Quase 40% das prisões em flagrante feitas pela polícia foram revogadas pela Justiça depois de serem analisadas por juízes responsáveis pelas audiências de custódia. Instituídas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) em 24 de fevereiro, as audiências tornaram obrigatória a apresentação aos magistrados em um prazo de 24 horas dos suspeitos detidos pela polícia em parte da zona sul e no centro de São Paulo.
Das 365 prisões analisadas nas audiências até o dia 18 de março, 222 foram mantidas (60,2% do total) pelos juízes. Nos demais casos, os magistrados decidiram que os presos tinham direito de aguardar o julgamento em liberdade. Eles decidiram relaxar a prisão, conceder a liberdade provisória ou encaminhar o acusado para a assistência social. "Havia prisões que não precisavam ser preservadas. O resultado reafirma a necessidade de a autoridade judiciária apreciar se a prisão precisa ser mantida", afirmou o presidente do TJ-SP, o desembargador José Renato Nalini.
No próximo dia 24, a Justiça vai ampliar o programa. Também passarão a ser submetidas às audiências todas as prisões em flagrante ocorridas nas zonas norte e oeste de São Paulo. Para Nalini, a realidade encontrada até agora deve reproduzir-se em outras regiões do Estado. Até o fim do ano, a medida deve ser ampliada para toda a capital. Ao mesmo tempo que a Secretaria da Segurança Pública espera pôr à disposição da Justiça 20 mil tornozeleiras eletrônicas para monitorar quem é posto em liberdade.
Na semana passada, o colégios dos presidentes de Tribunais de Justiça do País decidiu apoiar a adoção das audiências. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) também resolveu apoiar a iniciativa do TJ-SP. Em nota, João Ricardo Costa, presidente da entidade, afirmou que "as audiências de custódia são um instrumento efetivo de combate à tortura e uma forma de garantir o controle do ingresso de presos no sistema prisional brasileiro". As audiências, portanto, devem evitar a superlotação desnecessária dos presídios.
O exemplo de São Paulo motivou outros 15 Estados a procurar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para estudar a implementação de projetos similares. O balanço paulista foi avaliado positivamente pelo juiz assessor da presidência do CNJ Luís Geraldo Lanfredi, que classificou a iniciativa como uma "mudança de paradigma" e "salto civilizacional". "Estamos rompendo com uma cultura. A pretensão maior é estabelecer um controle efetivo da porta de entrada do sistema prisional. Isso não quer dizer impunidade, mas melhor conferência da necessidade de prisão", disse o magistrado.
Tribunais em Tocantins, Amazonas, Mato Grosso, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná, Piauí, Paraíba e Pernambuco tiveram visita do CNJ para tratar das audiências ou estão com visitas agendadas. Maranhão, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Bahia, Maranhão e o Distrito Federal sinalizaram interesse de adoção do programa, mas ainda estão definindo oportunidade para visita, segundo informações do conselho.
Avaliação prematura. Voz dissonante em meio aos elogios ao projeto, o Ministério Público de São Paulo afirmou que é prematura a avaliação dos resultados. "Mas a instituição tem por vocação o trabalho permanente para o aperfeiçoamento do sistema de Justiça e não é refratária a inovações", disse por nota o procurador-geral de Justiça, Márcio Fernando Elias Rosa. A Associação Paulista do Ministério Público (APMP) chegou a ingressar com ação para suspender as audiências, mas teve mandado de segurança negado pelo Tribunal de Justiça.
Fonte: Estadão