Sob o título “Retrocesso democrático”, o artigo a seguir é de autoria de João Ricardo dos Santos Costa, Juiz de Direito em Porto Alegre e coordenador do Movimento Unidade e Valorização.*
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu artigo 10, consagrou que “toda pessoa tem direito, em plena igualdade, ….” a um “Tribunal independente e imparcial”.

As lições do nacional socialismo e o comportamento dos tribunais do Reich levaram à inclusão do dispositivo como um dos instrumentos de proteção universalmente reconhecidos na Carta das Nações Unidas.

Inserida no restrito catálogo de garantias da Declaração Universal, a independência dos juízes consiste no principal instrumento de proteção contra a barbárie que já ultrajou a consciência da humanidade.

Mal vencido meio século do Pacto Universal, verificamos que os riscos de retrocesso ainda existem e, mais grave, são reais. No Brasil, duas expressões claras do resquício fascista que ainda habita o nosso parlamento são as PECs 33 e 505/2010.

A primeira propõe anular a função constitucional do Poder Judiciário como membro republicano de controle do poder político. A segunda pretende colocar por terra a vitaliciedade dos magistrados, possibilitando a demissão administrativa de juízes. Ambas em confronto com o preceito universal da independência judicial, incorporado na Constituição de 1988.

As razões das propostas legislativas não escondem as intenções, bastando leitura rápida às respectivas justificações para percebermos que se tratam de verdadeira represália pela atuação moralizadora do Judiciário contra fichas sujas e imigrantes partidários.

A PEC 505/210 está embalada no conceito equivocado de que a punição máxima para um magistrado é a aposentadoria compulsória quando, na verdade, a exoneração é prevista, exigindo, porém, decisão judicial transitada em julgado. Ocorre que o sistema recursal brasileiro, editado pelo próprio Congresso, dificulta a punição por seu excesso de procedimentos.

A melhor solução para combater a impunidade em todos os níveis, seria aprovar a proposta de redução de recursos, medida já sugerida, aliás, pelo ex-presidente do STF, Min. Cezar Peluso. Os juízes brasileiros necessitam de instrumentos processuais eficazes, e não de mecanismos que violem a sua independência.

A magistratura defende a perda do cargo daqueles que praticam atos de corrupção no exercício da atividade jurisdicional, porém isso não pode ocorrer na precariedade de um processo administrativo e sem o esgotamento do que chamamos de devido processo legal. Necessitamos sim, e a magistratura está cobrando do Congresso, uma legislação processual mais célere e efetiva.

É grave e preocupante a facilidade com que se descartam as mais caras conquistas da sociedade, para implementarem-se modelos que privilegiam um projeto de poder, em detrimento de um projeto de nação.
A quebra institucional do Judiciário pretendida pelas PEC 33 e 505 na verdade removerá a barreira que protege as mais amplas liberdades e a independência de outros agentes vitais à democracia, como o Ministério Público, a Advocacia e a Imprensa. Ruirão no mesmo ato, sem troca de cenário.
*Publicado no blog do Fred