O segundo dia do Congresso da Magistratura Mineira 2024 terminou com a Conferência Magna do ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que refletiu sobre os 40 anos da Lei de Execução Penal (LEP) e os desafios do sistema penitenciário brasileiro. Ao apresentar o palestrante, a vice-presidente Administrativa da Amagis e da AMB, juíza Rosimere das Graças do Couto, afirmou que a aplicação eficaz da Lei de Execução Penal no Brasil enfrenta desafios significativos devido a questões como superlotação carcerária, infraestrutura insuficiente, violência e limitações nas atividades de ressocialização. “Esses problemas afetam não apenas os apenados, mas também a sociedade como um todo. A busca por soluções e reformas no sistema carcerário é essencial para garantir que a execução penal cumpra seu papel e garanta a redução da reincidência”, disse a magistrada.

Durante sua fala, o ministro apresentou dados sobre a atual situação do sistema carcerário brasileiro, detalhando números entre os detentos e detentas em celas físicas, em prisão domiciliar, tipos de regime, além de destacar o déficit de vagas por regime. "O que deve nortear todas as ações é a dignidade", afirmou Sebastião Reis Júnior. "Independentemente da circunstância, todos têm o direito de serem tratados de forma digna e de terem seus direitos respeitados", completou. Ele ressaltou que isso não significa impunidade. "Ninguém está dizendo que quem cometeu um crime não deva ser punido ou arcar com as consequências de seus atos. No entanto, há limites, imposições e direitos que precisam ser respeitados. É isso que buscamos", concluiu o ministro.


Ao finalizar, Sebastião Reis Júnior apresentou algumas provocações sobre o porquê da resistência em tratar com o mínimo de humanidade e dignidade os detentos e defendeu que as pessoas encarceradas devem pagar por seus erros, mas não para melhorar para nós, que estamos fora do encarceramento, e sim para que se recuperem e não voltem a cometer novos erros. O ministro deixou ainda uma importante reflexão sobre o papel do Estado na garantia de direitos humanos no sistema prisional.

Após a conferência, o ministro Sebastião Reis Júnior foi presenteado pelo desembargador do TJMG Henrique Abi-Ackel Torres, conselheiro da Emajs, com um exemplar do seu novo livro, "O Manual de Política Criminal", publicado pela Editora D’Plácido.

Cartilha "Desvendando o Autismo"

À tarde, a programação do Congresso da Magistratura Mineira 2024 começou com homenagens. Em nome da Coordenadoria de Política de Proteção e Apoio à Pessoa com Deficiência, o juiz Christyano Lucas Generoso recebeu das mãos do desembargador Antônio Armando dos Anjos, presidente do Conselho Deliberativo da Associação, uma placa da Amagis em reconhecimento ao inestimável trabalho desenvolvido pela coordenadoria e, em especial, na criação da cartilha "Desvendando o Autismo", ferramenta essencial na promoção da igualdade de oportunidades e no fortalecimento dos laços de empatia e solidariedade. Além do juiz Christyano Lucas Generoso, compõem a Coordenadoria a juíza Raquel Agreli Melo (coordenadora) e o juiz Marcos Bartolomeu de Oliveira. Acesse aqui a cartilha. 


Mudanças climáticas

Após a homenagem, as discussões se concentraram nas mudanças climáticas. Tiago Zanella, professor colaborador da Escola de Guerra Naval (EGN), destacou o papel do Direito do Mar na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Na mesma mesa, presidida pela defensora pública-geral do Estado, Raquel Costa Dias, o promotor de Justiça do MPMG Leonardo Castro Maia abordou os conflitos socioambientais relacionados à água; e o juiz federal Ilan Presser discutiu as consequências da litigância climática nas cortes constitucionais.


Em sua apresentação, o professor Tiago Zanella levantou uma série de questões que buscam a reflexão sobre as consequências da poluição ambiental. Falou sobre os problemas de queimadas no País inteiro, que têm prejudicado muito a qualidade do ar, especialmente no Sudeste do Brasil. “A poluição atmosférica tem alterado o ambiente marinho, e as consequências disso serão desastrosas para o clima do mundo inteiro”, alertou o professor explicando que os climas dos mares e oceanos afetam todo o continente. Ainda de acordo com Tiago Zanella, que é diretor do Instituto Brasileiro de Direito do Mar, timo vem para regulamentar e coibir a poluição marinha. “A lógica do Direito Marítimo é uma lógica preventiva”, afirmou.

Estatuto jurídico

Mestre em Direito e professor de Direitos Humanos e Direito Ambiental, Illan Presser falou sobre litigância climática em cortes constitucionais e suas consequências. Citando o escritor Pablo Neruda, o palestrante afirmou que as pessoas são livres para fazer suas escolhas e prisioneiras das escolhas que fazem. “Ações que tomamos hoje serão aquelas que trarão as consequências do amanhã”, disse Illan Presser destacando que o Direito Ambiental não é uma ideologia, mas um estatuto jurídico da causa ecológica constitucionalmente prevista. “Se não tomarmos medidas para conter a emergência climática que estamos a viver agora, talvez as gerações futuras não poderão desfrutar do planeta”, alertou.


Água e conflitos socioambientais

O promotor de Justiça Leonardo Castro Maia discorreu sobre a água e os conflitos socioambientais, tema do livro de mesmo nome que rendeu a ele o Prêmio Jabuti Acadêmico, na categoria Geografia e Geociências, entregue em agosto deste ano, em São Paulo. Em sua apresentação, o especialista em Direito Ambiental e Urbanístico destacou que a água é um bem absolutamente essencial para todas as atividades, sobretudo para a vida, e ressaltou que, no contexto das mudanças climáticas, ela é o recurso natural mais impactado. Leonardo Castro falou ainda sobre a relação entre água, saneamento e saúde pública, o impacto da poluição difusa em períodos de cheias e a gestão inadequada dos recursos hídricos. Leonardo Maia também apresentou princípios típicos dos sistemas hídricos e parabenizou o TJMG pelo seu pioneirismo ao relembrar decisão do Tribunal, com relatoria do desembargador Carlos Roberto Faria, sobre a necessidade de repasse dos valores de cobrança dos recursos hídricos aos comitês de bacia hidrográfica.


Revista Amagis Jurídica

Importante publicação científica da Associação, a revista Amagis Jurídica, que passou a ser editada no âmbito da Escola Superior da Magistratura Desembargadora Jane Silva (Emajs), teve destaque durante a programação do evento. Como forma de reconhecer o trabalho que contribui com a produção acadêmica, o juiz Richardson Xavier Brant, editor da Amagis Jurídica, e o professor Waldir de Pinho foram agraciados com uma placa entregue pelo vice-presidente Sociocultural-Esportivo da Amagis e superintendente adjunto da Ejef, desembargador Maurício Pinto Ferreira. Acesse aqui a versão eletrônica de todas as edições de 2009 a 2024.

A Amagis Jurídica está recebendo trabalhos para publicação na próxima edição.


Reforma tributária

A reforma tributária também foi tema de destaque no evento. Natália Faria, procuradora do Estado do Rio de Janeiro, analisou os reflexos da reforma na cobrança da dívida ativa, enquanto Marciano Seabra de Godoi, Doutor e Mestre em Direito Tributário, falou sobre mudanças relativas ao imposto sobre herança e doações. O palestrante apresentou um gráfico mostrando a distribuição da riqueza no mundo e a trajetória recente do imposto sobre heranças no Brasil. Ainda em sua apresentação, Godoi discorreu sobre as normas da Emenda Constitucional 132 de 2023, que instituiu alterações significativas no sistema tributário nacional e a regra da anterioridade tributária e inércia dos estados.


Participou também da mesa o coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Economia (CPDE) da FGV Direito Rio, Antônio Maristrello Porto. O presidente da mesa foi o juiz Murilo Sílvio de Abreu.

Após a mesa temática, a Amagis homenageou o trabalho desenvolvido no Núcleo de Integração Social (Nutris) e no Núcleo de Arte e Cultura (NAC), instituições mantidas com o apoio da Magistratura mineira. A presidente do Nutris, juíza Marli Maria Braga, representando a pensionista Delenda de Faria, uma das fundadoras do Nutris, recebeu a placa entregue pela vice-presidente da Amagis, juíza Rosimere das Graças do Couto.


Literatura e Direito

O quinto painel do dia trouxe a literatura ao Congresso da Magistratura Mineira. A mesa temática “Literatura e Direito” contou com a participação da juíza e ouvidora do STF, Flávia Martins, que falou sobre o encontro do Direito com a Escrevivência de Conceição Evaristo; e do doutor em Letras, professor e escritor Donaldo Schüler, que abordou Camões e a crise europeia atual. O presidente da Academia Mineira de Letras, Jacyntho Lins Brandão, conduziu os trabalhos da mesa.

O professor Donaldo Schüler problematizou o conceito de crise, que do grego significa separação, posição crítica, afastamento.
Ele ponderou que o mundo com limites é grego, romano e norte-americano. Já o mundo sem limite, inventivo, é português, brasileiro e mineiro. Assim, na perspectiva de Camões, em uma referência a Minas Gerais, Schüler provocou: “Liberta-se de tudo que nos oprime”.


A juíza Flávia Martins de Carvalho mesclou o Direito e a escrevivência de Conceição Evaristo, reconhecida escritora mineira, em sua apresentação. As informações e reflexões expostas aos congressistas são tema da tese do doutorado que a magistrada cursa na Universidade de São Paulo (USP). Flávia de Carvalho percorreu inúmeras passagens de sua vida e os desafios impostos a ela, muitos deles fruto do racismo, e abordou a baixa representatividade das pessoas negras e das mulheres no Judiciário. "Todas as minhas escrevivências e jurisvivências são exemplo para as dificuldades que muitas meninas irão enfrentar em nosso País", afirmou.


De acordo com a magistrada, em uma sociedade racista e patriarcal, a competência do homem branco é presumida, mesmo diante de contraprovas, ao passo que a competência das mulheres, principalmente das mulheres negras, precisa ser provada a todo instante. "Espero que minhas escrevivências jurídicas possam tocar alguns corações e mentes para transformar o futuro de outras tantas pessoas pretas e pobres, sobretudo mulheres que nunca tiveram a oportunidade de pisar em uma universidade, mas que ainda sim produziram inúmeras tecnologias de sobrevivência que nos possibilitaram chegar até aqui”, disse.

Painel "150 anos do TJMG”

Após as apresentações da mesa temática, a Amagis homenageou o artista plástico Heleno Nunes com a entrega de uma placa em reconhecimento ao seu talento e à dedicação às artes, em especial ao brilhante trabalho demonstrado na execução do painel "150 anos do TJMG". A obra está sendo exposta no Congresso da Magistratura Mineira 2024.


A sociedade midiática e a provocação da pena justa

Na última mesa temática do segundo dia do Congresso, Álvaro Afonso Pena de Oliveira Pires falou sobre imparcialidade, sanções e os desafios contemporâneos do Poder Judiciário.