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O desembargador Gutemberg da Mota e Silva participou nesta terça-feira (18/02) de sua última sessão como membro da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em função de sua aposentadoria compulsória, a partir de 21 de fevereiro próximo. Para homenageá-lo, no encerramento desta etapa da vida, desembargadores, familiares, amigos, operadores do direito e servidores do Tribunal se reuniram em plenário da Unidade Raja, onde aconteceu a sessão.
O desembargador José de Anchieta da Mota e Silva, irmão do homenageado, lamentou a legislação que impõe aos magistrados a aposentadoria compulsória aos 70 anos, quando muitas vezes eles se encontram no auge do vigor intelectual. Dirigindo-se diretamente ao irmão, lembrou a trajetória percorrida por ele, desde quando foi aprovado em 3º. lugar no concurso para a magistratura, até se tornar desembargador, em 2009. Destacou a cultura invejável do irmão, a atuação sempre imparcial, a dedicação ao trabalho e o fato de ele sair do Tribunal deixando o serviço zerado. “Perde a magistratura, ganha a literatura”, disse, destacando a paixão e o talento de Gutemberg da Mota e Silva para as letras.
Colegas de câmara do homenageado, os desembargadores Álvares Cabral da Silva e Paulo Roberto Pereira da Silva, também proferiram algumas palavras durante a homenagem. Cabral e Silva destacou o zelo e a rapidez com que o desembargador Gutermberg da Mota e Silva atuava: “Deixará uma lacuna; o Tribunal perde um de seus baluartes; trata-se de um grande batalhador, que voltará agora para os braços de sua família. Mas será sempre lembrado e cultuado aqui, onde foi amigo de seus pares”, declarou. O desembargador Pereira da Silva, por sua vez, ressaltou que o momento era um misto de tristeza, pela perda do colega leal, e de alegria, pois o homenageado deixava a magistratura com saúde e poderia, a partir de agora, ter mais tempo para a família e a literatura.
A desembargadora Mariângela Meyer, também integrante da 10ª Câmara Cível, afirmou que o desembargador honrou o nome que lhe foi dado: Gutemberg. “Creio que foi em homenagem a outro homem das letras”, disse, referindo-se a Johannes Gutemberg, a quem se atribui a invenção da tipografia. Destacando traços comuns na trajetória do magistrado e do inventor alemão, a desembargadora afirmou que a serenidade e a bondade do homenageado certamente eram frutos de uma educação religiosa, de berço. “Foi uma grande satisfação estarmos juntos nesta câmara”, afirmou.
O desembargador José Antonino Baía Borges, 2º vice-presidente do TJMG, disse que falaria não como desembargador, mas como amigo do homenageado, contando que conheceu Gutemberg da Mota e Silva ainda na faculdade de direito. Lembrou que um amigo em comum tinha a melhor definição do homenageado, ao dizer: “Conheço pouca gente tão mineira como Gutemberg”, observando que, embora nascido no Rio Grande do Norte, o desembargador homenageado apresentava características usualmente atribuídas aos mineiros, como a discrição e o silêncio.
Em Minas, ressaltou o desembargador Baía Borges, Gutemberg da Mota e Silva enalteceu todas as atividades que exerceu – no jornalismo, na magistratura e na literatura – e soube fazer as melhores escolhas na vida, entre as quais ele destacou a da companheira de vida, a esposa Maria da Glória que, juntamente com os filhos do casal, o genro e a neta, prestigiou a sessão.
O homenageado foi saudado ainda pelo desembargador aposentado José Fernandes Filho. “Nós nos perguntamos, em certo momento da nossa passagem aqui, qual foi o sentido da nossa vida”, afirmou. “Nesta hora absurda da aposentadoria compulsória, que afasta do Tribunal um homem da sua envergadura, posso afirmar que o senhor veio para servir, que atuou a serviço dos outros”, declarou.
Qualidades
Representando a assessoria jurídica do desembargador homenageado, o assessor Gabriel Freitas Garcia de Carvalho ocupou a tribuna para destacar as inúmeras qualidades do magistrado, em especial o senso de justiça, o zelo pelo trabalho, a busca da paz na solução dos conflitos, as portas sempre abertas para receber as partes. Afirmou que o local de trabalho, ao lado do homenageado, tornou-se uma sala de aula, onde os assessores puderam aprender muito sobre direito, português, literatura, experiência de vida e, em especial, sobre a importância das decisões claras, acessíveis ao cidadão comum.
O desembargador que se aposentava também foi homenageado pelos advogados Raimundo Cândido e Rachid Silva, este último representando o presidente da OAB- Minas, Luís Cláudio Chaves, que reiteraram as palavras de elogio dirigidas a Gutemberg da Mota e Silva.
Em nome da família, a irmã do homenageado, Marli Socorro Mota, bastante emocionada, disse que uma nova fase se iniciava na vida “daquele menino magro e desengonçado”, que gostava de brincar de pelada na infância, quando o futuro ainda estava tão distante. Disse que foram muitas as dificuldades enfrentadas por ele, até chegar ali, mas sempre com muita ética. “A meu ver, foi um julgador competente, digno de sua toga, que nunca se esqueceu do lado humanitário em suas decisões”, observou.
Presidente da 10ª Câmara Cível, o desembargador José do Carmo Veiga de Oliveira destacou em seu discurso, entre outros pontos, que toda autoridade vem de Deus e que não é fácil exercê-la. Para bem atuar, quem possui autoridade, ressaltou, deve submissão e obediência a Deus, agindo com o cuidado de se afastar do autoritarismo e da omissão. Na sua avaliação, o desembargador Gutermberg da Mota e Silva, como autoridade estabelecida no Poder Judiciário, atuou na busca da paz social e, a cada passo e em cada momento de sua vida, foi conduzido por Deus. Disse, ainda, que o homenageado podia ter a tranquilidade de ter cumprido integralmente seu ministério.
Despedida
Ao discursar, o desembargador Gutemberg da Mota e Silva agradeceu a todas as homenagens, aos assessores e à família. Lembrou que havia se passado um quarto de século desde o dia 21 de outubro de 1980, quando ele tomou posse como juiz de direito, sentindo o peso da responsabilidade que acabara de assumir. Chegou à comarca de Rio Piracicaba, onde encontrou uma vida muito diferente daquela vivida na capital. Na memória, veio-lhe a lembrança da primeira noite, sozinho em casa, como juiz – “a noite inaugural”, ressaltou – e o primeiro dia de trabalho, quando atendeu a uma mulher do povo.
Após recordar outros momentos marcantes da carreira de magistrado, pelas comarcas de Minas, e depois atuando na capital e já como desembargador, o homenageado afirmou que se aposenta não deixando nenhum processo sem decisão. “O juiz é o direito feito homem; se o magistrado não for vigilante, a voz do direito permanecerá destoante”, declarou. O desembargador criticou o uso, na magistratura, da linguagem empolada, que acaba por obscurecer as decisões. Na avaliação dele, o vocabulário usado deve ser inteligível ao cidadão comum, às pessoas do povo, como a mulher que ele recebeu, em seu primeiro dia de trabalho como juiz.]
Sobre a aposentadoria, ele citou Alceu Amoroso Lima – “A vida é uma sucessão de adeuses”. O desembargador agradeceu a todos que fizeram parte da sua caminhada no mundo do direito, afirmando ter aprendido muito com cada um. Em relação ao que chamou de “a tão propalada depressão depois da aposentadoria”, disse ter um poderoso antídoto contra ela: mais tempo para a família, o lazer e a literatura.
Trajetória
Natural de Marcelino Vieira (RN), o desembargador Gutemberg da Mota e Silva se formou em direito pela UFMG em 1967, tornando-se mestre em direito administrativo, pela mesma instituição, em 1986. Atuou como advogado entre 1980 e 1988, quando entrou para a magistratura.
Desembargador do TJMG desde 2009, Gutemberg da Mota e Silva atuou como juiz de direito nas comarcas de Rio Piracicaba, São Domingos do Prata, Divinópolis e Belo Horizonte, onde foi também juiz eleitoral. No magistério, foi professor nas faculdades de direito Milton Campos e Fumec.


Antes de se enveredar pelo mundo do direito, o desembargador se dedicou ao jornalismo, tendo sido repórter do jornal Tribuna do Norte (RN), O Globo e Jornal do Brasil. Foi organizador do número especial “Drummond: 50 anos de Poesia”, com que o Suplemento Literário do Minas Gerais assinalou, em maio de 1980, o cinquentenário do lançamento do primeiro livro de Carlos Drummond de Andrade, “Alguma Poesia”.

Fonte: TJMG
Foto: Marcelo Albert/TJMG