O Projeto de Lei Complementar do Senado 366/13, que dispõe sobre a incidência e o intervalo das alíquotas do Imposto sobre Serviços, pode ser questionado constitucionalmente e ferir o direito adquirido por empresas que já formalizaram acordos com administrações municipais para obter isenção fiscal. As opiniões são dos advogados Hugo Funaro, do Dias de Souza Advogados, Leonardo Sant'Anna, do Marcelo Tostes Advogados, e Giselda Lima, do Chiarottino e Nicoletti Advogados.

O PLC, que dispõe o intervalo de incidência do imposto entre 2% e 5%, terminou de ser analisado pela Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (16/9) com a análise dos destaques. O texto-base havia sido aprovado na quinta-feira (10/9), por 293 votos favoráveis a 64 contrários. Na Casa Legislativa, o relator da medida foi o parlamentar Walter Ihoshi (DEM-SP).

Para Giselda Lima, a possibilidade de questionamento existe devido à autonomia que foi concedida aos municípios por meio do princípio federativo, que é protegido pela Constituição Federal. "O artigo 60, parágrafo 4º, traz limitações ao poder de reforma, determinando expressamente que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado e a separação dos Poderes", detalha.

Hugo Funaro embasa seu argumento na fórmula que foi criada por meio do PLC, pois, segundo ele, a constituição garante a concessão dessas isenções e benefícios. O advogado ressalta que a lei complementar deve apenas disciplinar a forma como os incentivos ocorrerão. "Ele [o PLC] teria de viabilizar, e não vedar a concessão", diz.

Já sobre o direito adquirido, Leonardo Sant'Anna explica que a concessão de isenções fiscais compõem políticas públicas e sua limitação pode prejudicar acordos formalizados entre empresas e municípios. De todo modo, ele ressalva que "ainda sim é discutível, mas quem dá a palavra final é o Judiciário". Apesar disso, o advogado opina que o PLC "é um passo importante", pois apara algumas arestas tributárias existentes.

Em resposta a questionamentos da ConJur, a equipe do parlamentar afirma que não vê inconstitucionalidade no PLC e que há isenções que não são consideradas inconstitucionais. Segundo Fábio Araújo, assessor do deputado Ihoshi, o Supremo pode até considerar que a margem proposta é estreita demais, mas a ideia é limitar a guerra fiscal, concedendo espaço para os municípios se adequarem.

Alterações no ISS
Uma das mudanças previstas no projeto é a incidência do ISS sobre serviços que tratam de aplicação de tatuagens, piercings e congêneres; vigilância e monitoramento de bens móveis; e disponibilização de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto em páginas eletrônicas. Não foram inseridos no projeto jornais, livros e outros periódicos.

O PLC também delimita a cobrança do ISS no local do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou onde estiver domiciliado quando houver descumprimento da alíquota mínima de 2% determinada no PLC. A iniciativa também propõe aumentar a cota dos impostos, como ICMS e IPVA, que são repassados aos municípios.

Outra mudança normatiza que, na hipótese de uma pessoa jurídica promover saídas de mercadorias por estabelecimento diferente daquele em que as transações comerciais foram feitas, o valor será repassado ao município onde ocorreu a transação comercial. Porém, para que isso ocorra, os estabelecimentos devem estar situados no mesmo estado. As transações comerciais não presenciais estão excluídas dessa norma.

Além disso, o município poderá entrar com ação de improbidade administrativa na Justiça para questionar o agente público que conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário relativo ao ISS. A penalidade resultante de suposta condenação será perda da função pública, suspensão dos direitos políticos entre cinco a oito anos e multa de até três vezes o valor do benefício concedido.

Exceções
Apesar de limitar a concessão de isenções, inclusive redução da base de cálculo ou crédito presumido, considerando nula qualquer lei ou ato que infrinja essa regra, o PLC permite a concessão de benefícios a fonogramas e videogramas musicais produzidos no Brasil, ao setor de construção civil (hidráulica, elétrica, serviços de perfuração de poços, escavação, drenagem, irrigação, terraplanagem e pavimentação) e ao transporte municipal coletivo rodoviário, ferroviário, metroviário e aquaviário.

Planos de saúde, cartões de crédito e leasing
No projeto também foi definida que a arrecadação de ISS referente a planos de saúde, cartões de crédito e leasing deverá ocorrer no município em que houve o serviço. Atualmente, o imposto colhido fica na cidade-sede. Para os deputados favoráveis à mudança, a renda, que ficava concentrada em poucas cidades, será melhor distribuída.

Para o deputado Walter Ihoshi, a Câmara dos Deputados errou com a alteração, e o resultado disso será sonegação fiscal. “Na prática, vamos ver que será muito difícil fazermos a arrecadação desses serviços, que será muito pequena. O tempo irá dizer, mas os deputados vão entender que essa Casa errou.”

Pontos rejeitados
O PLC teve dois destaques rejeitados. Um deles, que permitia a incidência do ISS sobre a locação de espaço em cemitério, foi recusado pelo Plenário, por 372 votos a 4. O outro, que buscava retirar do texto a multa de três vezes o valor de benefício referente ao ISS concedido irregularmente, foi excluído por 399 votos a 7.

Na Câmara, o projeto tramitou pelas comissões de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Agora, o PLC, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), retorna para o Senado e depois segue para sanção da presidente Dilma Rousseff.

Os entes federativos terão um ano, a partir da publicação da futura lei, para revogar os dispositivos que concedem as isenções.

Fonte: Conjur