A presunção de inocência está prevista no parágrafo 2º do artigo 6º da Convenção Europeia de Direitos Humanos. Prevê o dispositivo que todo mundo é presumidamente inocente até que sua culpa seja legalmente provada. No julgamento desta sexta, a corte mitigou esse princípio ao estabelecer que, se a condenação é anulada e não é feito novo julgamento, o réu não pode ser considerado um inocente erroneamente condenado. Não é vítima de erro judicial. Tecnicamente, ele é um inocente aos olhos da Justiça, mas que já passou anos atrás das grades e não vai receber nenhuma compensação por isso.
A história analisada pelos juízes ilustra bem a situação de quem acaba caindo nesse limbo jurídico. A britânica Lorraine Allen foi condenada a três anos de prisão pelo assassinato do seu filho de quatro meses. A condenação foi baseada em laudo médico que apontou como causa da morte do bebê danos cerebrais comuns em crianças que são sacudidas com violência. Depois que Lorraine já tinha cumprido a pena, novo laudo médico colocou em dúvida a causa da morte do bebê. Ela recorreu à Corte de Apelação e a condenação foi anulada. Como a pena já tinha sido cumprida, o Ministério Público não pediu novo julgamento.
Tecnicamente, ao suspender o julgamento que condenou Lorraine, o que a Corte de Apelação fez foi absolvê-la da acusação. A britânica começou uma nova batalha na Justiça para receber indenização por danos morais, alegando que foi vítima de erro judicial. Fracassou em todas as instâncias por não se encaixar em nenhuma das definições britânicas de erro judicial.
Até recentemente, depois de ter sua condenação anulada, o réu precisava provar sua inocência para ser considerado vítima de erro judicial e ter direito à indenização. Em maio de 2011, a Suprema Corte do Reino Unido anunciou o que foi considerado pelos advogados como um dos julgamentos mais importantes da história do país. O tribunal decidiu que, para receber indenização do governo, não é mais preciso comprovar inocência. Os julgadores da corte máxima britânica ampliaram o conceito de erro judicial para abranger também os casos em que a Corte de Apelação anula a condenação do réu porque surgiram provas que, se tivessem sido apresentadas no julgamento, o corpo de jurados não teria decidido pela condenação.
O caso de Lorraine não se encaixou nesse novo conceito de erro judicial porque a Corte de Apelação considerou que, com o novo laudo médico, havia uma possibilidade de que o júri a absolvesse da acusação. Mas, sem essa certeza, não havia como reconhecer que ela era uma pessoa inocente condenada por erro da Justiça.
Para a Corte Europeia, tanto a lei como a Justiça britânica estão de acordo com a Convenção de Direitos Humanos. Os juízes europeus explicaram que a absolvição de Lorraine aconteceu por motivos formais. A Corte de Apelação não analisou o mérito, mas apenas a possibilidade de um eventual veredicto diferente. De acordo com a corte europeia, caberia ao júri — e só a ele — analisar a inocência ou culpabilidade de Lorraine. Sem um novo julgamento, ela não tem como ver sua inocência reconhecida e não tem direito a se declarar vítima de erro judicial.
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