Para decidir que a Farmácia Popular do Brasil em Araçatuba (SP) — que faz parte de um programa do governo federal — deve ter em seus quadros técnicos farmacêuticos registrados no conselho de classe, o desembargador Johonsom di Salvo, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, foi ao site da Prefeitura da cidade e constatou que o local alvo de um processo é uma drogaria. O curioso é que, como a Prefeitura, ré no processo, alegava que o estabelecimento era uma mera distribuidora de medicamentos, pode-se dizer que ela produziu prova contra si mesma.
O caso chegou ao TRF-3 quando o Conselho Regional de Farmácia do estado de São Paulo recorreu contra a decisão que suspendeu uma multa aplicada contra o poder público municipal pela ausência de um técnico responsável na unidade.
A Prefeitura, ao solicitar o afastamento da multa, argumentou que a farmácia popular apenas entrega medicamentos e, por isso, não precisaria manter um técnico inscrito no conselho.
O CRF, por sua vez, sustenta que a farmácia popular não se confunde com um dispensário de medicamentos. Para a entidade, trata-se de estabelecimento criado especificamente para venda de remédios a preços menores do que os praticados pelo mercado.
Para resolver a questão, Di Salvo recorreu à rede mundial de computadores. “Consultando o sítio do município de Araçatuba na internet, verifiquei que a Farmácia Popular é um estabelecimento comercial onde são vendidos 97 medicamentos diferentes, ainda que a preço mais barato do que no mercado farmacêutico comum; ou seja, é mesmo uma 'drogaria' e como tal exige-se a presença de profissional de farmácia no local”.
O desembargador acrescentou que a decisão agravada está em manifesto confronto com a jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça e do próprio TRF-3.
A presença dos buscadores virtuais, como o Google, no trabalho dos juízes tem sido motivo para intensas discussões no meio.
O processo civil moderno tem admitido uma atuação cada vez mais ativa do juiz na apuração dos fatos. “É o que a doutrina chama de busca da verdade real, justificada pelo caráter público do processo”, explica o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. Segundo a doutrina, o juiz não deve ficar inerte diante das provas produzidas pelas partes caso elas não sejam esclarecedoras o bastante.
No Brasil, o próprio Código de Processo Civil traz, em seu artigo 130, uma abertura para a atuação menos passiva dos juízes. O artigo diz que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias”, para melhor formação da convicção.
Já seu colega de corte, ministro Marco Aurélio, encara com desconfiança ainda maior o fato de juízes buscarem na internet informações sobre casos que estejam julgando. Marco Aurélio diz que “o Judiciário atua mediante provocação das partes do processo e o que não está neste, não existe, para efeito de formação de convencimento, no mundo jurídico”.
O também ministro do Supremo Ricardo Lewandowski faz coro e afirma que apenas o que está integrado aos autos pode ser usado para fundamentar a decisão de um julgamento. Mas diz pensar que, “para formar convicção pessoal íntima”, é válido que um juiz faça suas próprias pesquisas. Com informações da assessoria de imprensa do TRF-3.
Fonte: Conjur