Hoje, qualquer tema criminal chega ao Supremo Tribunal Federal, seja ele constitucional ou não. Por isso, a corte deveria ter sua competência reduzida. A opinião é do ministro Teori Zavascki, que assumiu o posto em novembro do ano passado e já teve de julgar o processo mais volumoso da história da corte, a Ação Penal 470, sobre o mensalão. “No meu voto sobre o cabimento de Embargos Infringentes, eu disse que a competência originária deveria ser reduzida drasticamente, ou até ser eliminada em matéria criminal”, afirma.

O ministro foi o homenageado do XVII Congresso Internacional de Direito Tributário da Associação Brasileira de Direito Tributário (Abradt), que acontece em Belo Horizonte desde a última quarta-feira (25/9). O evento tem como tema central o Federalismo e a Tributação.

Zavascki falou ainda sobre a dependência das políticas fiscais em relação ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Para ele, como cada estado no tem poder de veto no conselho e mudanças dependem de decisão unânime, basta apenas um voto contrário para vetar qualquer política fiscal. E isso estimula a guerra fiscal.

“A exigência da unanimidade no Confaz estabelece limites e um tratamento formalmente igualitário, mas que pode importar numa desigualdade material. Isso é um problema político”, diz.

Leia a entrevista:

ConJur — Com o fim do julgamento do mensalão, o Supremo volta à sua rotina. Quais são os temas mais relevantes a serem apreciados?
Teori Zavascki — Só de Direito Tributário temos mais de 120 processos esperando julgamento. O Supremo está com um déficit muito grande de processos pendentes. O sistema de repercussão geral impôs ao Supremo ônus adicional de julgar essas matérias. São temas selecionados que têm, como o próprio nome diz, repercussão geral, e suspendem a tramitação de todos os processos desse assuntos no Brasil.

ConJur — Os ministros estão ansiosos para julgar outras matérias?
Teori Zavascki — Já começamos a julgar outros processos. Essa semana tinha programado oito ou nove desses temas em matéria administrativa e tributária, além de alguns processos penais. Ontem (26/9) começamos o julgamento de um processo contra um deputado federal. O juiz não pode ficar ansioso por temas, o juiz não escolhe os processos.

ConJur — O julgamento da AP 470 vai ficar para o ano que vem?
Teori Zavascki — Não sei.

ConJur — Cinquenta e três sessões de julgamento apenas de um caso não é um exagero levando-se em conta tantos outros processos?
Teori Zavascki — Sim. Os processos de competência originária são um problema, por exemplo. No meu voto na Ação Penal 470 sobre o cabimento de Embargos Infringentes, eu disse que a competência originária deveria ser reduzida drasticamente ou até ser eliminada em matéria criminal.

ConJur — Apesar de ter repercussão geral, ainda chegam ao Supremo muitas ações que não tratam de questões constitucionais, principalmente na área criminal.
Teori Zavascki — Esse é o principal problema. Hoje, qualquer tema criminal chega ao Supremo, seja constitucional ou não. O STF dedica um tempo muito grande a questões penais não constitucionais. E isso tem o custo da demora e de travar processos. Sou partidário de que o Supremo, para se viabilizar institucionalmente, tenha sua competência reduzida no futuro.

ConJur — Como isso seria feito?
Teori Zavascki — Mediante reformas constitucionais que abordem, por exemplo, o foro por prerrogativa de função. A essa altura, o tema está maduro. Parece que há um consenso no sentido de que a redução de competência do Supremo em matéria penal é um passo que tem que ser dado.

ConJur — Apesar do federalismo, o país, principalmente na área tributária, vê desequilíbrios entre os entes. Como o ministro avalia esse quadro?
Teori Zavascki — O país segue o modelo federalista, mas tem vários problemas, inclusive operacionais. O federalismo foi implantado a partir de uma certa autonomia dos estados e municípios, e tem a União que, na área fiscal, mantém uma posição de preponderância. Compete à União estabelecer políticas publicas para reduzir a desigualdade.

ConJur — A crítica é que os estados e municípios não têm autonomia financeira e, consequentemente, acabam não tendo autonomia política. A guerra fiscal é fruto de uma crise do federalismo?
Teori Zavascki — Sim. Essas iniciativas estaduais de conceder isenções e incentivos fiscais para atrair indústrias são um mecanismo de defesa contra os estados mais ricos e industrializados. Isso estabelece a guerra fiscal, que é um problema de federalismo.

ConJur — Mas buscando mais autonomia, os estados atropelam o Confaz.
Teori Zavascki — Exatamente. Porque hoje as políticas fiscais na área de ICMS são muito dependentes do Confaz. E o conselho só pode tomar certas decisões por unanimidade. Cada estado tem poder de veto. Basta um estado ser contra que fica vetada qualquer política nessa área. Então, se estabelece a guerra fiscal.

ConJur — A necessidade da votação unânime no Confaz é um entrave?
Teori Zavascki — Sim. A exigência de unanimidade no Confaz estabelece limites e um tratamento formalmente igualitário, mas que pode importar numa desigualdade material. Isso é um problema político. No âmbito jurídico, as coisas estão estabelecidas.



Revista Consultor Jurídico, 27 de setembro de 2013