Em março do próximo ano, o novo Código de Processo Civil (CPC) entrará em vigor. A publicação da nova norma gerou algumas polêmicas no meio jurídico. Em entrevista ao site da Amagis, o desembargador Caetano Levi Lopes comentou algumas das dúvidas surgidas com o novo CPC.

Como o novo Código de Processo Civil poderá garantir celeridade aos julgamentos?

Várias medidas foram tomadas nesse sentido. Entretanto, uma delas, que prometia ser instrumento eficaz, lamentavelmente, sofreu veto presidencial. Refiro-me ao artigo 333, que permitiria a conversão de ações individuais múltiplas ou com alcance coletivo, em ação coletiva. Outros instrumentos de menor eficácia foram criados e mantidos. Alguns serão, francamente, contraproducentes, como o julgamento em ordem cronológica (art. 12) e a contagem de prazos em dias úteis (art. 219). No último caso, é fácil prever as discussões intermináveis que irão surgir, com invalidação de atos, multiplicação desnecessária de recursos, enfim, alargamento da duração do processo. Seria preferível a ampliação nominal dos prazos, mantida a regra atual de dias corridos.

A exigência de ordem cronológica para julgamento dos processos pode ferir a autonomia dos tribunais para definir suas prioridades?

A exigência contida no art. 12 é pouco eficaz em razão da longa lista de exceções elencadas no seu § 2º. E, como tradicionalmente acontece, as exceções acabam por prevalecer. Por exemplo: o disposto no inciso IX do mencionado parágrafo será utilizado com frequência para contornar a regra. Assim, não vislumbro lesão à autonomia dos Tribunais, porque estes, na definição de suas prioridades, poderão invocar a excepcionalidade.

A determinação para que os juízes de instâncias inferiores obedeçam à jurisprudência de Tribunais Superiores fere o poder de decisão deles?

É da tradição das ordens jurídicas filiadas ao civil law fazer julgamentos artesanais, invocando, às vezes de modo equivocado, o livre convencimento do juiz. É desconsiderado um bem maior: a segurança jurídica. Parece-me que o legislador de 2015, seguindo uma tradição inaugurada com a Emenda Constitucional nº45, tende para o sistema do common law. Numa época em que a sociedade brasileira procura maciçamente, como nunca aconteceu antes, a tutela jurisdicional, a multiplicação das demandas judiciais é exponencial. É até uma exigência de ordem prática a vinculação das instâncias inferiores à jurisprudência de Tribunais Superiores. É chegada a hora de se romper com o mito individualista do livre convencimento individual para prestigiar e até mesmo justificar a existência de decisões dos Tribunais Superiores. Longe de ferir o poder individual de decisão dos juízes, a vinculação atende a legítimo anseio social.

Como a participação de entidades representativas nos Tribunais pode contribuir para os julgamentos de processos de repercussão social?

Em primeiro lugar, os órgãos diretivos do Tribunal devem providenciar adaptação urgente do regimento interno. Suas normas devem ser claras e objetivas quanto ao procedimento célere a ser observado. Em segundo lugar, devem criar a cultura de fiel observância das normas regimentais. É a parte mais difícil porque envolve mudança cultural. Mas tenho esperança que a mudança irá ocorrer porque a maioria dos juízes e juízas está imbuída de forte espírito público neste sentido. Por fim, o Tribunal pode valer-se da já mencionada exceção contida no art. 12, § 2º, IX, do novo CPC. Quanto mais rápido for julgado o conflito que tenha maior repercussão social, maior será o ganho em segurança jurídica para a sociedade.

Como o senhor avalia o trabalho da comissão de juristas que elaborou o novo Código de Processo Civil?

O trabalho da Comissão, ao elaborar o anteprojeto, foi importante como primeiro passo para ser iniciado o processo legislativo. Houve certa dúvida se haveria reforma do atual CPC ou elaboração de um novo código. Mas o propósito foi salutar. O Brasil necessita, urgentemente, romper o impasse decorrente da busca exponencial pela tutela jurisdicional e a morosidade da resposta em decorrência de estruturas arcaicas, inclusive no plano legal. Os integrantes da comissão, juristas de peso, tentaram encontrar a solução e só merece aplauso o trabalho que desenvolveram.