Rogério Medeiros Garcia de Lima, desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, doutor pela UFMG e professor universitário.


A criação do Conselho Nacional de Justiça, pela Reforma do Judiciário (Emenda Constitucional nº 45/2004) é um divisor de águas na história da Justiça brasileira.

Não podemos deixar de reconhecer a enorme contribuição do CNJ para a adoção de novas posturas administrativas no âmbito do Poder Judiciário, notadamente no que diz respeito à observância dos princípios constitucionais da moralidade e eficiência administrativas. O órgão tem sido incansável na busca de solução para problemas crônicos, tais como morosidade processual, superpopulação carcerária e ausência de planejamento estratégico nos tribunais brasileiros.

Todavia, tem-se verificado a prática de denuncismo abusivo contra tribunais e magistrados. Frequentemente desembargadores e juízes interrompem seus gigantescos afazeres para responder pedidos de explicações do Conselho sobre atos de natureza puramente jurisdicional. Em outras palavras, partes e advogados recorrem ao CNJ simplesmente para pressionar magistrados, quando estes proferem decisões contrárias aos seus interesses.

A propósito, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, reiterou jurisprudência daquela Corte no sentido de que o Conselho Nacional de Justiça não tem competência para exercer a fiscalização da atividade jurisdicional. Ao deferir liminar em mandado de segurança, suspendeu ato do corregedor nacional de Justiça que tornou sem efeito decisão do Tribunal de Justiça do Maranhão de manter na função uma titular de cartório (Supremo Tribunal Federal, Mandado de Segurança nº 28.611, min. Celso de Mello, fonte: Notícias do STF, http://www.stf.jus.br/, captado em 08.06.2010).

Mais recentemente, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, respeitado por sua seriedade, foi alvo de grave denúncia sobre falta de lisura no último concurso para ingresso na carreira da magistratura. A denúncia teve repercussão nacional. Causou-me surpresa, porque em 1989 fui aprovado em concurso rigoroso, do mesmo Tribunal, para iniciar minha carreira de magistrado. Professor da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes desde 1996, pude atestar, nos diversos cursos de formação inicial de juízes, a competência e probidade dos colegas recém ingressados.

Felizmente, por unanimidade, o CNJ rejeitou a representação que buscava anular o mencionado certame.

Enfim, já tive ocasião de escrever o texto Ética para principiantes (2007), onde salientei que todos nos indignamos com os muitos escândalos fartamente noticiados. Todavia, muitos dos que xingam duramente os corruptos, são os mesmos que elegem políticos almejando benesses pessoais. Diversos homens públicos são identificados com o slogan “rouba mas faz”. Esses eleitores não idealizam os representantes que administrarão e elaborarão leis em nome da comunidade, mas os “amigões do peito” que vão resolver seus problemas: emprego, bolsa de estudo, tratamento médico gratuito, transferência do filho para a universidade pública e congêneres. Vão livrá-los de problemas com o delegado de polícia ou o fiscal de tributos, se possível ajeitando a remoção do “incômodo” funcionário para localidade bem distante. São os mesmos eleitores que sonegam imposto de renda, não fornecem recibo ou nota fiscal a clientes e consumidores, subornam o guarda de trânsito e o fiscal da fazenda, compram drogas de traficantes ou fazem apostas em jogos ilícitos. Contudo somos todos muito bons, boníssimos. Corruptos são os outros.

Este é o Brasil onde opera o Conselho Nacional de Justiça...


Artigo foi publicado pelo jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte, no dia 20 de agosto de 2010.