Existem nas Comarcas de Minas Gerais diversas iniciativas de implementação da conciliação e mediação como meios de resolução de conflitos. Desde 2006, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais participa da Semana Nacional da Conciliação e, em 2011, foram instituídos os Centros Judiciários de Solução de Conflitos (Cejus). Todas essas iniciativas são imprescindíveis para que a Justiça esteja preparada para as exigências trazidas pelo novo Código de Processo Civil (CPC), que entra em vigor neste mês.


De acordo com o artigo 334 do novo CPC, ao verificar o preenchimento dos requisitos da petição inicial, não sendo o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou mediação.

A Comarca de Viçosa, na Zona da Mata mineira, já está preparada para essa mudança, pois a conciliação e a mediação já fazem parte do processo de trabalho da Justiça. Em 2013, foi instalado o Centro Judiciário de Solução Autocompositiva de Conflitos. A equipe de trabalho é formada por estagiários, bolsistas, voluntários e uma supervisora, sob a coordenação das juízas Adriana Fonseca Barbosa Mendes e Giovanna Travenzolli Abreu Lourenço. O projeto também firmou parceria com a Univiçosa.

conciliacao

Quando a juíza Adriana Fonseca, da 2ª Vara Cível de Viçosa, chegou à Comarca, percebeu que não havia comunicação entre a sociedade civil organizada e os poderes constituídos. "Qualquer problema que chegava até o fórum, ainda que não fosse solucionado na Justiça, não tínhamos para onde encaminhar", explica a magistrada.

"Buscamos capacitar o maior número possível de conciliadores e mediadores e, principalmente, conscientizar a população sobre os benefícios da conciliação" - Juíza Adriana Mendes

Sensibilização

Antes e depois da instalação do Cejus, foi realizado um grande trabalho de sensibilização com os advogados, promotores, defensores públicos e professores das universidades. "Além disso, buscamos capacitar o maior número possível de conciliadores e mediadores e, principalmente, conscientizar a população sobre os benefícios da conciliação. Com esse trabalho, todos os envolvidos foram muito receptivos", explica a magistrada.

O Cejus tem sido cada vez mais procurado pela população da Comarca, conforme afirma a juíza Giovanna Travenzolli, da 1ª Vara Cível e coordenadora do Cejus de Viçosa. Em dois anos, apenas na Comarca de Viçosa, 2.256 casos de mediação e conciliação passaram pelos setores processual e pré-processual. Em todos esses casos, os cidadãos são incentivados a exercitar a autonomia e participação na resolução de suas próprias questões.

"Enquanto a mediação é indicada para situações complexas, a conciliação é mais objetiva e lida com questões pontuais" - Juíza Giovanna Travenzolli

Todos os processos que chegam ao Judiciário passam por uma triagem feita pelas juízas, que, posteriormente, os encaminham ao Cejus. Essa etapa é importante para que as magistradas avaliem como cada caso deve ser tratado: por mediação ou conciliação.

A juíza Giovanna Travenzolli esclareceu que existem diferenças entre os dois mecanismos. "Enquanto a mediação é indicada para situações complexas, a conciliação é mais objetiva e lida com questões pontuais", disse a magistrada.

Ampliação


A aceitação por parte da sociedade e dos operadores do Direito tem proporcionado a ampliação das iniciativas de conciliação e mediação. Em 2015, o Cejus de Viçosa implantou o projeto "Oficina de Pais e Filhos", do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que oferece ajuda a casais que passaram, ou estejam passando, por processo de separação e tenham filhos menores de idade. O objetivo é oferecer suporte para que as famílias possam lidar da melhor forma possível com esse processo delicado.

A ideia por trás da conciliação e da mediação vai ancorar ainda projetos que estão em desenvolvimento no ambiente educacional, como o "Mediação Escolar", de modo a incentivar o diálogo, o respeito e a colaboração na resolução de conflitos, e o "Justiça Comunitária", que pretende fazer o caminho inverso, levando o Poder Judiciário até as diversas regiões da Comarca de Viçosa.


Conciliação nos Juizados

A cultura da solução pacífica de conflitos tem sido sedimentada nos Juizados Especiais Cíveis de Belo Horizonte devido ao esforço mútuo de juízes e conciliadores. A busca recorrente pela conciliação confirma a necessidade de adoção de procedimentos informais e simplificados pela Justiça para atender às demandas da população.

conciliacao2

Segundo o juiz da 9ª Unidade Jurisdicional Cível do Juizado Especial, Geraldo Claret de Arantes, as pessoas que recorrem à conciliação são aquelas que, em geral, estão tendo seus direitos vilipendiados. “Quem procura o Juizado Especial, normalmente, é o cidadão que já bateu em todas as portas, está esgotado, angustiado e sendo espoliado de seus bens materiais. Existe uma corrente de pensamento no Judiciário - e que, felizmente, está sendo superada - que acha que as pessoas recorrem à Justiça porque gostam de litigar”, declara o magistrado.

"No meu setor, o índice de acordo é superior a 70%. Isso significa que são 70% de ações que morrem aqui na conciliação" - Juiz Geraldo Claret

Nesse modelo alternativo de solução de conflitos, é fundamental que o juiz exerça seu papel de pacificador social. Em muitos casos, o magistrado precisa intervir em discussões acaloradas e usar sua sensibilidade para fazer com que as partes cheguem a um consenso. “As pessoas chegam às audiências com o juiz bastante nervosas, já dizendo que não há acordo. Nesse primeiro momento, deixo que elas façam a catarse necessária para que se acalmem. Na minha mesa, tem sempre água gelada e balas, que ofereço às pessoas. Isso ajuda a aliviar a tensão. Depois disso, as partes começam a conversar e o conflito é resolvido. No meu setor, o índice de acordo é superior a 70%. Isso significa que são 70% de ações que morrem aqui na conciliação e não vão sufocar ainda mais o Judiciário.”, contou o magistrado.

Cidadão satisfeito

Após ter seu nome incluído indevidamente no cadastro de inadimplentes por uma empresa de telefonia, a estudante Milhene Rocha procurou, pela primeira vez, a 9ª Unidade do Juizado Especial de Belo Horizonte para tentar solucionar o conflito. Em cerca de 20 minutos de audiência, as partes chegaram a um acordo, sem qualquer intercorrência. A empresa se comprometeu a tirar todos os débitos do nome da estudante, que, em 30 dias, vai receber R$ 2,9 mil de indenização por danos morais.

“Fiquei surpresa com a rapidez no atendimento e na solução do meu problema. Optei pela conciliação para ter uma compensação mais rápida. Não quis enfrentar o desgaste gerado pelo excesso de burocracia na Justiça Comum. No Juizado Especial, todo o processo durou menos de três meses”, contou Milhene.

O autônomo Márcio Ribeiro, que também teve o nome negativado por uma cobrança indevida de uma empresa, viu na conciliação uma forma prática e rápida de ter sua demanda atendida. “No meu caso, não adiantou procurar o Procon. Na conciliação, a burocracia é menor, e o pessoal que nos atende é mais bem preparado. Isso faz toda a diferença”, disse ele.

Em 15 minutos de audiência, Ribeiro conseguiu negociar com a empresa. Ele terá seu contrato cancelado e seu nome retirado do cadastro de inadimplentes. Como indenização por danos morais, vai ter R$ 3,1 mil depositados em sua conta bancária em, no máximo, 30 dias.

Cejus

O TJMG adotou a conciliação nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejus), que englobam as antigas “Centrais de Conciliação” e os “Juizados de Conciliação” (trata-se da conciliação relacionada à Justiça comum) e nos Juizados Especiais.

Somente na última Semana Nacional da Conciliação, ocorrida de 23 a 27 de novembro de 2015, o TJMG realizou 16.550 audiências e atendeu cerca de 40 mil pessoas. O total do valor dos acordos cíveis homologados chegou a R$ 91 milhões.

O juiz Carlos Donizetti Ferreira da Silva, juiz auxiliar da 3ª vice-presidência do Tribunal, destacou que a enorme quantidade de processos tramitando na justiça atualmente e, ainda, a crescente judicialização das relações humanas firmaram a conciliação como uma forma mais barata, rápida, justa e autônoma de se resolver conflitos de interesse. “O incentivo à utilização do método de conciliação, além de contribuir para a diminuição do número de processos, torna a resolução do conflito mais sólida e duradoura, já que são as próprias partes que colaboraram para alcançar aquele acordo”, observou Carlos Donizetti.

Segundo o magistrado, as partes costumam sair mais satisfeitas com a resolução de seus conflitos, gerando soluções duradouras. “Ao fim das sessões de conciliação e mediação, é aplicado um formulário de avaliação da satisfação do usuário, no qual as partes têm manifestado altos índices de satisfação por participarem de processos de conciliação. Em primeiro lugar, porque são ouvidas e se sentem acolhidas e, em segundo, porque elas estão escolhendo o que será o melhor para ambas”.

O juiz avaliou ainda que o incentivo à utilização da conciliação e mediação tende a gerar uma atitude de maior autonomia nas partes, uma vez que elas percebem que são capazes de resolver seus próprios conflitos de forma pacífica. “Para se ter uma ideia dos produtivos resultados, nas conciliações pré-processuais realizadas no Centro Judiciário de Belo Horizonte em 2015, foi obtido o índice de 79% de acordo” afirma.