Eduardo Machado
Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG)


O Congresso Nacional decretou e a presidente Dilma Rousseff (PT) sancionou a Lei 12.663, a Lei da Copa. Vistas agora as consequências, podemos dizer que o que de fato aconteceu foi um “contrato de compra e venda”, em que os objetos da transação foram a autonomia e a independência do país. E venderam também a liberdade, a dignidade, o respeito e o espaço do povo brasileiro.

Passada a euforia da vitória, necessário fazer um balanço. Em junho, o Brasil acordou!

As manifestações não foram em vão, e o resultado tem sido satisfatório. O mínimo que se viu foram políticos trabalhando diuturnamente, até mesmo em dia de jogo do Brasil, para dar seguimento a projetos adormecidos e lembrados nas manifestações.

Concomitantemente, restou um rastro de destruição na nossa alma e no patrimônio público e privado. Destruição geral, o mundo inteiro viu, e vozes uníssonas clamaram que vândalos se infiltraram entre os manifestantes e fizeram o estrago.

Ledo engano!!!

Os vândalos já estão nas ruas de todo o país há muito tempo. Transitam livremente, e furtam, roubam, cheiram, fumam, matam, explodem caixas eletrônicos, saqueiam o comércio, picham e depredam o patrimônio público e privado, incendeiam ônibus, dão ordem de recolher e muito mais.

Contudo, existem outros vândalos que, há muito, estão saqueando a saúde, a segurança, o transporte e tudo mais que podem, mas permanecem blindados, o que deixa claro que no Brasil temos vândalos bem-sucedidos.

Voltando aos vândalos que promoveram a desordem e destruíram o patrimônio público e privado, vimos que contra alguns já existiam até mesmo mandados de prisão em aberto, o que deixa claro que não se infiltraram, mas já estavam presentes há muito tempo. O que de fato houve é que as lentes das câmeras do mundo inteiro registraram as suas ações, e a divulgação foi ampla.

E mais, a irresponsabilidade do “Estado paralelo” que aqui se instalou foi decisiva para os prejuízos causados nos dias de pânico e depredação geral.

Nos dias de jogos, as autoridades subalternas ao “Estado paralelo” marcaram encontro com os manifestantes em áreas desprovidas de rotas de fuga. O “Estado paralelo” mandou demarcar o espaço até onde esses poderiam transitar, e as autoridades obedeceram. Podiam caminhar pela cidade, mas não se aproximar das áreas delimitadas. Agredidos com bombas, foguetes, pedras e pauladas, os policiais não podiam revidar e muito menos proteger o comércio e os manifestantes de boa conduta, porque alguns levianos criticavam a ação, dizendo que a polícia agia com truculência. Se agiram assim, agiram muito pouco e não fizeram o que deveriam fazer. Uma pessoa, quando desafia uma autoridade policial, deve saber muito bem o que esperar, a cordialidade em último lugar. Com bandidos não se transige.

Uma fábula de dinheiro público foi gasta para a locomoção, prontidão, alimentação e ação das polícias, para responderem passivamente quando agredidas e na defesa da integridade das pessoas e do patrimônio.

O certo é que os danos foram incalculáveis e, enquanto as grandes empresas poderão se reerguer, os pequenos comerciantes vão amargar prejuízos e talvez não sejam capazes de recuperar os estabelecimentos e se afogarão em dívidas. Isso apesar de aquele “Estado paralelo” ter semeado a ideia de que a Copa das Confederações iria aquecer o comércio local.

No entanto, tivemos atos piores e que merecem o mesmo repúdio, uma vez que trouxeram prejuízos de monta para a sociedade e, até então, não foram vistos, discutidos ou considerados, já que estavam distantes do foco e das lentes das câmeras.

Decretar ponto facultativo nas repartições públicas do estado e do município não tem a menor razão de ser. No Judiciário, principalmente, de onde se espera maior celeridade na análise e julgamento de processos, é algo sem qualquer justificativa e se traduz em elevada falta de respeito com os jurisdicionados. E isso ocorreu mesmo nos jogos entre equipes de baixa representatividade no cenário desportivo.

Centenas de atos processuais deixaram de ser praticados. Audiências designadas com muita antecedência foram adiadas e, assim, frustradas as expectativas de muitos litigantes em ver a solução do pleito. Agora terão que esperar, e muito, uma nova designação e realização dessas audiências, considerando que as agendas dos magistrados estão repletas.

Finalmente, isso foi apenas o começo, a preliminar de tudo o que pode se repetir na Copa do Mundo de 2014, considerando ainda que tudo quanto foi prometido em obras de infraestrutura, que poderia justificar os elevados gastos, pode não ocorrer.

É esperar para ver e rezar muito.
Artigo publicado no caderno Direito e Justiça, do jornal Estado de Minas, no dia 16 de agosto de 2013.