Juíza Andréa Barcelos Ferreira Camargos Faria*

Nos últimos três a quatro anos, assistimos a uma crescente avalanche de programas, cursos, palestras e discussões sobre “Gênero”, tanto na mídia quanto nas Universidades e nas Casas Legislativas, na sua maioria e de modo bastante bem orquestrado, com o intuito de levar as pessoas a aceitarem e a apostarem nessa suposta teoria como o meio para a construção de uma sociedade mais livre, justa e tolerante. E, como fruto dessa poderosa e milionária propaganda, alguns passaram a defender que o “gênero” seja ensinado nas escolas, inclusive desde a mais tenra idade.

Quando nos dispomos, porém, a debruçar sobre a literatura de gênero e a pesquisar as consequências reais das políticas públicas implantadas nos países em que ele foi acolhido na legislação e na educação, deparamo-nos com um quadro grave e contraditório: injustiças, intolerância, perda da liberdade e uma restrição ao pensamento divergente que beira a uma ditadura.

De início, vemos que a própria expressão – usada como sinônimo de gênero – “identidade de gênero” é, verdadeiramente, uma “contraditio in terminis”. De fato, segundo Judith Butler, não existe, na verdade, um sujeito, uma identidade. Para Butler, gênero é a autopercepção de si mesmo, independentemente da natureza e da biologia. Não pode ser predeterminado e não se pode exigir a comprovação de que eu sou deste ou daquele gênero, porque, além de ser subjetivo, ele varia com o tempo, segundo meu livre arbítrio.

Vê-se, pois, que um gravíssimo problema se coloca, com tal perspectiva de gênero, pois, como se falar em igualdade do que não existe, do que não tem identidade? E, mais grave: como tutelar direitos (tolerância, liberdade, justiça etc.) se não há sujeitos de direitos? Essa perspectiva mostra, também, que ela em nada auxilia na defesa das mulheres e das chamadas minorias, já que não existe propriamente um ser ou sujeito ‘mulher’, e, por consequência lógica, também não existe um sujeito ‘homem’, ‘homossexual’ etc.

Com o sugestivo título de “O paradoxo da igualdade”, o antropólogo e humorista Harald Eia, produtor do documentário Hjernevask (“Lavagem Cerebral” em português), demonstrou que, apesar de todos os esforços dos engenheiros sociais na Noruega para colocar uma maior igualdade entre os sexos masculinos e femininos, as mulheres continuaram optando por profissões ditas “femininas”, como, por exemplo, enfermeiras, professoras etc., e os homens atraídos por carreiras consideradas “masculinas”, preferindo ser engenheiros, técnicos, operários da construção civil etc.

"Não pode ser predeterminado e não se pode exigir

a comprovação de que eu sou deste ou daquele gênero,

porque, além de ser subjetivo, ele varia com o tempo, segundo meu livre arbítrio".

Para buscar uma explicação a este “estranho fenômeno”, Eia se dirigiu à Universidade de Oslo, a fim de entrevistar Cathrine Egeland e Jørgen Lorentzen – ambos “especialistas” do extinto Instituto Nórdico de Gênero – e acabou descobrindo que eles não tinham nenhuma base cientifica empírica em seus postulados. O documentário demonstrou que a hipótese de gênero defendida pelos “especialistas” do NIKK é constituída de meras hipóteses e suposições, sem nenhuma investigação ou prova empírica.

Mas não é somente a tão almejada ‘igualdade de gênero’ que se vê desmentida, na prática, com a adoção das políticas de gênero. Também a justiça, a tolerância, a liberdade, dentre outros tão sonhados direitos supostamente promovidos pelo gênero, são eliminados da vida social. É o que descobrimos, quando verificamos as consequências concretas nos países em que ele foi acolhido na legislação, e está sendo aplicado nas escolas: um resultado ainda mais catastrófico.

Na Alemanha, por exemplo, uma mãe foi presa por se recusar a levar seus filhos à aula de educação sexual, num Estado em que já havia 53 pais condenados por esse motivo. Esses pais se recusaram a permitir que seus filhos participassem do programa de educação sexual, porque não concordam com a educação sexual que o Estado quer impor aos seus filhos de forma obrigatória e consideram que seus direitos humanos e civis estão sendo violados. No Reino Unido, cinco anos após a adoção do ‘gênero’ nas escolas, aumentou em 1.000% o número de crianças em tratamento, com ‘distúrbios de gênero’.

Ocorrências como essas devem levar-nos a questionar qual é o verdadeiro propósito por trás de um “mundialmente elevado” interesse no acolhimento de uma proposta teórica sem qualquer embasamento científico, e na sua implantação – a qualquer custo – por meio de políticas públicas abusivas, que, na prática, contradizem seus propósitos de libertação e justiça.

E tudo isso, sem falar na mais grave e danosa das medidas atuais que pretendem adotar os defensores do gênero: como bem salientou Carla Dorgam, médica estudiosa das questões de gênero, fazer das escolas um laboratório que transforme nossas crianças em “cobaias” de um experimento social.


*2ª Vara de Família e Sucessões de Divinópolis


Artigo publicado na edição de abril de 2018 do Jornal Decisão