A simples crítica a um colega de trabalho não configura crime de difamação e injúria, já que, para tanto, é preciso comprovar a vontade de atingir a honra do ofendido. Esse foi o entendimento da desembargadora Cecília Marcondes, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao julgar queixa-crime interposta depois de uma briga entre dois procuradores regionais do trabalho do estado de São Paulo.
Por unanimidade, os desembargadores que participaram no Órgão Especial do tribunal, da última quarta-feira (26/11), rejeitaram a queixa-crime por falta de justa causa para instaurar Ação Penal. O Ministério Público já tinha opinado pela rejeição da queixa já que, para o órgão, não houve a tipicidade das condutas.
A briga aconteceu por e-mails trocados entre os dois procuradores — que foram encaminhados pelo sistema interno do Ministério Público do Trabalho e depois publicado em lista nacional de mensagens eletrônicas do MPT. No e-mail, um procurador acusava o outro de ter ido a uma reunião do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), afirmando que ele — autor da mensagem — é que era o responsável por representar o MPT junto a reuniões do órgão.
Acontece que o procurador — destinatário da mensagem — foi designado para ir às reuniões do Cade. Seu colega, então, sentiu-se “passado para trás” e mandou uma mensagem eletrônica dizendo-se vítima de “fogo nada amigo” e acusou o outro de querer “abafar o caso”. Sentindo-se ofendido com as mensagens, o procurador que foi às reuniões no Cade entrou com ação no Judiciário acusando seu colega de difamação e injúria.
De um lado, o procurador acusado de ter feito as ofensas, representado pelo advogado Alberto Zacharias Toron e Leopoldo Stefanno Louveira, do Toron, Torihara e Szafir Advogados, admitiu que as palavras usadas nas mensagens foram fortes, mas não poderiam caracterizar crime de injúria. Do outro, o procurador que afirmava ter sido difamado, representado pelo advogado André de Camargo Almeida, alegava que houve a prática de crimes contra a honra, além de falta funcional.
Os dois advogados fizeram sustentação oral durante a sessão do Órgão Especial. Toron começou a defesa lembrando dos feitos do advogado Márcio Thomaz Bastos, que morreu no último dia 20 de novembro, a quem chamou de “mestre particular”. “Mais do que lutar pela advocacia, lutou pela Justiça do nosso país”, afirmou.
Sobre o caso, Toron afirmou que os escritos não devem ser interpretados por frases isoladas. “É o contexto no qual ela se dá que deve ser levada em consideração.” Segundo o criminalista, o caso é relacionado ao Direito de Crítica. “O exercício dessa crítica representa algo de muito saudável para a democracia em geral e, em particular, das instituições. Aqui o problema é de se colocar uma mordaça em relação a um membro da instituição”, afirmou, durante a sustentação.
Já o advogado André de Camargo Almeida sustentou que o fato de o MP ter opinado pela não tipicidade da conduta mostra “mera intenção de abafa do caso”. Segundo ele, hoje em dia “estamos abrindo muito o leque permissivo da criminalidade, muitas vezes sob o auspício de uma suposta política criminal. Temos como condutas que seriam absurdas há alguns anos atrás, porque estamos permitindo um elastério das condutas ilícitas”, afirmou durante a sessão do órgão especial.
Mas, para a relatora, desembargadora Cecília Marcondes, houve apenas um “embate de ideias” em que cada procurador do trabalho defendeu seu ponto de vista. “No calor das discussões é possível que se escreva e/ou fale palavras ou expressões pouco corteses, mas que não configuram, por si só, crime contra a honra”, afirmou no acórdão.
Segundo ela, para configuração dos crimes contra a honra deve, “no mínimo”, haver indício do propósito de ofender e injuriar e de causar dano à honra da vítima para que seja instaurada a Ação Penal — o que, para a desembargadora, não aconteceu nesse caso. Considerando não haver justa causa para instauração de Ação Penal, a relatora rejeitou a queixa-crime.
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Fonte: Conjur