O coordenador dos Juizados Especiais da Comarca de Belo Horizonte, juiz Marcelo Rodrigues Fioravante, comenta nesta entrevista à Amagis os ganhos e os desafios representados pela criação dos Juizados Especiais, que completaram 20 anos em 2015.
Qual é a maior contribuição dos Juizados Especiais?
O surgimento dos Juizados Especiais representa um dos maiores avanços no sistema judiciário brasileiro. Foi uma iniciativa que ampliou o acesso do cidadão ao Poder Judiciário, trazendo seus conflitos e demandas para um sistema que busca uma solução rápida e eficaz, além de ser desapegada das formalidades e de uma relativa burocracia que se faz presente na Justiça tradicional.
Os consumidores foram os maiores beneficiários desta inovação da Justiça?
Em um primeiro momento sim, sem dúvida nenhuma. Creio que, além deles, uma série de crimes de menor potencial ofensivo passou também a ter uma tutela estatal mais significativa, alguns níveis de criminalidade que eram resolvidos por meio até da própria abordagem policial e que, muita vezes, nem eram levados ao Poder Judiciário também passaram a ser levados nesse primeiro momento. Mais recentemente, um grande avanço foi representado pelos Juizados Especiais da Fazenda Pública, que também ampliou significativamente as opções de acesso do cidadão ao sistema judiciário, em especial nos aspectos da relação do cidadão com o Estado, no aspecto previdenciário, por exemplo, no âmbito federal e estadual, na questão previdenciária, servidores públicos e medicamentos.
O senhor considera que essa experiência dos Juizados Especiais, pela rapidez, celeridade, não formalismo, pode ser um embrião de outras mudanças que poderão influenciar a própria Justiça comum?
Sem dúvida nenhuma. E tem sido o embrião de muitas mudanças. O novo CPC, quee entra em vigor agora em 2016, já se inspira em alguns princípios do Juizado Especial. Um dos maiores avanços foi a inserção, dentro do procedimento ordinário, da prática conciliação. Para você ter uma ideia, nós realizamos, somente na Comarca de Belo Horizonte, 10 mil audiências de conciliação por mês. E, por meio desta primeira etapa processual, tentamos alcançar índices de acordo em torno de 50% a 60% do volume de processos.
Percebemos que, com a judicialização cada vez maior, em qualquer assunto as pessoas querem procurar o Juizado Especial. Existe limite para isso?
Na verdade o Juizado Especial não tem uma previsão de valor mínimo de ajuizamento das ações. Em princípio, qualquer dívida seja do valor mais ínfimo até o nosso teto de jurisdição, é submetido às unidades do Juizado Especial, não existe um piso para isso. Mas o que nos preocupa muito é o fato de que o Juizado não pode ser substitutivo do serviço de atendimento que as empresas têm que proporcionar aos cidadãos, clientes e consumidores.
É uma preocupação que nos acomete, quando o cidadão procura primeiro o sistema judicial porque a empresa não lhe proporcionou mecanismo de acesso para resolver seus problemas. O cidadão deve procurar os meios de contato com os fornecedores. Além disso, existem todos os outros sistemas de atendimento aos consumidores, como o Procon e as agências reguladoras. São vários mecanismos que o cidadão tem para provocar a empresa para que sua situação seja resolvida antes de acionar o Poder Judiciário. Esse acesso ao Poder Judiciário se traduz, em um primeiro momento, em uma impressão de ganho de credibilidade, e os Juizados Especiais, em uma pesquisa realizada pela AMB há alguns anos, mostrou que, dentre os órgãos que compõem o sistema Judiciário, o Juizado Especial é aquele que inspira mais credibilidade ao cidadão. Isso é muito positivo para nós, mas não pode significar a substituição do atendimento das empresas.
O juiz Marcelo Fioravante participou do programa Pensamento Jurídico, no qual falou sobre os 20 anos dos Juizados Especiais. Assista aqui.