O caderno Direito e Justiça, do Jornal Estado de Minas desta sexta-feira, 20, traz artigo do juiz Marcos Henrique Caldeira Brant, intitulado "As Corregedorias de Justiça".

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As corregedorias de Justiça

O Poder Judiciário nacional, dividido em segmentos federal e estadual, é estruturado em 91 tribunais: Supremo Tribunal Federal (STF); Superior Tribunal de Justiça (STJ); Tribunal Superior Eleitoral (TSE); Tribunal Superior do Trabalho (TST); Superior Tribunal Militar (STM); cinco tribunais regionais federais (TRFs); 24 tribunais regionais do Trabalho (TRTs); 27 tribunais regionais eleitorais (TREs); 27 tribunais de Justiça (TJs) e três tribunais de Justiça Militar (TJMs). Excetuado o STF, que é o tribunal de cúpula, e o STM, cuja função corregedora está afeta a uma única auditoria, todos os 89 tribunais, que são independentes e autogovernáveis, têm em suas estruturas orgânicas uma corregedoria geral de Justiça ou simplesmente corregedoria de Justiça, órgão de natureza administrativa, com atuação somente na primeira instância, a quem compete correicionar magistrados (juízes), bem como os servidores e os serviços judiciais. Na segunda instância não existe Corregedoria, estando a correição de magistrados (ministros e desembargadores), servidores e os serviços judiciais específicos acometida ao próprio presidente do tribunal ou ao órgão especial, salvo se tratando de servidores para os quais haja delegação expressa à Corregedoria-geral para tal providência.

Às corregedorias dos tribunais de Justiça dos estados e do Distrito Federal também compete correicionar os serviços do extrajudicial, ou seja, os cartórios de protestos, notas e registros públicos, que são de caráter privado por delegação do poder público.

Sobrepondo as corregedorias dos tribunais, está a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão integrante do CNJ que tem atuação concorrente às corregedorias de Justiça e que é dirigida por um conselheiro e ministro do STJ, com mandato de dois anos, tendo ampla competência para correicionar magistrados (ministro, desembargador, juiz), servidores e serviços judiciais e extrajudiciais de todos os tribunais e instâncias, exceto do STF, cuja função correcional compete ao pleno e a seu presidente.

As corregedorias de Justiça executam a tripla função corregedora: de orientação, de fiscalização e de disciplina. A orientação consiste em responder a consultas, editar atos normativos, disciplinando questões não regulamentadas na legislação, auto-organizar os serviços judiciais e extrajudiciais. A fiscalização consiste em realizar visitas técnicas, inspeções e correições (ordinária ou extraordinária geral e parcial). A disciplina consiste em instaurar averiguação preliminar, sindicância, processo administrativo disciplinar e investigação criminal. As corregedorias são dirigidas pelos corregedores-gerais (ministro ou desembargador) por um mandato de dois anos, e que, face as diversificadas atribuições dos cargos, são quase sempre auxilados por juízes designados.

A origem da Corregedoria de Justiça no direito brasileiro remonta a mais de 500 anos atrás. O instituto da correição e o magistrado encarregado de executá-la vinham bem disciplinados no livro I (administração e organização da Justiça) das Ordenações do Reino de Portugal (Afonsinas-1500 a 1521; Manuelinas-1521 a 1603; e Filipinas-1603 a 1824). O ouvidor-geral e os ouvidores das capitanias, como magistrados superiores, eram verdadeiros reformadores, que tinham, entre outras atribuições, a de censor, realizando correições nas comarcas e tirando residências dos juízes, emendando erros e punindo faltas, abusos, e, ainda, realizando diligências necessárias para verificação e fiscalização da administração da Justiça. Existia, ainda, magistrados que exerciam a função de corregedor especializado do crime e do cível. A origem do título de corregedor vem do magistrado auxiliar do regedor, que era o desembargador presidente da Casa da Suplicação (o mais elevado Tribunal de Portugal). Nas colônias portuguesas, como no Brasil, a ação correcional constituía num importante mecanismo de controle interno da Justiça local, para impor a autoridade do rei sobre magistrados e serventuários, que, na estrutura social, formavam uma classe burocrática bem privilegiada.

As corregedorias de Justiça não têm competência para questão jurisdicional, razão pela qual absolutamente não influenciam nem intervêm em atos jurisdicionais (despachos, decisões e sentenças) próprios dos magistrados e que devem ser questionados, se for o caso, por via de recursos adequados. Outrossim, não se pode confundir corregedorias de Justiça com as ouvidorias de Justiça, que são órgãos administrativos dos tribunais, inspirados no instituto nórdico do ombudsman, e têm caráter informativo, educativo, propositivo e de orientação social, sem qualquer poder ou conotação correcional. Funcionam como verdadeiro canal receptor do exercício de cidadania, constituindo um importante meio de orientação e comunicação com a sociedade.

O certo é que, apesar da complexidade do sistema judicial brasileiro, as corregedorias de Justiça, como órgãos administrativos de controle interno da primeira instância, têm tido importante papel, cada qual no seu segmento, para o aperfeiçoamento, dinâmica e efetividade da prestação jurisdicional visando aumentar a confiabilidade pública.


Juiz Marcos Henrique Calderia Brant