Nesta quarta-feira (14/5), terá início, no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a I Jornada de Direito da Saúde, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça. O encontro reúne magistrados, membros do Ministério Público e de Procuradorias, profissionais, gestores e acadêmicos de saúde, para debater os problemas inerentes à judicialização da saúde. No evento, também serão apresentados e apreciados enunciados interpretativos sobre o direito à saúde, que serão debatidos em Grupos de Trabalho.
A Jornada faz parte das ações do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, criado em 2010 pelo CNJ para o monitoramento e a resolução das demandas de assistência à saúde. Para a conselheira supervisora do Fórum, Deborah Ciocci, o maior desafio para o Judiciário nessa área é assegurar a aplicação prática do Artigo 196 da Constituição Federal, que garante a todo cidadão o acesso universal e igualitário ao sistema de saúde, sem interferir na atividade que é própria do gestor público do Executivo. “O maior dilema para o Judiciário é saber os limites positivos e negativos do seu papel, para não ser ativista ou omisso aos que dele dependem”, afirma a Ciocci, quanto à judicialização de questões da saúde. Veja a programação da Jornada .
Abaixo, confira a íntegra da entrevista com a conselheira Deborah Ciocci.
Qual a expectativa do CNJ na realização desse evento?
Acredito que a Jornada será um grande passo na junção de profissionais do biodireito, da saúde pública e da saúde suplementar, possibilitando um fórum de discussão e troca conhecimentos, tanto teóricos, como de aplicação prática. Espera-se, ainda, que haja a aprovação de importantes enunciados interpretativos, que possibilitarão aos operadores do direito decidir de modo mais uniforme e aos gestores públicos e profissionais da saúde, a certeza de que tais enunciados não foram impostos de modo unilateral por profissionais do Direito, mas fruto de importantes colaborações.
Qual é o maior desafio posto hoje para o judiciário brasileiro no que tange aos direitos à saúde?
O maior desafio para o Judiciário na área da saúde é assegurar a aplicação prática do Art. 196 da Constituição Federal, que garante a todos o acesso universal e igualitário ao sistema de saúde, sem interferir na atividade que é própria do gestor público. Sabe-se que a demanda por saúde pública é grande e o recursos orçamentários para implementá-la são escassos. A compatibilização destes dois fatores, aliada ao dilema acesso quantitativo versus prestação qualitativa, é papel do Executivo, cabendo ao Judiciário apenas a correção de graves distorções. Contudo, tem se tornado cada vez mais frequente, frente os pedidos, a intervenção do Judiciário nestas questões. Assim, o maior dilema para o Judiciário é saber os limites positivos e negativos do seu papel, para não ser ativista ou omisso aos que dele dependem.
Um dos principais resultados do Fórum da Saúde foi a edição de resolução da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que exige que os planos de saúde informem por escrito e em 48 horas qualquer negativa de atendimento ao usuário. Resoluções mais rigorosas ainda são necessárias na garantia de direitos de usuários de saúde suplementar?
Muito mais que resoluções rígidas, deve-se, primeiramente, buscar a construção conjunta de soluções. Não é o operador do Direito plenamente ciente dos problemas e dificuldades práticas enfrentadas diariamente pelos gestores e profissionais da saúde. Acredito que somente no caso de manifestada falta de comprometimento de uma das partes com a busca de soluções, que adoção de medidas impositiva seja o melhor caminho.
Quanto ao serviço público, quais avanços ainda se fazem necessários na garantia do direito à saúde?
No tocante ao Judiciário, um dos avanços necessários é o maior diálogo com os gestores públicos para possibilitar o aumento da solução dos conflitos administrativamente, de modo que, ao final, haja um menor número de demandas e estas tenham uma solução mais célere. Também é necessário o oferecimento, aos juízes, de mecanismos para que possam resolver as questões fáticas com que se deparam em um processo, como, por exemplo, a necessidade ou não de um medicamento não oferecido pelo sistema da saúde, havendo outro aparentemente similar contido na lista. Há, ainda, proposta de maior rigor na apuração quantitativa de demandas nesta área, que poderá servir como importante ferramenta estatística, tanto para organização do Judiciário, quanto para um possível compartilhamento de dados com o Executivo.
A senhora acha que a população brasileira é conhecedora de seus direitos nessa área? O que falta?
Acredito que ainda falte bastante conhecimento da população sobre seus direitos e garantias na área da saúde. Muito tem sido feito por importantes campanhas de conscientização do Ministério da Saúde, da Defensoria, Ministério Público e até mesmo do Judiciário. Contudo, principalmente, na hipótese de violação de tais direitos, o cidadão de menor instrução encontra dificuldade em reivindicá-los, seja por não estar familiarizado com a área jurídica ou haver certo descrédito no Poder Judiciário quanto ao fator demora da prestação jurisdicional.
Fonte: Waleiska Fernandes/Agência CNJ de Notícias