Quando uma pessoa é condenada a pagar multa em processo penal, mas deixa de quitar sua dívida, a legitimidade para a cobrança é do Ministério Público. É o que diz Incidente de Uniformização de Jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, recém-aprovado pela Câmara de Uniformização de Jurisprudência Criminal. O colegiado decidiu que, embora o “calote” siga legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, não cabe ao Fisco apresentar o processo de execução.
A controvérsia sobre quem tem a legitimidade existe desde 1996, quando a Lei 9.268 fez uma mudança no artigo 51 do Código Penal. Até então, a inadimplência permitia que o condenado fosse detido. Com a nova regra, a multa passou a ser considerada dívida de valor, devendo ser cobrada com base nas normas relativas à execução fiscal.
A Câmara de Uniformização entendeu que, apesar da mudança, a titularidade continua sendo do Ministério Público atuante na Vara de Execuções Criminais, já que a multa não perdeu seu caráter de sanção penal. Para o desembargador Pedro Coelho Vergara, relator do caso, o legislador alterou o Código Penal apenas para impedir que a pena de multa seja convertida em privativa de liberdade. Segundo ele, o processo de execução continua sendo regulado pela Lei de Execuções Penais, que, “propositalmente, não foram revogados”.
Visão divergente
Os desembargadores analisaram a questão depois de pedido apresentado pela 6ª Câmara Criminal. A tese vencedora, no entanto, diferencia-se de decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça. A 5ª Turma já avaliou que “compete ao juízo da Execução Penal determinar a intimação do condenado para realizar o pagamento da pena de multa (...) e, acaso ocorra o inadimplemento da referida obrigação, o fato deve ser comunicado à Fazenda Pública a fim de que ajuíze a execução fiscal no foro competente”, conforme o REsp 832.267.
A 6ª Turma seguiu o mesmo entendimento, como no REsp 1.160.207 e no REsp 1.166.866. Para a 3ª Seção do STJ, é possível inclusive extinguir a execução penal quando o condenado já cumpriu pena privativa de liberdade e deixou a multa pendente. Na avaliação dos ministros que integram a seção, não faz sentido que o réu que deixou a prisão não consiga obter sua reabilitação apenas por ter deixado de pagar a multa, submetida a procedimento de cobrança cível.
O tema aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal desde 2004, quando a Procuradoria-Geral da República pediu solução à "confusão hermenêutica" gerada com a mudança no artigo 51 do Código Penal. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3150, a PGR critica o deslocamento da legitimidade processual à Fazenda Pública, por entender que isso viola a atribuição constitucional do Ministério Público. O relator é o ministro Marco Aurélio.
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Fonte: Conjur