O ministro Carlos Ayres Britto, do STF (Supremo Tribunal Federal), concedeu liminar e suspendeu a resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que obriga os magistrados brasileiros a explicarem os motivos para a suspeição de foro íntimo —quando um juiz se declara impedido de julgar determinado caso.
A Resolução 82 do CNJ, aprovada em junho do ano passado, regula as declarações de suspeição e torna necessário que magistrados justifiquem os motivos do pedido de afastamento de um caso às corregedorias dos tribunais. O novo dispositivo foi criado após constatação de que existe um elevado número de declarações de suspeição.

A decisão, que ainda deverá ser analisada no mérito, foi dada no mandado de segurança ajuizado por três entidades que representam nacionalmente a magistratura. Na ação, ajuizada em setembro de 2009, a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), a Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho) e a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) pedem, em liminar, a suspensão da resolução e, no mérito, sua anulação, alegando que ela “viola direitos líquidos e certos dos magistrados”.

Essa foi a segunda vez que as três associações recorreram ao Supremo contra a norma. Em junho de 2009, elas ajuizaram uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade) alegando que a resolução violava as garantias da imparcialidade e da independência do juiz, além de desrespeitar o direito à privacidade e a intimidade do magistrado.

A Adin não teve o pedido liminar julgado e será levada diretamente para julgamento no plenário da Corte.

Uma outra liminar concedida individualmente para um desembargador do Distrito Federal pelo ministro Joaquim Barbosa sugere ser possível que a Corte anule a resolução. Em agosto, Barbosa garantiu que o magistrado não justifique a suspeição por considerar que o dispositivo do CNJ poderia eliminar a independência do julgador.

Alegações

Os magistrados sustentaram que o ato é inconstitucional, já que a matéria nele tratada não se encontra dentre as competências constitucionais do CNJ. Segundo eles, trata-se ou de matéria de competência privativa da União para legislar sobre direito processual por meio de lei ordinária, ou de matéria a ser disposta no Estatuto da Magistratura, por meio de lei complementar da iniciativa do Supremo.

Alegam, também, que a resolução ofende várias das garantias constitucionais dos juízes, “uma vez que impõe aos magistrados de primeira e segunda instâncias espécie de ‘confessionário’ dos motivos de foro íntimo que os levam, eventualmente, a declarar suspeição para julgar determinados feitos”.

Ao alegar violação do direito à intimidade, prevista na Constituição Federal, e do princípio da isonomia, os juízes afirmam que “não se pode exigir a explicação do motivo íntimo da declaração de suspeição apenas de parte dos magistrados”. Isto porque “ou a exigência vale para todos, ou é nula”.

Ainda segundo eles, a resolução viola, também, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, porque, se for válida para os magistrados de primeiro e segundo graus, será inválida por não alcançar os demais magistrados (dos tribunais superiores e até do STF).

O artigo 135 do Código de Processo Civil reserva ao juiz a possibilidade de declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, dispensando-o de explicar os motivos.

O CNJ, ao editar a regra, pretendeu impedir que o mesmo processo seja rejeitado sem análise por vários juízes, sempre sob declaração de suspeição. Segundo o órgão responsável por formular as diretrizes do Judiciário, “a declaração de suspeição revelou-se um mecanismo utilizado por alguns magistrados para evitar o aumento dos processos a eles distribuídos, ou mesmo direcionar a distribuição, ferindo o princípio do juiz natural”.

Fonte: site Última Instância