“Uma obra se constitui de pessoas, fatos, lugares, momentos decisivos e inspirações. Uma obra divina nasce, cresce e, nesse processo, descobre seu caminho e em que direção o espírito santo quer conduzir. Normalmente, os seus protagonistas não sabem o que se sucederá. Apenas sentem um impulso forte de doação e tudo vai acontecendo. Voluntários, recuperandos e autoridades agradecem a Deus pela oportunidade de serem instrumentos de tão grandiosa obra.” Com esse registro, foi descerrada a placa de inauguração do Centro de Reintegração Social (CRS) da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) de Pouso Alegre, no último dia 7 de maio, com a presença do presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), desembargador Sérgio Resende, e da superintendente adjunta da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (EJEF), desembargadora Jane Ribeiro Silva.
Instalado numa área de 17,5 hectares, doada pela Prefeitura de Pouso Alegre, onde predomina a atividade agropecuária, o CRS tem capacidade para 200 vagas, sendo 108 no regime fechado, 60 no semiaberto e 40 no aberto. Desde meados de 2008, os regimes semiaberto e aberto já estavam em funcionamento. Já as obras do regime fechado foram concluídas este ano.
Criada juridicamente em outubro de 2003, a Apac de Pouso Alegre funcionou inicialmente em sede provisória. Em 2006, foram liberados recursos do Governo de Minas, através da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), para a construção do CRS, especificamente para os regimes semiaberto e aberto, no valor de R$ 835 mil. Em 2008, a Seds liberou mais R$ 1,125 mi para as obras do regime fechado.
A construção de Apacs têm sido o resultado do esforço conjunto do TJMG, por meio do Projeto Novos Rumos, do Governo do Estado, do Ministério Público Estadual, dos poderes locais e da sociedade civil organizada onde a Apac está sendo implantada.
Solenidade de Inauguração
A solenidade foi iniciada com a exibição de vídeo institucional da Apac de Pouso Alegre, cuja filmagem foi feita pelos voluntários Willian Fabio Pelegrini e Rithiéli Fernando Faria; a produção e edição, pelo funcionário Leonardo Soares; o texto elaborado pelo superintendente geral da unidade, Rogério Barroso, e a narração pelo recuperando Francislei Balbino.
Em seguida, o presidente do Conselho de Sinceridade e Solidariedade do regime semiaberto da Apac, recuperando Rogério Passos Moreira, disse que, quando chegou à Apac, estava destruído pela dependência química. Natural do estado de São Paulo, ele estava foragido da Justiça daquele estado e encontrava-se perambulando pelo município de Heliodora, quando foi recolhido pela Polícia Militar. Logo depois, foi transferido para a Apac de Pouso Alegre, onde inicialmente pensou em fugir. “Como não tinha processo criminal em Minas Gerais e nenhum vínculo familiar, seria fácil fugir da unidade, mas fui tão bem acolhido e tratado com dignidade, que comecei a me engajar no método e hoje estou em pleno processo de recuperação”, afirmou.
“Quem não acredita na recuperação humana, não acredita no poder de Deus”, exaltou o criador do método Apac, o advogado paulista Mário Ottoboni. Em sua saudação, Ottoboni conclamou os juízes presentes, que participaram do 2º Encontro de Magistrados Mineiros sobre o Método Apac, evento realizado também nas dependências da Apac, no período de 6 a 8 de maio, a divulgarem a metodologia nas suas comarcas. “A Apac tem a função principal de proteger a sociedade, já que cada preso recuperado é um bandido a menos na comunidade”, completou o advogado.
Ao falar aos presentes, a promotora de Justiça de Pouso Alegre e voluntária da Apac, Tereza Cristina Coutinho do Amaral Barroso, salientou a necessidade de contínuo aprimoramento da gestão da unidade, alertando para a necessidade de reformulação de alguns pontos do convênio de manutenção celebrado com a Seds.
Magistrado atuante no processo de implantação e desenvolvimento da Apac, desde sua criação jurídica, o juiz da Execução Penal da comarca de Pouso Alegre, Sérgio Franco de Oliveira Júnior, salientou que a missão agora se torna mais desafiante. “Precisamos aumentar a equipe de voluntários, principalmente na área de assistência às famílias dos recuperandos. Outro objetivo a ser alcançado em breve será o trabalho de assistência às vítimas”, frisou.
Oficinas Laborativas
Na oficina agrícola da Apac Pouso Alegre, os recuperandos produzem o alimento que consomem. São duas safras anuais de feijão, uma safra de cítricos, de milho forrageiro, de milhão grão, de café e também hortaliças. Criação de pecuária leiteira, suinocultura, cunicultura (criação de coelho) e fábrica de rações foram implantadas.
Oficinas industriais já estão sendo desenvolvidas, como serralheria, mecânica automotiva, marcenaria e fábrica de blocos. A padaria da Apac entrará em funcionamento ainda este semestre e os recuperandos estão sendo treinados pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), com aulas de confeitaria e panificação, ministradas na própria entidade, dentro de uma carreta móvel.
O Instituto Minas Pela Paz (IMPP), organização não-governamental, cuja missão é promover a justiça social, por meio de projetos e ações socioculturais que previnam a violência e criminalidade, já se encontra como parceiro da Apac Pouso Alegre, além de outras quatro. O IMPP foi criado pelas dez maiores empresas de Minas Gerais e pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). A unidade automotiva da Usiminas em Pouso Alegre, por intermédio do IMPP, está trazendo uma linha produtiva para dentro da Apac, especializada em solda e mecânica em empilhadeira. Além da unidade produtiva, 12 recuperandos participaram do curso de soldador do Senai e, automaticamente, três vagas foram abertas para recuperandos na Usiminas.
Para o regime fechado, que começa a funcionar este mês, a atividade laboral é sempre a laborterapia. Os recuperandos desse regime serão contemplados com aulas da artista plástica Kátia Alqualo, que irá ensinar técnicas de pintura em vidro e vitral. A professora irá desenvolver um artesanato com design e direção artística, alinhado às tendências que o mercado consumidor exige. Dessa forma, “os recuperandos sairão com um diferencial que o mercado exige aqui fora”, alertou.
Visão de Futuro
Atentos ao contínuo aperfeiçoamento da Apac Pouso Alegre, a equipe traçou estratégias para a entidade até o ano de 2016, onde estão previstas, dentre várias ações, a implantação de um abatedouro; minifábrica de laticínios, embutidos e defumados; piscicultura em tanque, ranário e empório para comercializar a produção das oficinas profissionalizantes do regime semiaberto, além da construção da Apac feminina. O Projeto Acolher é outra iniciativa desafiante, que irá consistir na construção de três abrigos: a “Casa de Acolhida das Famílias”, a “Casa de Acolhida ao Idoso” e a “Casa de Acolhida ao Enfermo Terminal”. A manutenção do projeto será custeada com os recursos gerados pela produção das oficinas profissionalizantes. A idéia do Projeto Acolher surgiu da experiência positiva de recuperandos que trabalharam em mutirões para a reforma de moradias de familiares dos condenados, ações sociais com idosos, auxílio a desabrigados de inundações. Com essas ações, a sociedade local passou a ter uma outra visão do condenado da Justiça e o recuperando pode experimentar a sensação de ser útil ao próximo.
Fonte: TJMG