Bruno Terra Dias*


Observar direitos, garantias e prerrogativas dos magistrados, nos dias que correm, tornou-se objeto de contraditório na imprensa, como também, sob determinadas condições, de ataques diretos, especialmente por quem não entende o significado das instituições para o regime democrático. Os exemplos se multiplicam, mesmo contra todos os esforços para estancar algo que parece teimar em reeditar-se sob os mais diversos disfarces e pretextos.

Assim é que a classe dos magistrados tem vivenciado a mais ampla sorte de situações que transtornam a própria compreensão do que seja a magistratura, daquilo que um dia tocou a consciência de cada um no momento da escolha profissional. O enxovalhamento de um juiz, por meio de redes sociais, pelo simples descontentamento com uma decisão exarada em processo, mostra o nível de desprestígio público do Poder Judiciário, comprometendo a normalidade da convivência da sociedade com as instituições no que pretendemos seja uma duradoura democracia. É o que acontece em Muzambinho, no Sul de Minas, e em tantas outras comarcas de Minas Gerais.

Não se trata de situação que atinja apenas os membros do Poder Judiciário, mas de algo que se verifica em mais ampla medida, sacrificando a generalidade dos servidores públicos, especialmente os de mais elevada formação e responsabilidade, destacando-se os agentes políticos.

Rápida leitura ao texto de Aaron Schneider, cientista político, professor e pesquisador da Tulane University – Estados Unidos, Corruption and the World Bank (disponível em pdf no site da instituição de ensino), publicado em 2008, e que discorre sobre a preocupação da instituição financeira internacional com o saneamento de práticas indesejadas no serviço público de países em desenvolvimento, a partir dos anos 1990, é suficiente para perceber que o quadro de desgaste tem raízes muito mais profundas do que possa imaginar a pessoa menos atenta ao cenário político. Um pequeno trecho do ensaio é capaz de jogar luzes a respeito do paulatino desprestígio que, sobre a atividade pública qualificada, se abateu nos últimos quinze ou vinte anos: “... houve uma atenção inadequada ao relacionamento entre as circunstâncias colocadas em empréstimos e o impacto provável em incentivos para o pessoal do serviço público. Um exemplo está nos cortes exigidos nos gastos com pessoal, incluindo frequentemente contenções de despesas e fixação de percentual no total de gastos. Tais limites foram colocados em leis nacionais de responsabilidade fiscal e incentivados por um Banco ansioso para disciplinar a despesa pública. Em muitos casos, tais medidas foram eficazes, baixando a conta e salários do setor público a níveis inferiores.”

Se, hoje, recebemos subsídios menores que os que eram pagos anos atrás, tendo a opinião pública se formado no sentido de que ganhamos excessivamente e com insuficiente retorno social, isto tem origem em outras terras, ou, terra de ninguém, sede de instituições financeiras internacionais. Não se trata de discutir disfunções do serviço público em geral, mas uma receita geral, aplicada indiscriminadamente a diversos países, como se o desenvolvimento e também suas mazelas fossem equivalentes em todos os países de fora do bloco denominado “primeiro mundo”.

Da igual forma, se a estima da carreira, perante a sociedade, já não é a mesma, isto também decorre de fatores não exclusivamente nacionais que formatam a opinião pública. Dessa maneira de ver e entender os fatos, parece natural a um cidadão comum questionar pessoalmente o magistrado, não sua decisão. Os direitos, garantias e prerrogativas do magistrado, e dos agentes políticos como um todo, em tais circunstâncias, parecem, a olhos desavisados, não ter conexão com práticas saudáveis da democracia.

É tempo de o Poder Judiciário se abrir, praticar a igualdade, fazer-se conhecido da população e se compromissar publicamente. É tempo de o presidente e os candidatos a presidente do TJMG conhecerem todos os quadrantes do Estado e se habilitarem a negociar soluções, de acordo com as necessidades de cada região, para o problema da prestação jurisdicional. Sem isso, continuaremos distantes e mal compreendidos pela sociedade, nossa remuneração tenderá a não recuperar patamares de outrora, nossos direitos, garantias e prerrogativas parecerão privilégios injustificáveis.

*Presidente da Amagis