O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, ressaltou a importância do atual debate sobre a criação de uma Corte de Justiça no Mercosul nos moldes da Corte Européia de Justiça, que seria responsável pela aplicação de um catálogo internacional de direitos humanos.

Em discurso proferido na última sexta-feira em Granada, na Espanha, ele destacou os resultados obtidos nos Encontros de Cortes Supremas do Mercosul, quando são travadas “profundas discussões sobre temas de grande importância para o desenvolvimento da Jurisdição Constitucional na Iberoamérica, as quais certamente continuarão quando da realização do próximo encontro, em setembro deste ano, em Buenos Aires, para o enriquecimento de todos os participantes deste evento”.

Tratados internacionais

Mendes disse que vários países latino-americanos avançaram na participação supranacional e reservaram aos tratados internacionais de direitos humanos lugar especial no ordenamento jurídico, algumas vezes concedendo-lhes valor normativo constitucional.

Ele lembrou que no Brasil os tratados internacionais sobre direitos humanos, caso aprovados pelo Congresso seguindo os mesmos pré-requisitos das emendas constitucionais, passam a fazer parte da Lei Maior.
O ministro contou que a Constituição brasileira de 1988 enfatiza a maior abertura constitucional ao direito internacional já no início do texto. “O parágrafo único do art. 4º, estabelece que a República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações”, exemplificou.
Ele disse, ainda, que articular as relações entre os tribunais constitucionais e o Mercosul é uma conditio sine qua non para o discurso constitucional contemporâneo. “Nesse sentido, a proteção dos direitos fundamentais no âmbito do Mercosul pressupõe, invariavelmente, que as instituições deste sejam dotadas de poder de decisão de modo a atuarem como garantidoras de direitos fundamentais no bloco. Para alcançar tal feito, tribunais constitucionais necessitam evoluir para uma posição que fortaleça essas instituições por meio da consagração do efeito direto”, ressaltou.

Solução de controvérsias

No Mercosul a criação de um sistema renovado de solução de controvérsias, conhecido como o Protocolo de Olivos, de 2002, trouxe esperanças quanto a um desenvolvimento institucional mais intenso. O Protocolo de Olivos tem um mecanismo de solução de controvérsias que, em primeira instância, possui uma estrutura bastante semelhante a um mecanismo arbitral e, em segunda instância, tem-se como órgão permanente o Tribunal Arbitral Permanente de Revisão.

Para Mendes, o caráter de permanência, previsto no Tribunal Arbitral Permanente de Revisão “é uma conquista significativa rumo a uma maior institucionalização do Mercosul, que pode contar com estrutura própria e membros (juízes) com período certo para deixarem seus cargos”.

O Protocolo de Olivos, na visão dele, abre uma grande possibilidade para que tribunais internos, especialmente os de maior hierarquia nos membros do bloco, possam interagir diretamente com o Tribunal Permanente de Revisão, tendo uma atuação direta no processo de construção do Mercosul. Em 2007, o Conselho do Mercosul estabeleceu que os tribunais superiores de justiça dos Estados membros podem solicitar opiniões consultivas ao Tribunal Arbitral. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal foi escolhido como a corte apta para solicitar os pareceres.

“A possibilidade de solicitação de opiniões consultivas permite que o direito do Mercosul tenha uma aplicação mais uniforme em cada Estado membro”, argumentou o ministro. Em específico, para os direitos fundamentais, a possibilidade de solicitação de opiniões consultivas poderá permitir que tribunais como o Supremo Tribunal Federal demandem esclarecimentos mais sofisticados sobre a interpretação de direitos fundamentais.
Na prática, com as respostas às consultas será possível visualizar o surgimento de uma doutrina própria da proteção dos direitos fundamentais no Mercosul, assim como aconteceu na Europa.


Fonte: STF