“O crime não é um problema do Judiciário, do Ministério Público. É um problema nosso, é social”, comentou a desembargadora Jane Silva, da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), ontem durante a audiência pública relativa à construção da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) feminina, em Belo Horizonte.

O evento visou tornar pública essa proposta, que vem ao encontro dos anseios de uma parcela da sociedade, que busca na Apac uma forma mais digna de cumprir a pena. Se concretizada, essa será a primeira Apac na cidade e a terceira Apac feminina no Estado: hoje, elas funcionam apenas nas cidades de Itaúna e Governador Valadares.

Algumas famílias de pessoas que estão presas estiveram na audiência apoiando a causa. A albergada D.G, que está na Penitenciária Feminina Estevão Pinto, conta que conheceu o trabalho da Apac e deu seu testemunho dizendo: “eles acreditam em nós”.

A desembargadora Jane Silva defende o cumprimento da pena, mas ressaltou que deve haver dignidade para pagar pelos erros. “Não estamos trabalhando pela impunidade, mas respeitando a dignidade humana. Quem vai preso perde a liberdade e direitos políticos, e não todos os seus direitos. A dignidade é um deles”, esclarece.

História

Ela lembrou que na Idade Média não havia pena de prisão. “Os padres, quando cometiam pequenos deslizes, ficavam em uma cela rezando, pagando a penitência – de onde vem o nome penitenciária – e saíam de lá pessoas melhores”, diz. Mas, segundo ela, hoje acontece o contrário, “as pessoas saem PhD em crimes”. E acrescenta: “não falo em ressocializar, pois a maioria nunca foi, de fato, inserida na sociedade, mas em socializar essas pessoas”.

Ela ainda lembra do cuidado que se deve ter ao dar notícia da aplicação da pena, porque, para um juiz, aquela pessoa é criminosa, mas, para a família, “é um pai, um filho, um marido, amado, que está sendo preso”.

Apoio

Durval Ângelo, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, falou dos pontos positivos da Apac – dignidade e economia para os cofres públicos – e disse que é preciso ter o “sonho ardente de ser feliz”, fazendo referência a um livro que leu recentemente e enfatizando que a pessoa é feliz com o outro, no relacionamento.

Frei Gilvander também esteve presente e acredita que é preciso “acalentar no coração a utopia de construir sociedades sem prisões”.

Implantação

Os passos seguintes para a implantação da Associação na comarca incluem a composição de uma comissão representativa, visita a Apacs em funcionamento, criação jurídica da Apac, realização de seminários de estudos sobre o método, criação e organização de equipe de voluntários. Após a instalação física da Apac, são firmadas parcerias com outras instituições e realizados cursos de formação de voluntários de longa duração, antes da inauguração do Centro de Reintegração Social (CRS)

O juiz Luiz Carlos Rezende e Santos, coordenador-executivo do Projeto Novos Rumos na Execução Penal, do TJMG, afirma que “só discutir o assunto já vale a pena, porque se sabe que algo não vai bem”.

Apacs

Atualmente, existem em Minas 24 Apacs que administram seus Centros de Reintegração Social em prédio próprio, do Estado, alugado ou anexo à cadeia pública, sem o concurso das polícias e de agentes penitenciários e com aplicação total ou parcial dos 12 elementos fundamentais do método. Há, ainda, 58 Apacs em implantação, em estudo ou em fase de construção do Centro de Reintegração.

Fonte: TJMG