BRASÍLIA - O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está em pé de guerra. De um lado, conselheiros preocupados em defender os interesses de suas categorias e fazendo do órgão um trampolim para suas carreiras. Do outro, um grupo comprometido com a moralização dos tribunais luta contra o lobby dos colegas. Ao assumir a presidência do conselho, o ministro Ricardo Lewandowski, também presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), encontrou o caos. O desafio é tomar as rédeas de um colegiado que não foi tratado como prioridade nas últimas gestões.
Uma das preocupações de conselheiros interessados em garantir seu quinhão é acabar com a quarentena para eles próprios. Ou seja, ao término do mandato de dois anos no CNJ, estariam livres para serem indicados a outros cargos públicos imediatamente. Há conselheiros interessados em vagas no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e em outros tribunais superiores.
A luta para dar destaque ao currículo pessoal é grande. Havia o costume de o site do CNJ divulgar medalhas e homenagens que os conselheiros recebiam, além de palestras proferidas em congressos jurídicos. Lewandowski proibiu a prática, o que gerou reclamação de conselheiros.
Outra decisão que causou indignação foi tomada em agosto, quando o ministro limitou os gastos com viagens de conselheiros, juízes e servidores por meio de uma instrução normativa. Segundo dados do CNJ, em 2013 os gastos com diárias e passagens somaram pouco mais de R$ 3 milhões em diárias e passagens. Só nos seis primeiros meses deste ano, foi gasto quase R$ 1,6 milhão.
Boa parte das viagens ocorre para colher depoimentos em processos para investigar juízes suspeitos de desvio de conduta. Pela nova regra, quando for possível, serão realizadas videoconferências. É também possível delegar a coleta de informações a juízes de outros estados.
Caso o deslocamento seja fundamental, a solicitação formal da viagem deve ser feita com 30 dias de antecedência para que seja submetida à votação no plenário do CNJ. A Corregedoria Nacional de Justiça, responsável por inspeções em tribunais estaduais, não precisa seguir a regra. A norma também diz que eventos do CNJ devem ser realizados, de preferência, em Brasília.
Entre os conselheiros, há a expectativa de que a gestão Lewandowski dê mais celeridade ao Judiciário, uma das metas do presidente. Ele quer priorizar programas de mediação, para evitar o excesso de ações que tramitam na Justiça.
— Com o ministro Lewandowski na presidência, vamos ter uma maior eficiência, maior celeridade quanto à atuação da magistratura — disse o conselheiro Guilherme Calmon.
Conselheiros querem ver sistema funcionando logo, mas OAB cobra ajustes
Além de cuidar de questões de ordem prática do Judiciário e da briga de egos no CNJ, o presidente do conselho e do STF, ministro Ricardo Lewandowski, vai enfrentar as disputas por conta do Processo Judicial Eletrônico (PJe) — um sistema criado para unificar o andamento de processos em todos os tribunais. Em breve, os advogados não poderão mais entrar com ações em papel na Justiça. No entanto, o acesso à internet de boa qualidade não é unanimidade no Brasil. E nem todos os tribunais conseguiram recursos para implantar o sistema.
Todas essas questões estão sendo ignoradas por um grupo de conselheiros, que quer colocar o sistema em funcionamento exclusivo logo. Lewandowski puxa as rédeas e já recebeu críticas por isso. O ministro quer fazer uma audiência pública para investigar a real viabilidade da medida ainda neste ano.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) reclama que o CNJ não corrigiu os problemas apontados por ela. Um deles é a impossibilidade de uso da ferramenta por parte de advogados, juízes e membros do Ministério Público com deficiência visual. Outra questão é a falta de comunicação do PJe com outros sistemas já em uso no Judiciário. A OAB também relata problemas técnicos de segurança e de infraestrutura.
— A OAB quer evitar que se exija a implantação do sistema sem que se corrijam os problemas apontados. Pedimos para corrigir um monte de problemas. Eles dizem que corrigem, mas não há um documento provando isso — reclama Luis Cláudio Allemand, integrante da ordem responsável por acompanhar a instalação do sistema. — O grande problema não é o sistema, mas é a gestão. Os gestores do CNJ não conseguiram dialogar com os advogados. Nós somos usuários do sistema. Por que não querem ouvir a advocacia? Por que não querem corrigir esse problema?
Allemand esclarece que a OAB é favorável ao PJe, mas não da forma como está sendo implantado. Segundo ele, era preciso haver uma fase de transição entre o processo eletrônico e o de papel, para que os usuários se adaptassem. Procurado pelo GLOBO, o CNJ não deu informações sobre a situação atual do PJe
Fonte: O Globo - 07/09/14
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