Ao determinar o arquivamento do Recurso Extraordinário (RE) 487393, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello manteve o direito do jornal "A Tribuna da Imprensa" de receber indenização da União Federal por danos sofridos por atos de censura praticados durante o regime militar. O ministro concluiu que não existe matéria constitucional em discussão que justifique a análise do recurso pela Corte Suprema, e ainda salientou seu ponto de vista, no sentido de que a censura estatal é intolerável.
Após perder na primeira instância e no Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, a União tentou recorrer ao Supremo para reverter a condenação. A fim de afastar sua obrigação de reparar os danos causados ao jornal pela censura, a União alegava não haver “nexo de causalidade a ensejar uma responsabilidade objetiva, o que invalida o conteúdo probatório da presente demanda”.
Celso de Mello explicou que a existência ou não de nexo de causalidade material não pode ser questionada por meio de Recurso Extraordinário, “por supor o exame de matéria de fato, de todo inadmissível na via do apelo extremo (Recurso Extraordinário)”.
Direito positivo
Sobre este aspecto, contudo, Celso de Mello teceu considerações sobre a teoria do risco administrativo. O ministro explicou que este conceito serviu como fundamento à norma de direito positivo que instituiu, em nosso sistema jurídico, “a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, por ação ou por omissão”. Essa concepção teórica fez surgir, conforme o decano do STF, o dever do Estado de indenizar suas vítimas por danos pessoais ou patrimoniais sofridos.
As circunstâncias do caso de A Tribuna da Imprensa, apoiados em provas abundantes nas instâncias ordinárias, acentuou o ministro, “evidenciam que se reconheceu presente, na espécie, o nexo de causalidade material”.
Censura intolerável
Mesmo não analisando o mérito da questão, Celso de Mello fez questão de salientar, como obter dictum (comentário incidental), seu entendimento no sentido de que a censura estatal é intolerável, e pode legitimar o dever governamental de reparar, no plano civil, danos morais ou materiais causados aqueles que a sofreram – como no caso da Tribuna da Imprensa.
“Tenho observado que se intensificou, em nosso sistema jurídico, o grau de proteção em torno da liberdade de informação e de manifestação do pensamento, disse o ministro. “Não se pode transigir em torno de direitos fundamentais”, ressaltou Celso de Mello, fazendo referência ao exercício concreto da liberdade de expressão por parte da imprensa.
Ao se referir às críticas do jornal Tribuna da Imprensa, que geraram a censura feita pelo governo militar, o ministro salientou que “em uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse público e decorra da prática legítima de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional”, concluiu Celso de Mello.
Com a decisão, o processo será arquivado e a indenização paga, caso não haja recurso da União.
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Fonte: STF