A juíza Vaneska de Araújo Leite, da comarca de Santa Maria do Suaçuí, foi uma das convidadas para o Seminário de Prevenção à Violência Contra a Mulher e à Violência Sexual Contra Menores: Desafios e Perspectivas. O evento foi promovido pelo 65º Batalhão da Polícia Militar (65º BPM/PMMG) e pelo Pelotão de Santa Maria do Suaçuí, na Câmara Municipal local.  

Juíza e policial militar, de pé, em evento na Câmara de Vereadores

O major Conrado, subcomandante do 65ºBPM, parabenizou a juíza Vaneska Leite pela exposição (Foto: Divulgação/TJMG)

O comandante do 65º BPM, tenente-coronel Paulo Henrique Carneiro Leão Cardoso, no início dos trabalhos, explicou que a iniciativa, em sua quinta edição, nasceu de um diagnóstico que identificou uma subcultura de altos níveis de violência doméstica e familiar e de estupro de vulneráveis enraizada, na região.

“Nosso batalhão atende a 26 cidades. Essas ocorrências, consideradas graves, atingiam cerca de 50% dos crimes. Mas são situações inaceitáveis, como agressões relacionadas ao machismo. Os maridos as justificavam como ‘corretivos’ contra comportamentos que julgavam inadequados, como o atraso no preparo de refeições e a escolha do vestuário”, afirmou o militar.

Além disso, o tenente-coronel Paulo Cardoso citou crimes sexuais contra crianças e adolescentes de ambos os sexos, praticados em geral por pessoas próximas (tios, avós, pais, padrastos), mas também por namorados, no caso de relacionamentos iniciados muito cedo. “A gravidez precoce também é frequente”, destacou.

Segundo o comandante, esses casos são preocupantes, porque ocorrem de forma oculta, no seio da família, o que dificulta a prevenção, não só para as corporações policiais, mas até mesmo para o conselho tutelar e os centros de referências de assistência social. Na região, de acordo com o militar, o flagelo já se tornou crônico.

“Trabalhamos na conscientização, porque vizinhos e conhecidos sabem, e podem denunciar. É um processo longo e difícil, que precisa da colaboração de todos, da sensibilização e da formação de uma rede que responda à necessidade. Queremos dar uma proteção efetiva a essas mulheres”, diz.

Sintonia entre instituições

A juíza Vaneska de Araújo Leite enfatizou que a violência doméstica e familiar, infelizmente, está profundamente presente em nossa sociedade. “Por muitos anos ela foi silenciada, naturalizada e até tolerada. Seu enfrentamento constitui um desafio, pois é um fenômeno complexo que tem muitas causas, como o machismo e a desigualdade entre homens e mulheres, com raízes históricas e culturais. Mas todos são chamados a se engajar na luta contra essa situação”, pontuou.

De acordo com a magistrada, a Lei Maria da Penha é uma ferramenta importante nessa batalha, pois se trata de norma considerada uma das melhores do mundo em três frentes de atuação: a prevenção, a proteção à mulher e a responsabilização do agressor. A Lei 11.340/2006, além disso, propõe atuação articulada e intersetorial, com sintonia entre atores de vários segmentos.

“Em nossa cidade, atuam diversas instituições, como as polícias civil e militar, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a OAB/MG e o município, por meio de vários órgãos, seja de saúde, de assistência social ou outro. Isso tudo é conjugado com a sociedade civil e a igreja, um instituto muito importante em Santa Maria do Suaçuí. Essa é a rede de atendimento, porém aqui ainda existe uma escassez de serviços especializados e de estrutura. Mas é preciso trabalhar com o que temos, para garantir a essas mulheres o acesso às medidas de proteção”, frisa.

A juíza Vaneska de Araújo Leite explicou que, além de seguir as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o TJMG conta com a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Comsiv) para assessorar os magistrados no combate à perpetuação das agressões e da discriminação contra mulheres ou pessoas com identidade de gênero feminino. Um dos focos da área é a criação, em cada comarca, de uma boa integração e comunicação com os demais poderes e entidades.   

“A Comsiv, criada em setembro de 2011, tem uma ação educativa, formativa, orientadora e de implementação das políticas públicas nacionais para o tema. O fortalecimento da rede de atendimento com a participação de todos os municípios da comarca é uma preocupação do Judiciário. Pretendemos realizar reuniões constantes para que cada um assuma sua responsabilidade. A união torna mais efetiva a resolução de problemas”, argumenta.

O volume de casos de estupros contra vulneráveis chocou a juíza Vaneska Leite quando de sua chegada à comarca. “A maior parte dos processos atinge meninas, de forma assustadora, mas acredito que ocorrências com meninos são subnotificadas. Realmente se trata de algo que afeta toda a região. Na maior parte das vezes é cometido por familiares ou amigos da família, dentro de casa. O pensamento machista impregnou-se na população: os homens se veem como donos das mulheres e dos filhos e entendem que podem fazer deles o que quiserem”, diz.

A magistrada declarou que, com a ajuda da comunidade local, pretende viabilizar grupos reflexivos em Santa Maria do Suaçuí, voltados para vítimas e agressores. “Apesar da pandemia, é algo urgente. Inicialmente, a participação será voluntária, mas podemos estabelecer a obrigatoriedade no caso dos autores de violência, pois a Lei Maria da Penha prevê o encaminhamento deles a programas de recuperação e reeducação como medida protetiva de urgência”, defende.

De acordo com a juíza, isso também vale para o atendimento psicossocial, individualizado ou em grupo, utilizando como metodologia a perspectiva de gênero. “Por esse instrumento podemos compreender os pilares de concepções que legitimam as agressões. Os grupos reflexivos têm sua eficácia comprovada na redução drástica da reincidência, um dos fatores característicos da violência doméstica e familiar.”

Outra proposta que a magistrada está empenhada em concretizar é o projeto Justiça vai à Escola, com palestras e atividades em escolas, para sensibilizar crianças e adolescentes para identificar, prevenir e rejeitar a violência contra mulheres.  

Programação

A programação incluiu ainda a sargento Alessandra Lelis de Medeiros Perazio, que tratou do trabalho preventivo da PMMG no combate à violência doméstica; a assistente social Maria de Lourdes Campos, que abordou o atendimento do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), e a conselheira tutelar Misleia Alves Araújo, com palestra sobre a resposta à identificação de abuso sexual contra menores.

Também estiveram presentes a prefeita Angelina do Perpétuo Socorro Pinheiro; o major Márcio Conrado de Oliveira, subcomandante do 65º BPM; a escrivã da Polícia Civil Beatriz Alves de Freitas, representando o delegado Douglas Mota Barbosa de Oliveira; e o presidente da Câmara Municipal de Santa Maria do Suaçuí, Nei Carlos Honorato Braga, entre outras autoridades.

Fonte: Assessoria de Comunicação Institucional - Ascom
Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG