Em um momento em que milhares de pessoas tomaram as ruas para manifestar indignação, e reivindicar reforma das instituições e a realização de direitos, é imprescindível e oportuno identificar e situar o debate acerca do sistema de justiça nesta conjuntura.
A agenda política de justiça tem aparecido no atual contexto de grandes mobilizações, mas não necessariamente por estar aberta às demandas que vêm das ruas. Historicamente o sistema de justiça exerce diversas funções políticas, dentre elas as de i) controle social, através da criminalização da luta por direitos; ii) de bloqueio, mas também de alguns avanços nas políticas de direitos humanos; e iii) legitimação do sistema político.
Nesse sentido, é fundamental ter em vista que o Poder Judiciário compõe, resguardadas a sua autonomia e independência, o quadro das instituições do sistema político brasileiro, e não pode ficar à distância, deslocado ou resguardado das transformações que o Brasil demanda. Não se pode discutir reforma do sistema político, nem reivindicar mudanças estruturais em nossa sociedade, sem retomar o debate acerca da reforma do sistema de justiça, agora fundada sobre as bases de uma cultura de direitos humanos.
A justiça brasileira precisa dialogar com o povo, precisa se sensibilizar com o momento de demandas de direitos colocadas nas ruas, precisa incorporar mecanismos de participação social e de transparência, e se comprometer com o combate às violações de direitos humanos.
Desse modo, a Articulação Justiça e Direitos Humanos – JusDh vem atuando junto ao sistema de justiça, ao legislativo e executivo, para a incorporação de mecanismos voltados para a sua democratização, como a implementação de ouvidorias externas e de orçamentos participativos, a abertura institucional a mais audiências públicas e fóruns com a participação da sociedade civil sobre temáticas de direitos humanos, além da transparência como diretriz de gestão.
Avalia-se que tais transformações democráticas na justiça estão ao alcance das organizações e movimentos sociais, e são de responsabilidade imediata de todas as instituições que compõem o sistema de justiça, sejam do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensorias ou Advocacia. Neste sentido, identificamos no incipiente debate acerca da reforma da Lei Orgânica da Magistratura Nacional – Loman, elaborada pela ditadura civil-militar, uma oportunidade para a discussão, implementação e difusão destes mecanismos e de uma cultura democrática voltada ao compromisso com a efetivação dos direitos humanos em nosso país.
É tempo de repensarmos o modelo de ingresso e a captura oligárquica nas carreiras jurídicas, de discutirmos os desafios de como incorporar a pluralidade de nossa sociedade no universo jurídico, de rompermos com a elitização desse espaço. É momento, portanto, de reforma política da justiça e de construirmos um sistema de justiça que esteja a serviço e compromissado com a efetivação dos direitos humanos no Brasil.
Antônio Sérgio Escrivão Filho é coordenador da organização Terra de Direitos e integrante da JusDh.
Érika Lula de Medeiros é secretária executiva da JusDh - Articulação Justiça e Direitos Humanos.
Revista Consultor Jurídico, 19 de julho de 2013