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Financiamento imobiliário

14/01/2009 11h00 - Atualizado em 09/05/2018 15h27

Financiamento imobiliário
ADMINISTRATIVA
Autor: RICARDO TORRES OLIVEIRA

EMENTA:
financiamentoimobiliário - juros súmula 596 STF - inaplicabilidade - CDC - Lei de usura - incidência

SENTENÇA:
SENTENÇA

Vistos etc.


..................propôs ação anulatória de cláusulas contratuais cumulada com revisão do contrato contra o .............., na qual alega que:

a) firmou com o ..........., em junho de 1994, “contrato de compra e venda, mútuo com financiamento e garantia hipotecária”, tendo por objeto o imóvel onde reside;

b) cumpriu suas obrigações rigorosamente em dia, mas, devido aos altos valores cobrados, não teve mais condições de arcar com o compromisso assumido;

c) há ilegalidade na incidência da TR como índice de correção monetária;

d) o sistema de amortização da dívida deve ser revisto;

e) é abusiva a cláusula que prevê a obrigatoriedade de contratação de seguro contra danos físicos relativos ao imóvel.

Pede, em sede de tutela antecipada, que os valores em atraso sejam incorporados ao saldo devedor para que, a partir daí, seja calculado o valor razoável da prestação mensal.

Denegada a tutela antecipada pela ausência do periculum in mora e inexistência de prova inequívoca das alegações (fls. 63/64).

Contestação de fls. 68/90, aduzindo:

a) desde a assinatura do contrato, nada se alterou sem o livre consentimento das partes, fundando-se na liberdade de contratar e no princípio da autonomia da vontade e obrigatoriedade da convenção;

b) o contrato está em consonância e harmonia com a legislação pertinente e atendeu ao disposto no art. 82 do Código Civil;

c) o contrato não pode ser resolvido ou revisado judicialmente, devendo ser prestigiado o princípio pacta sunt sevanda, que exprime força obrigatória dos contratos, como resultado do acordo de vontades.

d) não há afronta a decisão proferida na ADIN nº 493-0, pois a suspensão da eficácia de determinados artigos da Lei 8.177/91, tratam de contratos celebrados pela modalidade do Sistema Financeiro Habitacional com reajuste pelo Plano de Equivalência Salarial, o que não é o caso do contrato sub judice;

e) não cabe a pretendida redução dos encargos cobrados, porque foram pactuados de acordo com as taxas de mercado, permitidas pelo Banco Central do Brasil, pelo Conselho Monetário Nacional e pela própria Lei;

f) a autora não demonstrou aritmeticamente a “hipotética contagem de juros dos juros”, não apresentando indício de prática de anatocismo;

g) o Código de Defesa do Consumidor não se aplica ao caso em discussão, pois não há relação de consumo a ser tutelada;

h) a prova pericial é desnecessária, pois por simples cálculos aritméticos verifica-se a liquidez do crédito;

Em impugnação, a autora ratifica todos os pedidos formulados na inicial (fls. 96/108).

Pela autora foi requerida a produção de prova pericial contábil, bem como a aplicabilidade do art. 6º, VIII do CDC, determinando-se que o réu deposite a importância do Ilmo perito, além da apresentação de todos os documentos que se façam necessários, a posteriori (fls. 112/117).

Ausente manifestação do réu sobre especificação de provas, conforme certidão de fl. 118.

Deferida a produção da prova pericial (fl. 119), o réu não apresentou quesitos (fl. 125), tendo a defesa o feito às fls. 126/129.

Ausente impugnação das partes (fl. 132) sobre a proposta do perito de fl. 131, homologada à fl. 135.

Laudo pericial às fls. 136/171.

Em razões finais a autora requer o acatamento do laudo pericial, reconhecendo efetivamente a cobrança dos juros excessivos e o anatocismo, bem como os direitos pleiteados na inicial.

Em apenso está, para julgamento conjunto, a cautelar inominada movida pela autora contra a requerida deste feito, tendo por objeto a suspensão de leilão do imóvel financiado, cuja data estava prevista para 23.06.2003.

A liminar foi deferida às f. 37\38, tendo a ré interposto agravo de instrumento.

Citada a demandada, ofereceu contestação, expondo os mesmos fatos e argumentos da defesa da ação declaratória.

É o relato.

DECIDO.

Mister consignar, inicialmente, que a pendenga existente entre as partes, decorrente de contrato assinado em junho de 1994, configura clara relação de consumo, a teor do que dispõem os artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor.

O contrato de f. 23 e seguintes é de adesão e, como tal, já tem suas cláusulas redigidas e impressas pela entidade financeira, o que não permite ao consumidor participar de sua elaboração de forma livre.

Esta simples impossibilidade do consumidor participar da formação do contrato, e não simplesmente assiná-lo, já vicia o ato, eis que retira do pacto a sua natureza sinalagmática.

Todo contrato deve decorrer da manifestação volitiva das partes: o consenso deve existir quanto ao objeto, preços e também quanto às cláusulas e condições.

É certo que o agente financeiro não obrigou a requerente a assinar o pacto.

Não menos certo o é, também, que a maioria esmagadora dos brasileiros jamais realizará o sonho da casa própria caso não se submeta às condições impostas pelos agentes financeiros.

Conclui-se, pois, que a liberdade no contratar foi limitada e conduzida.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 6º, previu a possibilidade de revisão contratual nas hipóteses que contempla, merecendo transcrição:

"Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas."

A desproporcionalidade entre os valores contratados, o preço do imóvel financiado e as excessivas prestações constitui fator autorizativo da revisão do pacto, modificando-se cláusulas de forma a estabelecer um equilíbrio contratual.

Note-se que não se cogitou de restabelecer o equilíbrio contratual, porquanto inexistente, mas sim de estabelecê-lo.

As normas do Código de Defesa do Consumidor têm natureza cogente e aplicação inafastável, com origem na atuação protetiva do Legislador Constituinte, a teor do disposto no inciso XXXII, do Artigo 5º, verbis:

“ impõe-se ao Estado promover, na forma de lei, a defesa do consumidor”.

Promover é realizar, efetivar, viabilizar.

Não se está aqui dizendo que da simples natureza consumerista da relação decorra a razão do consumidor.

O que se diz e cogita é que esta relação é ampla e densamente tutelada pelo Estado.

Não há se falar, então, na aplicação irrestrita do brocardo pacta sunt servanda, porquanto o mesmo pressupõe autonomia de vontade, e como já ponderado alhures, esta não se expressou de modo pleno, mas limitado.

Ademais, a natureza do contrato (financiamento de casa própria) e a relação de consumo têm preponderância sobre o argumento de imutabilidade do pacto.

Às f. 136\171, foi acostado laudo pericial sobre o qual apenas a parte autora se manifestou.

O ilustre experto foi enfático ao asseverar:

“ A taxa de juro aplicada no financiamento foi a estabelecida no contrato, ou seja: taxa anual de juros nominal de 15% ao ano e efetiva de 16,0754% ao ano, ou seja, aplicou-se a taxa de 15% que capitalizada pela Tabela Price atingiu a taxa efetiva de 16,0754% ao ano”. (item 2.2, f. 140)

“ o acessório cobrado na prestação refere-se ao seguro, que foi dividido em MPI ou seguro por morte ou invalidez permanente, e DFI ou seguro por danos físicos ao imóvel”. ( 2.3, f. 140)

“de acordo com o item 7 – campo ´valor do financiamento e condições e seu resgate´ do contrato celebr