João Carneiro Duarte Neto

Na atualidade, estuda-se a elevada tensão nas bases fundantes da organização político-administrativa da sociedade brasileira. Tendo como características a independência e a harmonia entre os Poderes, bem como a adoção da teoria da separação dos poderes e os mecanismos de freios e contrapesos, observam-se alguns elementos indicativos de desajustes e desequilíbrios nos sistemas político e jurídico, assim como no inter-relacionamento entre eles.

As investigações acadêmicas devem se desenvolver no âmbito da Sociologia do Direito, da Filosofia Política e do Direito Constitucional. A pesquisa concentra esforços em analisar como os sistemas político e jurídico efetivamente funcionam, em especial as relações entre eles, confrontando com as teorias positivadas no texto constitucional, as quais foram idealizadas como respostas teóricas a tais fenômenos sociais. O recorte social e histórico é a sociedade brasileira na atualidade, evitando-se importações acríticas de outros países.

A proposta de enfrentamento da temática principal colocada é sistêmica funcional-estrutural. Distancia-se da análise de influência clássica, utiliza-se do referencial teórico Niklas Luhmann, através de sua teoria dos sistemas, aproveitando-se dos conhecimentos das teorias da sociedade, da comunicação e da evolução. A temática principal da presente pesquisa é o relacionamento entre os Poderes (funções) Executivo, Legislativo e Judiciário, as externalidades produzidas por cada um frente aos outros, isto é, as comunicações entre eles.

Como temática instrumental, para análise da política, descreve-se o sistema de governo presidencialista de coalizão, o qual pressupõe alianças políticas e formação de maiorias, num cenário de pluripartidarismo e representação proporcional. Tal modelo político-partidário carrega em si demasiada complexidade, a qual é geradora de instabilidade político-social e ineficiência governamental. Tudo isso vem demostrando certo déficit de implementação dos direitos fundamentais.

Já no sistema jurídico, utiliza-se da análise dos fenômenos da judicialização da política e do ativismo judicial. Reconhece-se o destaque do Poder Judiciário ao atrair as comunicações decisórias de cunho coletivo da sociedade, em especial, das decorrentes do sistema político, a proibição do non liquet, a usurpação de funções alheias e pelo ‘inchaço’ corrupções de códigos. O grande problema identificado não passa do Judiciário, mas, sim, pela postura de usurpação finalística de questões sociais ínsitas a outros sistemas. O Judiciário não pode e não deve ser o centro decisório de todo e qualquer problema da sociedade, pois essa não é sua função.

A função essencial do Judiciário é voltada para frente, para o futuro,  é a manutenção das expectativas normativas da sociedade. A viabilidade da convivência humana numa sociedade tão complexa e instável exige que o sistema do direito seja eficiente, seja garantidor de que comportamentos contrários à legislação recebam as sanções previstas. O conceito de segurança jurídica não é a necessidade de respostas únicas e iguais para casos semelhantes, mas, sim, a característica de o Judiciário dar tratamento procedimental legítimo, utilizando-se do código decisório lícito/ilícito e da programação voltada à consecução de justiça a cada caso.

Enfim, coloca-se em discussão a pertinência das teorias de organização da estrutura estatal frente à complexidade crescente da sociedade. As hipóteses levantadas são de que existem disfuncionalidades nos sistemas da política e do direito, tais como usurpações funcionais, corrupções de códigos de decisão e da programação. Além disso, defende-se que a teoria da tripartição dos poderes e dos mecanismos de freios e contrapesos adotados na Constituição de 1988 estão ultrapassados, não conseguem mais absorver todas as fontes de poder que emergem da sociedade.

Convido a todos a enfrentarem tais intrigantes temas no livro “Política e Direito: disfuncionalidades sistêmicas”, à venda no site da Editora Lumen Juris.

(*) Juiz da Vara Criminal da Comarca de Cataguases