Os Tribunais de Justiça de todo o país vão monitorar informações relativas ao avanço do novo coronavírus no contexto de privação de liberdade. As ações foram definidas durante uma série de encontros virtuais promovidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na última semana.
Mais de 600 participantes, incluindo representantes dos tribunais, discutiram ações de enfrentamento à Covid-19, tendo como pano de fundo a Recomendação CNJ 62/2020, que incentiva o Judiciário a adotar medidas para mitigar a pandemia em relação a pessoas com condenação e a adolescentes infratores.
A cada 15 dias, os Grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (GMF) dos tribunais irão enviar ao CNJ informações sobre casos suspeitos e casos confirmados da Covid-19 nos sistemas prisional e socioeducativo, assim como de pessoas isoladas e de mortes – as informações também abrangem os servidores de ambos os sistemas.
Levantamento prévio realizado pelo CNJ com informações trazidas por tribunais e equipes locais do programa Justiça Presente indicou que, na última sexta-feira (15/5), havia 1.118 servidores do sistema prisional com teste positivo para Covid-19, com 17 mortes. Também foram identificados 830 presos contaminados, com 30 óbitos – 115 casos e uma morte a mais que o número oficial divulgado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública na mesma data.
O Judiciário ainda vai monitorar o uso de recursos federais, as ações dos comitês locais de combate à Covid-19, valores e finalidades das penas pecuniárias e dados sobre equipamentos de prevenção, alimentação, materiais de higiene e de limpeza, medicamentos e testes. Também ficou acordada a realização de encontros mensais com os Tribunais para aprofundar a análise das situações locais.
Recomendação
O envolvimento dos tribunais no monitoramento da pandemia por meio dos GMFs e das Coordenadorias de Infância e Juventude (CIJs) está previsto na Recomendação 62/2020, sendo “responsáveis por compartilhar com o Conselho Nacional de Justiça, por meio do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Medidas Socioeducativas – DMF, informações a respeito das medidas adotadas para prevenção e tratamento da Covid-19 nos estabelecimentos prisionais e socioeducativos localizados em seu âmbito de atuação, nos termos do previsto no art. 6º da Lei nº 13.979, 6 de fevereiro de 2020”.
O conselheiro Mário Guerreiro, que supervisiona o DMF/CNJ, destacou a gravidade do momento e afirmou que o órgão trabalha junto ao Poder Executivo para que os recursos do Fundo Penitenciário Nacional sejam utilizados para compra de equipamentos de proteção e de testes para as pessoas privadas de liberdade. “A ideia é alinhar as ações com os GMFs locais e, assim, trabalharmos juntos neste difícil período.”
Adesão
Além da decisão sobre o monitoramento, as reuniões com tribunais tiveram a apresentação das principais ações do CNJ no combate ao coronavírus no contexto de privação de liberdade, assim como detalhamento de levantamento nacional sobre aderência dos poderes públicos locais à Recomendação 62/2020. Entre os temas monitorados, estão a criação de comitês Covid-19, planos de contingência, procedimentos de saúde relativos à porta de entrada do sistema prisional, mudanças de procedimentos e fluxos como audiências e visitas e edição de normativas sobre destinação de penas pecuniárias.
Como explicou o juiz do DMF/CNJ, Antônio Tavares, o objetivo dos encontros, além de alinhar ações no âmbito nacional, foi apresentar boas práticas e manter diálogo para uma atuação significativa do Judiciário neste momento extraordinário e excepcional. “Vamos ter atuação mais forte e comprometida com ideal de proteção de direitos, observando as situações específicas da Covid-19 nos espaços de confinamento.”
As reuniões ocorreram com o apoio do programa Justiça Presente, parceria do CNJ com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Ministério da Justiça e Segurança Pública para solucionar problemas estruturais do sistema carcerário e do socioeducativo. As ações em audiência de custódia contam com apoio técnico do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Nas reuniões regionais houve ainda participação da OMS/Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). Os organismos internacionais elogiaram a normativa proposta pelo CNJ.
Normativas
No período entre 17 e 24 de março, foram publicados 203 normativas estaduais em todo o país referindo diretamente aos sistemas prisional e/ou socioeducativo, sendo 133 delas apenas pelo Poder Judiciário, além de 69 do Poder Executivo e um texto conjunto. Dos documentos publicados pelo Poder Judiciário, 72% citam nominalmente a Recomendação 62/2020, mostrando a força institucional da normativa para além das decisões individuais de juízes. Os artigos da Recomendação com maior aderência nas normativas estaduais tratam do fornecimento de equipamentos de proteção para agentes públicos (art. 9), separação de pessoas com sintomas e encaminhamento para rede de saúde (art. 10) e suspensão das audiências de custódia (art. 8).
Outras orientações da recomendação foram observadas pelos Tribunais, como reavaliação das prisões provisórias, suspensão do dever de apresentação periódica ao juízo e máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva. Na execução penal foram adotadas medidas para concessão de saída antecipada, concessão de prisão domiciliar a quem esteja nos regimes aberto e semiaberto e colocação em prisão domiciliar das pessoas presas por dívida alimentícia.
No sistema socioeducativo, medidas adotadas a partir da Recomendação n. 62 foram aplicação preferencial de medidas socioeducativas em meio aberto e revisão de decisões que determinaram internação provisória (art. 2), reavaliação de medidas de internação e de semiliberdade e reavaliação de decisões sobre aplicação de internação-sanção (art. 3). O levantamento também identificou outras medidas não relacionadas à Recomendação 62, como suspensão de vistas e suspensão de processos ou prazos judiciais, suspensão de audiências e suspensão de julgamentos.
Fonte: CNJ