Na breve solenidade de abertura dos trabalhos dos tribunais superiores, na manhã de ontem, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, afirmou que "a Corte tem a real dimensão de que não lhe cabe substituir-se ao legislador, muito menos, restringir o exercício da atividade política, de essencial importância no Estado constitucional". A seu ver, "legislador democrático e jurisdição constitucional têm papéis igualmente relevantes nos Estados constitucionais contemporâneos, sendo a interpretação e a aplicação da Constituição tarefas cometidas a todos os poderes, assim como a toda a sociedade".

A cerimônia - que não durou mais de meia hora - não contou com a presença dos até então presidentes do Senado, Garibaldi Alves, e da Câmara, Arlindo Chinaglia - atarefados no Congresso com o processo eleitoral de seus substitutos. Eles enviaram breves mensagens, que foram lidas por Gilmar Mendes. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva - reunido com o Ministério na Granja do Torto - foi representado pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, que leu mensagem presidencial de 50 linhas.

Direitos fundamentais

Gilmar Mendes deu ênfase ao "tratamento ímpar" que o Supremo tem dado à proteção dos direitos fundamentais de caráter processual e às garantias jurisdicionais para a proteção da ordem constitucional. E citou algumas decisões que tiveram "importante significado na efetivação dessas garantias", como a vedação ao uso abusivo de algemas, além de registrar "os esforços do Poder Judiciário como um todo, no último ano, de zelar por essas garantias, como demonstra a drástica redução das interceptações telefônicas verificada pelo Conselho Nacional de Justiça".

"Repita-se que o cumprimento da difícil tarefa de assegurar que os direitos e garantias declarados no texto constitucional tornem-se realidade efetiva para toda a população brasileira não importa interferência negativa nas atividades do legislador democrático", disse Gilmar Mendes.

O presidente do STF destacou os avanços da Corte durante o ano passado, com a edição de súmulas vinculantes, por exemplo, e disse que "um desafio maior se impõe à sociedade brasileira como um todo: é preciso acabar com a velha mentalidade de que, no Brasil, o reconhecimento e a concretização de direitos só se dá por meio judicial".

"A judicialização pura e simples, por excessiva, além de se afigurar como uma das causas da morosidade processual, acaba desaguando no conhecido círculo vicioso em que mais processos demandam mais juízes, mais cargos, maior infra-estrutura e, assim, infindáveis recursos a fim de manter, sempre em exponencial inchaço, a máquina administrativa necessária para fazer frente a atividade que deveria ser meio de pacificação social, nunca um fim em si mesma".

Independência dos poderes

Na mensagem lida pelo ministro Tarso Genro, o presidente Lula ressaltou que "vivemos, felizmente, uma época marcada pela solidez de nossas instituições democráticas", e que "essa normalidade só é possível graças à harmonia e à independência que marcam as relações entre os três poderes da República". Destacou ainda "os esforços que o Judiciário vem empreendendo no sentido de se tornar cada vez mais ágil e eficiente e - sobretudo - ainda mais próximo das comunidades e mais acessível a todos os cidadãos".

O presidente referiu-se ao pacto entre os poderes da República, firmado em 2004, e a um segundo pacto que "definirá os principais projetos de lei a serem priorizados para continuarmos aperfeiçoando o sistema normativo brasileiro e dotando a Justiça de mais agilidade e efetividade".

O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, em seu pronunciamento, disse esperar que o STF reconheça, ainda este ano, o poder de investigação criminal do Ministério Público, um dos assuntos mais polêmicos constantes da pauta do tribunal.

(Matéria publicada no jornal Gazeta Mercantil, edição de 03/02/2009)