O juiz Lourenço Migliorini Fonseca Ribeiro, da Vara de Execuções Criminais de Uberlândia, participou, no último mês de fevereiro, do II Fórum Nacional de Alternativas Penais (Fonape), na cidade de Salvador (BA). Em entrevista ao site da Amagis, o magistrado afirma que a audiência de custódia é uma das melhores medidas alternativas para fazer frente ao cenário do sistema prisional brasileiro.
O senhor contou que participou, recentemente, do II Fonape. Qual foi o resultado obtido?
Tive o prazer de participar do II Fórum Nacional de Alternativas Penais (Fonape), promovido pelo Conselho Nacional de Justiça e realizado na cidade de Salvador (BA), entre os dias 24 e 27 de fevereiro. O tema principal do Fórum foi a audiência de custódia, e foram expostas diversas opiniões jurídicas, sociológicas e filosóficas sobre a questão, me deixando ainda mais convicto de que, nesse momento, é uma das melhores alternativas (para não dizer a única) para fazer frente ao cenário caótico do sistema prisional brasileiro.
Qual a realidade do sistema prisional brasileiro?
O Brasil conta com mais de 600 mil presos, com uma taxa de encarceramento de 300/100 mil habitantes, muito superior à média mundial, abrigados em condições muito ruins, com um cenário de superlotação verificado na imensa maioria das unidades prisionais, levando dois dos últimos presidentes do Supremo Tribunal Federal, ministros Cézar Peluso e Ricardo Lewandowski, a definirem as prisões brasileiras como masmorras medievais e Inferno de Dante, respectivamente.
O número de presos provisórios sobrecarrega o sistema?
Definitivamente, sim. Atualmente, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional, 40% dos presos são provisórios. E o dado mais grave, ao menos a meu sentir, é que, destes, aproximadamente 40% não ficarão presos quando da prolação da sentença condenatória, indicando que a prisão provisória é mais gravosa do que a condenação final. A audiência de custódia será decisiva nesse cenário, já que permitirá ao magistrado a análise não só do auto de prisão em flagrante, mas também um contato com a pessoa do preso, verificando eventual tortura ou abuso praticados quando da prisão e a própria regularidade da prisão efetivada.
O senhor considera que as audiências de custódias estão sendo eficazes?
Sim, com certeza. Segundo dados disponibilizados no Fonape, 45% das pessoas presas, submetidas à audiência de custódia, não tiveram a prisão convertida. E vale destacar que o índice de reincidência das pessoas submetidas à custódia é baixíssimo, em média 5%. Além disso, é primordial que o Judiciário retome o protagonismo na análise sobre a prisão, o que vem ocorrendo com a implementação das audiências de custódia.
As penas alternativas são uma solução?
Sim. Elas impedem o cumprimento da pena no ambiente prisional, que, sabida e lamentavelmente, com a estrutura atual, aumenta a reincidência. Ademais, facilitam a ressocialização do condenado ao prestar um serviço à comunidade, e poderá, a partir daí, quiçá desenvolver uma nova atividade profissional.
Qual a solução para a superlotação carcerária?
Como diz o ditado: “Essa é a pergunta que vale um milhão de dólares”. Não há uma única solução, uma fórmula mágica. Há uma somatória de fatores: a redução no número de presos ingressando no sistema, o que se dará pela audiência de custódia; a implementação de uma política de alternativas penais efetiva, com fortalecimento das estruturas sociais/comunitárias de recebimento das pessoas em cumprimento de pena; a ampliação do monitoramento eletrônico (as famosas tornozeleiras), com uma efetiva fiscalização dos beneficiários; a implementação do processo eletrônico nas Varas de Execução Penal, conforme programa em elaboração no CNJ; o fortalecimento e ampliação, para todos os Estados, do método Apac, dentre diversas outras medidas possíveis e passíveis de serem executadas.
Como tornar eficaz o cumprimento da pena, buscando reinserir o indivíduo na sociedade?
Fazendo uma efetiva fiscalização da pena; demonstrando para o indivíduo que ele pode ser útil à sociedade por meio do exercício de uma ocupação lícita, o que pode ser feito por meio de palestras psicológicas ou assistência religiosa; capacitando as pessoas após saírem do cárcere, para que possam exercer uma atividade e, se possível, fomentando a inserção destas no mercado de trabalho, já que todos sabemos sobre o preconceito existente na sociedade; dando apoio social ao indivíduo em cumprimento de pena e à sua família, reduzindo as chances de que ele passa reincidir na prática criminosa.