O início da sessão desta quarta-feira (9/9), no Supremo Tribunal Federal, era para ser dedicado à ausência do ministro Menezes Direito, que morreu na semana passada. Mas o ministro Marco Aurélio fez questão de pedir a palavra para “registrar nos anais do Supremo” que o Conselho Nacional de Justiça está se transformando em um “super órgão”. Segundo Marco Aurélio, o CNJ está se colocando acima da Constituição. “Reafirmo que o CNJ está surgindo como um super órgão. Um órgão que estaria numa concepção acima da própria Constituição e do Supremo”, disse. E completou: “Essa corte jamais se submeterá a diabruras deste ou daquele órgão”.
Marco Aurélio criticou especificamente a Meta 2 do CNJ, que estabelece que a Justiça deve julgar até o fim deste ano todos os processos distribuídos até 2005. O objetivo da meta é que o jurisdicionado tenha uma decisão sobre seu caso, ainda que não definitiva, pelo menos quatro anos depois de ter batido às portas da Justiça. Para se ter uma ideia da morosidade, em São Paulo, onde a resistência de juízes em cumprir a meta é maior, um simples recurso na segunda instância fica na fila de espera de julgamento cerca de cinco anos. Depois de chegar às mãos de um desembargador, leva cerca de dois anos para ser analisado.
“Nós vivenciamos um quadro de perda de parâmetros. Parece vingar, em verdadeiro atropelo, um pragmatismo. Deparei-me com algo inimaginável, ao cogitar-se meta de julgamento, como se fosse algo tarifado”. Marco Aurélio disse que se sentiu num misto de “tristeza, indignação e inconformismo” com a Meta 2.
Em resposta, o presidente do STF, Gilmar Mendes, disse que a meta foi estabelecida pelos próprios tribunais. “Não se trata de uma meta fixada a partir de critérios fora de qualquer parâmetro, mas apenas um esforço de responder à morosidade do Judiciário. Isso tem contado com grande apoio. O próprio Supremo decidiu adotar esta meta, em sessão administrativa. O CNJ não impôs ao Supremo. Foi o Supremo que adotou esta meta. Não há nenhuma violação”, disse o presidente do STF.
Mais uma vez, o ministro Marco Aurélio disse que não foi discutido a Meta 2 em sessão administrativa. “Desconheço que isso foi colocado em sessão administrativa. Foi colocada uma política institucional do CNJ. Não concebo que o Supremo seja colocado no site do CNJ, como se o Supremo fosse submetido a esse órgão. Nós não prestamos contas ao CNJ”, afirmou.
Em tom conciliador, o ministro Carlos Ayres Britto disse que a publicação dos números do STF no site do CNJ não significa submissão. “Apenas entendo que o STF no site do CNJ é porque o Supremo compõe a Justiça. Não acho que significa que estamos submetidos”, disse Britto.
Por fim, Gilmar Mendes disse que vai analisar o que foi dito por Marco Aurélio.
Divergências na magistratura
Os juízes federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul também reclamaram, esta semana, da Meta 2. Para eles, essa meta vai atrapalhar em vez de ajudar a baixar a pilha de processos que aguardam julgamento nas varas espalhadas pelo Brasil. Enquanto isso, alguns tribunais do país suspenderam férias e folgas de juízes para tentar cumprir a meta.
Em nota pública, a Ajufesp afirmou que as varas federais têm realidades e acervos distintos, algumas com quadro funcional reduzido e maior número de demandas antigas, como as varas que julgam processos previdenciários ou os Juizados Especiais Federais, onde existem situações específicas, como a necessidade de obter documentos antigos para o julgamento de demandas relativas à seguridade social. Por isso, pediram que o fornecimento de estrutura adequada de material e de pessoal seja simultâneo à fixação de qualquer meta, para que ela não se torne inatingível. (Clique aqui para ler a nota)
Recentemente, a Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) divulgou também carta pública com críticas à resolução do Tribunal de Justiça do estado editada para cumprir a Meta 2 do CNJ. Para os juízes da entidade, a resolução implicará na paralisia das varas durante os últimos quatro meses de 2009. "A consequência disto será nova acumulação de trabalho a ser enfrentada no futuro, à custa de novos sacrifícios dos juízes de primeiro grau, de indiscutíveis prejuízos ao serviço judiciário e, principalmente, ao povo, destinatário da nossa atividade", registraram
Os Tribunais de Justiça do Rio Grande do Norte, de Pernambuco, de Alagoas e de Mato Grosso, por exemplo, estão em direção oposta. Os três primeiros suspenderam férias de juízes até dezembro deste ano para tentar cumprir o objetivo de julgar, ainda em 2009, os processos ajuizados até 2005. O TJ de Mato Grosso suspendeu folgas de juízes.
Fonte: Conjur
Amagis
Em agosto, a Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis) divulgou nota pública reagindo à portaria conjunta do TJMG e Corregedoria de Justiça de Minas Gerais, originada por recomendação do CNJ, que dispõe sobre programa de trabalho dos juízes de direito, para julgamento dos processos distribuídos até 31 de dezembro de 2005. (clique aqui para ler a nota).
O presidente da Amagis, juiz Nelson Missias de Morais, alertou que a prolação de sentença não é um ato simples. “Ela exige do magistrado, além de conhecimento jurídico, boa higidez de saúde, serenidade e equilíbrio. Não é como se fabrica um pastel, em que o cliente chega, pede quantos pastéis ele quer e, com o óleo já quente, joga-se o produto na panela e minutos após ele está pronto”, disse.
A Amagis realizou reuniões com o presidente do TJMG, desembargador Sérgio Resende, e com o corregedor-geral de Justiça do Estado, desembargador Célio Paduani, para discutir sobre a Meta 2. Na última semana, foi realizada uma nova reunião, proposta pelo presidente da Amagis, entre o presidente do TJMG e a Comissão dos Juízes Representantes das Varas Especializadas. Depois de ouvir os magistrados, o presidente do Tribunal decidiu que a portaria será retificada de forma que a mesma se torne facultativa e que o número de sentenças prolatadas seja revisado, tornando a execução dos prazos mais condizentes com as condições de trabalho dos magistrados.
O juiz Nelson Missias reuniu-se com o desembargador Sérgio Resende depois do encontro com os juízes para reiterar o pedido de revogação da portaria conjunta. Ele foi informado que o Tribunal vai baixar outra norma, sem a revogação da portaria. “O presidente deixou muito claro que não se trata de norma cogente, que nenhum juiz trabalhará além de sua capacidade, e que os colegas poderão contribuir uns com os outros. Além disso, foi feito um recálculo da demanda, e ela corresponde a ¼ do que havia sido dito anteriormente”, explicou.
“Gostaria de tranquilizar a magistratura, pois o diálogo tem sido muito eficaz. O presidente do TJMG tem sido muito receptivo e a Amagis tem cumprido seu papel e está absolutamente integrada nesse trabalho para uma solução que possa atender a todos os magistrados”, disse Nelson Missias.