* Michel Curi

O ponto de equilíbrio entre dois pesos ou duas forças é o que proporciona à sociedade um ambiente ideal para que os seres humanos nela inseridos possam melhor desenvolver sua individualidade, sob as égides do pluralismo e da fraternidade de molde a beneficiar o indivíduo, mas, sobretudo, a própria sociedade. Sem o equilíbrio, a individualidade descamba para o individualismo nefasto e consumista, em que parte substancial da população é submetida a um processo de “idiotização”, patrocinado por mídia barata que, sem qualquer senso de ética, não hesita, por exemplo, em despertar, de modo dissimulado, a sexualidade erótica e precoce de crianças tão somente para transformá-las, o quanto antes, em consumidores sem causa; e o ser humano transformado em consumidor sem causa, com sua docilidade e estupidez, constitui, enfim, a célula “mater” do capitalismo selvagem e individualista. O socialismo, por sua vez, sem o equilíbrio de forças que apenas o regime democrático pode proporcionar, acaba se transformando em comunismo férreo, policial, intolerante e intolerável; nesse caso, o homem do povo, o indivíduo, passa a ser, diante do Estado, um nada no vácuo da inexistência.

Em verdade, o capitalismo selvagem é tão temerário para o regime democrático quanto o socialismo estatizante. De fato, nossa recente história mundial já demonstrou que tanto a direita extrema quanto a esquerda radical culminam no totalitarismo. Tanto o nazismo de Hitler quanto o comunismo de Stálin renegaram, em primeiro plano, a democracia que se consubstancia no regime das liberdades. Para ambos, esse regime constituía óbice intransponível às suas taras e desideratos, pelo que deveria ser rechaçado a qualquer custo. O certo é que só haverá plena democracia, como regime das liberdades, se houver um equilíbrio duradouro entre liberdade e igualdade. O excesso de liberdade nos leva ao capitalismo selvagem e cruel, onde sempre vence o mais endinheirado. Igualdade excessiva conduz a sociedade humana a uma condição surreal que só pode ser mantida por um estado totalitário e policial. Constata-se, então, que só o equilíbrio entre liberdade e igualdade assegura uma sociedade civil mais justa e solidária. Menos vulnerável, ademais, aos eventuais desmandos de qualquer governante de plantão; é o estado democrático de direito, que vive e se desenvolve sob a égide da lei.

O presidente Lula encontrou o ponto de equilíbrio para eleger-se e se reeleger. E, trilhando o caminho do meio, realizará um bom governo e será um marco histórico. O governador Aécio Neves também caminha pelo meio e já demonstrou saber que os conceitos de direita e esquerda são vetustos e se encontram, há muito, ultrapassados. Percebeu que quem anda para os lados é caranguejo. Por isso, caminha para frente e olha para os lados apenas para não ser atropelado; chegará, assim, à presidência da república.

Afirmo ainda que não só a pessoa humana deve trilhar o caminho do meio; nossas leis e instituições, também. Ressalte-se, a propósito, que só uma novel legislação processual, fundada no equilíbrio entre a celeridade processual e a segurança jurídica, poderá fazer com que o Estado, através do Poder Judiciário, proporcione às pessoas uma prestação jurisdicional eficaz. Houve uma era nefasta em que os poderes de julgar, de legislar e de governar se concentravam num só grupo ou numa só pessoa. Finda essa era, as nações ocidentais, como que traumatizadas, passaram a valorizar sobremodo, em seus códigos processuais, a segurança jurídica, descurando-se da celeridade processual. O Brasil estava nessa. Assim, foi desenvolvida, aqui, em nome dos princípios da ampla defesa e do contraditório, uma legislação processual inserida num cipoal tresloucado de recursos que postergam a coisa julgada (leia-se a eficácia imutável da decisão judicial) para “o dia de são nunca”. Daí, a lentidão.

Lado outro, não há como voltar ao passado e trocar uma justiça lenta por uma injustiça rápida.

Como se vê, o imbróglio da legislação processual que emperra o Judiciário, ensejando a impunidade, só será trespassado quando o legislador encontrar o equilíbrio entre a segurança jurídica (fundada nos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal) e a celeridade processual (que assegura maior rapidez e, portanto, eficácia à prestação jurisdicional).

De duas, uma: ou o bem se situa no meio ou o mal, nas extremidades.


* O autor é juiz de direito e professor universitário


PUBLICADO NO PRIMEIRO CADERNO DO ESTADO DE MINAS (SEÇÃO OPINIAO) DE 20-01-2007