Leia três artigos de autoria do desembargador Carlos Cini Marchionatti, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e assessor da Presidência da AMB.

Decisões judiciais memoráveis

Duas recentes decisões do Supremo Tribunal Federal - STF são memoráveis.
Vulgarmente se pode dizer que o STF passou dois pitos no Conselho Nacional de Justiça - CNJ.
Pito dos bons, compostura das boas. O CNJ fez por merecer.
O público em geral lembrar-se-á de dois episódios amplamente divulgados pela imprensa.
O caso de um magistrado que andou dizendo umas "bobagens" em uma sentença em 2007, coisa que é melhor não dizer mas disse, e o CNJ afastou-o da jurisdição em novembro de 2010.
Pronto, notícia divulgada no país inteiro enaltecendo o CNJ.
A verdade: típico atentado à liberdade de opinião e à independência judicial, fundamentais às decisões judiciais com a finalidade de garantir ao povo o seu direito.
Orgulho-me de ter sido um dos poucos Magistrados que apontou a gravíssima dimensão da decisão do CNJ.
O caso da eleição no Tribunal Superior do Trabalho em dezembro de 2010, cuja posse um dos conselheiros do CNJ suspendeu em fevereiro de 2011.
Pronto de novo, mais uma notícia divulgada pelo país glorificando o CNJ.
A verdade: típica e indevida intromissão na autonomia da eleição nos Tribunais.
Repito que o CNJ está agindo como censor, ilegítimo e não qualificado, que a maioria da Magistratura não aceita, e o CNJ atua deste modo porque conta com o apoio inclusive de segmentos da magistratura.
Não se pode dizer nem mais nem melhor de como o fez o Ministro Marco Aurélio ao deferir o mandado de segurança impetrado pelo juiz: "...surge como valor inexcedível a liberdade de expressão ...no exercício, portanto, do ofício judicante, o magistrado crititcou a denominada Lei Maria da Penha, ingressando na área filosófica para enaltecer a figura masculina, tomando a feminina como a estar em segundo plano. Ora o que é lançado é concepção individual que, não merecendo endosso, longe fica de gerar a punição".
Linhas adiante: "...o CNJ, de maneira imprópria, veio a enquadrar o pensamento ... como análogo ao crime de racismo. Entre o excesso de linguagem e a postura que vise inibi-lo, há de ficar-se com o primeiro ..."
Credo. Mais não é preciso dizer para demonstrar que a compostura é das boas.
O caso da eleição no TST. Para simplificar, o egrégio Tribunal Superior é composto por 27 Ministros, que, segundo a Constituição da República, elegem o Presidente e demais membros da diretoria. Elegeram, mas um dos conselheiros do CNJ entendeu de suspender a posse diante da representação de entidade de classe.
O Ministro Dias Toffoli também deferiu mandado de segurança, e destaco um parágrafo da sua decisão, como a ocasião justifica: "O TST é um sodalício com inegáveis serviços prestados ao povo brasileiro e à nação brasileira e não deve passar pelo constrangimento de se submeter aos efeitos de uma decisão administrativa individual e precária com vícios originários de natureza formal".
Em linguagem popular, o conselheiro, "solito no mas", mas sem que estivesse autorizado para decidir sozinho, proferiu uma decisão tão inválida quanto constrangedora.
Felizmente, as decisões dos Ministros, que são memoráveis, põe as coisas nos seus devidos lugares no momento.





A catraca 8 por 6
Catraca: mecanismo que se coloca na entrada ou na saída de um estabelecimento ou veículo para que as pessoas passem.
No Conselho Nacional de Justiça - CNJ, a catraca é oito por seis.
O CNJ compõe-se de 15 membros, do ilustre Presidente do Supremo Tribunal Federal, que tem o voto do desempate, de dois Ministros do STJ e do TST, de um Desembargador e um Juiz de Direito dos Estados, um Desembargador de TRF e um Juiz federal, um Desembargador de TRT e um Juiz do Trabalho, dois membros do Ministério Público e quatro advogados.
O Poder Judiciário dos Estados, que têm o maior número de Magistrados e o maior volume de serviço, tem representação insignificante e despropocional impossível de ser mais injusta: 2/15.
O Ministério Público tem o mesmo número de representantes, dois, os advogados o dobro, quatro, e as duas instituições, somadas, seis, praticamente a metade dos votos do CNJ, sete.
Tal composição é desonrosa e ridícula, mas prevalece e explica decisões ilegais do CNJ, notadamente em relação à Magistratura dos Estados, mas não só.
A composição do CNJ caracteriza autêntico controle externo concebido contra a Magistratura independente.
Quem me dá a honra da sua leitura tem o dever de duvidar? Comparemos em busca da verdade.
O Conselho do Ministério Público tem 15 membros, a maioria do próprio Ministério Público, nove, exceto dois juízes, dois advogados e dois cidadão, somam 6 vindos de fora da instituição.
Os advogados, como profissionais que prestam relevantes serviços à Justiça, nas questões disciplinares, são julgados pelos advogados no âmbito da OAB.
Os assuntos dos juízes, entretanto, são julgados por aqueles a quem os juízes (des)contentam com as suas decisões, os advogados e os membros do Ministério Público.
É bonito isso? indagaria conhecido comediante da televisão brasileira, rufando vigorosamente o seu tambor de alerta, fiel ao bom humor, a única qualidade divina do do homem segundo Arthur Schopennhauer.
Aderbal Torres de Amorim, em um dos seus livros, diz que o CNJ é um tribunal de exceção fruto do demônio da política. Profetizou ontem os acontecimentos de hoje.
De um modo geral, os dois Ministros, os três Desembargadores e o Juiz de Direito votam com independência, fruto da experiência profissional de Magistrados. Mas são apenas seis na catraca 8 x 6.
Os demais membros, dois juízes da área federal, dois membros do Ministério Público e quatro advogados formam a maioria 8 por 6.
Graças ao STF, coibem-se as exorbitâncias do CNJ.
O ilustre Ministro Marco Aurélio reintegrou o Magistrado cassado pelo CNJ por excesso de linguagem, linguagem que não se defende sem que se casse o exercício da Magistratura por opinião: a opinião é livre nas democracias do mundo.
Exulto com a decisão do Ministro. Assisti ao julgamento do CNJ e revoltei-me com a indignidade e a injustiça, em que o Presidente do Conselho Federal da OAB pediu a palavra depois da defesa e a condenação do Magistrado, o Advogado-mor falando depois do defensor, opondo-se à defesa, coisa nunca vista e a mais autêntica violação do direito à ampla defesa.
Tenho a convicção serena e firme que os advogados não concordam. A defesa fala por último. Nenhum advogado pode ser aviltado no exercício do direito defesa, muito menos submeter-se à situação constrangedora de defender e depois ser desautorizado por quem representa os advogados do país.
Noticia-se que a OAB protesta contra o STF em apoio ao CNJ. Está aí um dos porquês: a garantia da posição proeminente e decisiva nas votações do CNJ conforme interesse à OAB nacional. Em homenagem ao Direito, é bom que se impeça o seu representante falar por último depois da defesa. Pelo menos isso para começar.
Assim, no julgamento do juiz, a catraca 8 x 6 funcionou a todo o vapor. O relator, um advogado conselheiro, cassou o juiz, seguiram-se seis votos indepedentes pela censura do juiz, depois advieram os demais sete votos, dos juízes da área federal, do Ministério Público e dos advogados, num elogio só à concepção do relator. Um elogio ao arbítrio. Resultado: cassação do juiz 8 por 6. Estava selado seu destino, independente do voto do Presidente do STF ou do seu ilustre substituto constitucional.
Destino triste e glorioso pela injustiça que indigna. Está certa Indira Gandhi: "é um grande privilégio ter vivido um dia difícil".
Um só conselheiro, advogado também, sem estar autorizado pelo regimento interno do CNJ, suspendeu a posse do Presidente eleito por 27 Ministros no TST. Fê-lo porque o quis e de antemão sabia do apoio na proporção mínima de 8 por 6.
Em pedido dirigido ao STF, o Ministro Dias Toffoli literalmente pôs abaixo esta decisão exorbitante.
A Magistratura altiva e independente tem muito mais a dizer, por hoje guardemos a idéia da catraca oito por seis.





Viva a Magistratura independente
O mais importante Tribunal do país, o Supremo Tribunal Federal - STF, fiel à grandeza da sua história e à independência das decisões judiciais, tem coibido decisões abusivas do Conselho Nacional de Justiça - CNJ.
Noticia-se que a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB federal, está protestando ao STF em prestígio ao CNJ.
A OAB é uma instituição pujante, representativa dos advogados, com serviços mais do que relevantes à sociedade e à Justiça e que liderou movimentos democráticos e institucionais históricos.
Peca, porém, aos postar-se ao lado do CNJ de encontro ao STF.
E peca mortal, pecado sem perdão fácil, transgressão de instituições vitais ao país, que a OAB sempre defendeu e agora se põe contra, principalmente a independência das decisões judiciais, indispensável à democracia, ao exercício da advocacia e ao reconhecimento dos direitos do povo.
Os advogados e os juízes do país crêem na importância das decisões judiciais independentes. A OAB federal está contra.
A OAB tem assento e voz no CNJ sob o título de representante da sociedade, além do direito à participação de quatro advogados entre quinze conselheiros que julgam.
Quatro entre quinze, um terço praticamente, além da fala do ilustre presidente da OAB como representante da sociedade, até mesmo falando depois da defesa, quando se trate processo disciplinar contra Magistrado, em flagrante ofensa ao direito de defesa. O defensor pedindo a absolvição, e o advogado maioral, depois do defensor, pedindo a condenação do juiz, como já aconteceu.
Aí é que está o problema, um problemão, um problemão é um baita problema, corpulento, vistoso.
A Constituição da República e o Estatuto da OAB, nenhuma destas leis fundamentais, nomeiam a OAB representante da sociedade. A OAB representa os advogados e, elogiosamente, lidera assuntos do interesse da sociedade, juntamente com outras entidades classistas. A representação da sociedade é atribuição de outras instituições democráticas.
Portanto, muito antes de protestar ao STF, a OAB deve revisar o título da sua atuação no CNJ.
Como Magistrado que sou, que repudia a subserviência da Magistratura independente ao CNJ, afirmo em alto e bom som que a OAB não tem legitimidade para falar em nome da sociedade junto ao CNJ, nem o seu ilustre presidente pode falar depois da defensor do Magistrado acusado.
Neste estado de coisas também não tem legitimidade de protestar ao STF em apologia do CNJ, indevidamente protestanto contra a independência das deciões judiciais.
Dou um viva à Magistratura e à Advocacia independentes, que garantem ao povo o seu direito, e as decisões do STF, coibindo os abusos do CNJ.
Dou mais um viva ao STF, como guardião da Constituição de República e baluarte da Magistratura independente, fortalezas do direito e da democracia.