Em entrevista à reportagem da Amagis, a vice-presidente do STF, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, que deverá presidir a Suprema Corte do país a partir de setembro deste ano, destacou, sobre o Dia Internacional da Mulher (8 de março), os desafios que ainda precisam ser enfrentados, o trabalho de eliminação da violência contra a mulher e a importância do Judiciário nesse processo de pacificação. A magistrada participou de evento sobre o tema em Belo Horizonte nesta segunda-feira, 7, na sede da OAB/MG.

ministra cármen lúcia

Foto: Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Dia 8 de março

"O Dia Internacional da Mulher não é um dia exatamente de comemoração, mas um dia de parar para refletirmos sobre o que aconteceu, o que conquistamos e o que falta conquistar, o que piorou nesses últimos tempos, já que quanto mais a mulher avançou houve também uma reação contrária, que fortaleceu nichos de preconceitos. Em uma sociedade de tantas carências, existem mulheres que não podem sequer contar o que houve com elas. Acho que há muito a ser feito. Andamos, mas precisamos ainda caminhar muito."

“Ainda há muita coisas para se pensar e se propor. Essa é uma data para refletir, ver no que avançamos e por que não avançamos o tanto que poderíamos. Essa não é uma questão só da comunidade jurídica, mas de toda a sociedade. Porque a mulher violentada não é uma pessoa feliz, e o homem agressor também não é uma pessoa feliz. Quem violenta é porque não está bem. As pessoas que estão bem não têm motivo pra viver em situação de agressão permanente".

Campanha de Justiça pela Paz em Casa

“Esta é a semana em que, pela quarta vez, estou coordenando a Campanha de Justiça pela Paz em Casa, que é uma campanha feita pelos Tribunais de Justiça com os juízes, que fazem um esforço concentrado de julgamento e mais rapidez, empenho, além dos que já são postos, para o andamento dos processos em casos de violência doméstica".

"E essa semana que começa hoje (dia 7 de março), em todos os 26 estados e mais o Distrito Federal, acontece com a participação dos juízes, e tem sido uma demonstração de muito compromisso dos magistrados. Nas três semanas anteriores, conseguimos fazer com que os resultados, em muitos casos, superassem o que vinha acontecendo em seis meses. A resposta que os juízes têm nos dado nessa campanha demonstra que nós juízes estamos atentos ao que acontece na sociedade, precisamos dar essa resposta e com uma efetiva participação de todos, que agradeço muito".

"Queremos ajudar toda a sociedade a refletir e pensar o tema da violência doméstica, prestando nosso serviço, mas, principalmente, fazendo com que a sociedade saiba que nós estamos preocupados e atentos e querendo dar respostas a essa violência que aumentou muito. O fim do ano passado surpreendeu o mundo inteiro ao mostrar que o Brasil é o 5° país em maior nível de violência contra a mulher, mesmo tendo, por exemplo, a Lei Maria da Penha, que, este ano, completa dez anos e foi um avanço".

"Precisamos continuar com um permanente processo de aperfeiçoamento. Nesse caso, o Poder Judiciário tem uma participação efetiva, compromissada, mas que não pode deixar de ser prestada, pensando e refletindo sobre novas possibilidades".

Participação de magistrados

“Temos muitos juízes, homens, em grande parte dessas varas de 'paz' doméstica, como eu chamo, que têm tido uma participação proeminente, de enorme destaque. Eles pensam alternativas. Homens e mulheres. Estamos atuando em conjunto nesses casos, porque essa é uma questão social, de todos, e onde houver paz doméstica, homens, mulheres e, principalmente, os filhos dessas famílias, terão mais chance de ser felizes. Se não construirmos essa paz agora, e dermos chances às nossas crianças, estaremos nos omitindo. Como juízes, temos que pensar no presente e no futuro".

Igualdade

"Muito se fala, sobretudo nesta semana, sobre a questão da desigualdade entre homens e mulheres. Essa é apenas uma das manifestações das muitas desigualdades que fazem com que a sociedade não seja uma sociedade justa. E, por isso mesmo, muito se falará sobre isso. A questão agora não é só de falar, mas de fazer as coisas acontecerem. E há muito que fazer. Não é possível que a gente continue achando que o Brasil é um país do futuro, se o futuro nunca chega".

"A desigualdade é o principal problema do Brasil, mas a desigualdade não apenas entre homens e mulheres, mas ricos e pobres, desigualdades regionais e tantas outras. Somos ótimos em fazer lei, o nosso problema é aplicá-las".

Preconceito

"O preconceito passa pelo olhar, pela forma de tratar. E o Direito não faz milagre. Portanto, não se acaba com o preconceito por meio da Constituição, nem de lei e de decreto. Passa por mudança de cultura, que nós da comunidade jurídica temos a obrigação, porque temos o privilégio de conhecer mais Direito que os outros, de fazer com que todo mundo saiba de seu direito para que cada homem e cada mulher reivindique esses direitos".