As mais de 60 mortes e decapitações no presídio de Pedrinhas, no Maranhão, e as más condições em que vivem os presos brasileiros foram denunciadas à Comissão de Direitos Humanos da ONU nesta segunda-feira, em Genebra, na Suíça. Conectas, Justiça Global e Sociedade Maranhense de Direitos Humanos pediram a presença no Brasil do relator especial das Nações Unidas sobre tortura, Juan Mendez. De acordo com as entidades, o problema não está apenas em Pedrinhas, mas em todo o país.
“Infelizmente, não é só no Maranhão que essas verdadeiras masmorras são encontradas. Em todo o Brasil, prisioneiros não só são mantidos em instalações superlotadas, mas também são submetidos à falta de acesso aos cuidados de saúde, alimentação adequada, água potável suficiente, saneamento básico, emprego e educação”, relatou a advogada Vivian Calderoni, que falou à Comissão em nome das entidades.
A advogada lembrou que, apenas no ano passado, 62 presos foram assassinados em Pedrinhas e outros quatro foram mortos no início deste ano. “Para piorar a situação, a solução escolhida pelas autoridades públicas foi militarizar a prisão e construir novas instalações. É importante salientar que nenhuma dessas decisões foi tomada mediante consulta à sociedade civil”, disse Vivian, afirmando ainda que a situação em Pedrinhas continua crítica.
No pronunciamento conjunto, as entidades afirmam que “o Estado brasileiro não tem demonstrado capacidade de gerenciar a crise”. Segundo o depoimento de Vivian, mesmo diante das medidas cautelares recomendas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA, o Brasil “respondeu apenas com a força militar”, deixando de lado itens como a prestação de contas. Para as entidades, nem a polícia estadual nem Força Nacional têm recebido treinamento específico para lidar com a situação nos presídios. “Um vídeo amplamente difundido mostra policiais militares estaduais disparando balas de borracha contra prisioneiros nus e indefesos, com a Força Nacional de Segurança Pública observando”, afirmou Vivian Calderoni.
Ao final de sua participação na reunião da ONU, as entidades pediram que o Brasil convide o relator especial sobre tortura das Nações Unidas para uma inspeção no presídio maranhense a fim de preparar recomendações para uma “solução sustentável contra a tortura e outras formas de tratamento cruel, desumano e degradante em Pedrinhas e em todo o país”. Segundo o Conectas, o relator especial sobre o tema, o argentino Juan Méndez, já havia manifestado interesse em acompanhar no Brasil o caso de Pedrinhas. No entanto, ele não se manifestou depois da denúncia brasileira em Genebra.
O Itamaraty informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o convite aos relatores especiais da ONU é “aberto e permanente” e que está pronto a dialogar com a Comissão de Direitos Humanos da ONU neste caso assim como dialoga com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, onde as ONGs também já apresentaram a denúncia.
— O convite do Brasil aos relatores é realmente aberto e permanente. Mas é necessário que o governo agende a visita e faça o acerto da logística, formalizando a viagem. É isso o que esperamos— disse Vivian, por telefone, ao GLOBO.
De acordo com a advogada, na quarta-feira as ONGs terão uma reunião privada com o relator especial para tratar do assunto.
Mais denúncias de abusos
O Brasil também será denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA por outro tipo de abuso: a violência policial durante os protestos populares. No dia 28 de março, nove entidades, entre elas a Conectas e Justiça a Global, participam de uma audiência pública em Washington para apresentar 200 casos de violações ocorridas desde as manifestações de junho do ano passado. Também serão relatados casos de repressão ao trabalho de jornalistas e advogados. A expectativa das ONGs é que a denúncia resulte em uma nota de repreensão ao Brasil por parte da CIDH.
Fonte: O Globo