, que está sendo remetido à AMAGIS, à AMB e à Presidência do Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais.