O juiz Luiz Guilherme Marques, titular da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora, lançou, no ano passado, o livro "Judiciário do Brasil - Propostas", que reúne 245 artigos escritos por ele. Nesta entrevista à reportagem da Amagis, o magistrado fala sobre alguns pontos do livro. A entrevista completa poderá ser conferida na próxima edição do Jornal DECISÃO.
No livro, o senhor afirma que mais importante que solucionar os conflitos é diluí-los. Como isso pode ser feito? A conciliação pode ser uma forma?
Quem fala muito em conciliação é a grande ministra Fátima Nancy Andrighi, de quem me considero discípulo e a quem faço questão de homenagear nessa oportunidade, como já fiz em outras. A expressão "diluir conflitos" é da ministra Fátima, pois se entende que decidir um processo não representa dirimir o conflito que existe, o qual pode fazer surgir outros processos.
O que o Judiciário deve fazer é realmente, por meio da conciliação ampla, "dissolver os conflitos" tanto interpessoais como das ações coletivas e outras questões gigantescas, como a dos índios, que deveria merecer um tratamento especial, pois, afinal de contas, suas terras foram desapropriadas violentamente pelos colonizadores e, até hoje, sofrem com a omissão dos Três Poderes, inclusive do próprio Judiciário, que deveria ser incisivo nesse ponto. Desculpem-me a sinceridade, mas está havendo omissão grave nessa questão.
Sendo um estudioso do Judiciário francês, e tendo em vista o recente atentado à revista Charlie Hebdo, o senhor acredita ser possível a compatibilização das liberdades individuais com o combate ao terrorismo? E qual o papel do Judiciário nessa questão?
Fiquei impressionado de colegas terem criticado o posicionamento de Marcelo Piragibe na defesa da liberdade de expressão que o pessoal do Charlie Hebdo faz questão de exercitar e que gerou o atentado que a imprensa mundial tem noticiado.
Acredito que, como cristão que sou, qualquer pessoa pode criticar ou até ridicularizar Jesus Cristo e não deve sofrer nenhuma represália por isso, o mesmo devendo acontecer quanto a qualquer outro mestre religioso, filósofo, artista etc. Afinal, somente o próprio ofendido poderia pleitear qualquer medida judicial, mas nunca justificar-se o terrorismo.
Temos de pensar em progresso e trabalhar por ele, sendo que o progresso exige o respeito à liberdade de expressão com responsabilidade é claro. O atentado terrorista não tem justificativa, segundo tenho me informado, inclusive na própria ideologia islâmica, que aconselha a paz e a fraternidade.
Em sua opinião, que requisitos fazem um bom juiz contemporâneo?
Marcelo Piragibe, que é um grande juiz, afirma que a imparcialidade é a principal virtude do magistrado. Há quem diga que é a coragem. Eu, todavia, sem desprezar essas duas virtudes, acredito que a capacidade de conciliar seja a principal, pois o mundo precisa de paz e não de demandas. As pessoas têm de aprender a dialogar, como fazem os japoneses, para os quais demandar significa falta de capacidade de conviver bem com seus concidadãos.
A cultura do momento no Brasil é a do demandismo, e isso tem gerado mais problemas do que soluções, inclusive com a sobrecarga do Judiciário como um todo, a começar pelo STF.