A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que reconheceu competente o Juízo de Família e Sucessões para processar e julgar ação de apuração de haveres, visto que o resultado dessa apuração poderá servir de base para futura partilha de bens. O recurso era de uma empresa de transportes rodoviários contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Conforme destacou o relator, ministro Villas Bôas Cueva, a distribuição da apuração de haveres ao juízo pelo qual se processou o inventário não ofende nenhuma norma de direito federal. Pelo contrário, a interpretação conjugada da legislação processual que trata especificamente da matéria leva à conclusão de que o procedimento adotado pelas instâncias ordinárias encontra-se hígido e em conformidade com as disposições legais.

Depósito dos haveres

Inicialmente, o espólio do sócio majoritário ajuizou ação de apuração de haveres pedindo que a empresa pagasse os valores devidos aos sucessores, corrigido monetariamente, acrescido de juros de 12% ao ano, na forma prevista no artigo 3° da cláusula 11ª do contrato social.

Segundo os sucessores, embora a empresa efetuasse o depósito mensal dos haveres que supõe dever, eles acreditam que o balanço patrimonial feito no ano anterior à morte do sócio majoritário não revelou a real extensão do patrimônio. Outra questão suscitada foi o fato de o balanço não ter sido aprovado pelo falecido, que na época se encontrava hospitalizado.

Em primeira instância, a empresa foi condenada a pagar ao espólio o saldo devido dos haveres, corrigido monetariamente e acrescido de juros legais apenas a partir do mês subsequente, ou seja, março de 2009.

O TJSP negou a apelação da empresa por entender que os laudos apresentados pelas perícias de engenharia e de contabilidade estavam bem fundamentados.

Concluiu, ainda, que o juízo do inventário é o competente para a apuração de haveres, ao argumento de que “o resultado da apuração de haveres interessa à herança, posto que poderá servir de base para futura sobrepartilha”.

Recurso

Irresignada, a empresa de transportes rodoviários recorreu ao STJ sustentando a incompetência do Juízo de Família para julgar a ação de apuração ajuizada pelo espólio do sócio majoritário. Segundo ela, além de a decisão ir contra cláusula expressa do contrato social, os sucessores só ajuizaram a ação após o encerramento do inventário.

Já sobre o montante da condenação, alegou que o valor é exagerado em virtude de perícias bastante equivocadas. Ademais, o Tribunal de origem, diante das graves e evidentes falhas técnicas produzidas pela perícia, negou o direito de produção de prova técnica em segunda instância.

Incompetência

Sobre a incompetência do Juízo Familiar e Sucessões para processar e julgar a ação de apuração de haveres ajuizada pelos herdeiros, o ministro Villas Bôas Cueva salientou que a tese só foi levantada pela empresa no momento da apelação e que foi superada pelo TJSP.

O ministro relator destacou também que a empresa não se opôs à distribuição da ação no Juízo de Família. Caso ela tivesse se oposto, a matéria restaria preclusa, o que não aconteceu.

“Não há falar em incompetência (nem relativa, muito menos absoluta) do Juízo de Família e Sucessões para o processamento da ação de apuração de haveres, tendo em vista que tal procedimento foi instaurado pelos herdeiros do falecido, que, por sua vez, era sócio da empresa ora recorrente”, ressaltou.

Para Villas Bôas Cueva, ficou claro que a apuração de haveres não se tratou de um mero incidente no processo de inventário. Foi proposta uma ação, que tramitou pelo rito próprio; foi realizada prova pericial; houve sentença desfavorável à empresa e a sentença foi mantida pelo Tribunal estadual no julgamento da apelação.

Perícias técnicas

Quanto ao fato de o TJSP não ter permitido a produção de provas técnicas em segunda instância, o ministro ressaltou que as perícias técnicas (contábil e de engenharia) realizadas em primeira instância foram acolhidas tanto pela sentença quanto pelo tribunal local, que afastaram a existência de qualquer irregularidade ou ilegalidade nos referidos trabalhos.

“A insatisfação da recorrente no que tange ao resultado do conjunto probatório-pericial que lhe é desfavorável não se confunde com violação dos citados dispositivos legais nem implica cerceamento de sua defesa”, afirmou.

Ao contrário do alegado, o relator frisou que não há direito de produção de prova técnica em segunda instância. Cabe ao órgão judicante, destinatário das provas, acolher ou refutar o conjunto probatório delineado pelas partes e produzido pelos auxiliares da Justiça (perito), em decisão necessariamente motivada, como fez o TJSP.
Fonte: STJ