Depois de 25 anos dedicados à magistratura, o ministro Nilson Naves deixa o Superior Tribunal de Justiça (STJ), nesta terça-feira (20), para vivenciar novas experiências profissionais. Último representante da primeira composição do STJ, o ministro decano completa 70 anos no próximo dia 28 de abril.
Mineiro de Lavras, egresso do extinto Tribunal Federal de Recursos (TFR), Nilson Naves assumiu a Presidência do STJ (2002/2004) com um grande desafio em mente: a transformação do Tribunal em uma corte efetivamente infraconstitucional. “Não é crível que o Superior se transforme em um mero tribunal de passagem. É necessária a purificação do sistema judicial”, afirmou.
Para o ministro, as competências do STJ determinadas pela Constituição Federal devem ser revistas, de forma a delinear com nitidez as atribuições da cúpula do Judiciário brasileiro, como o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal. “A matéria infraconstitucional deve nascer, desenvolver-se e morrer no Superior”, afirmou.
Magistrado atuante na defesa do Judiciário, Nilson Naves é um crítico permanente dos problemas enfrentados pelo Poder. “O funcionamento do Judiciário desinquieta mais a nós próprios; tanto nos desassossega, que tem saído de nós, juízes, uma série de iniciativas. Não é crível debitar-se aos juízes a responsabilidade pelas apregoadas deficiências na administração da Justiça brasileira, entre elas a indigitada errônea distribuição das competências constitucionais, a carência de recursos financeiros, o formalismo processual, o déficit de juízes, os cargos vagos, a baixa remuneração e a lentidão”.
Nilson Naves elogiou os resultados alcançados pelo STJ com a implantação do projeto STJ na Era Virtual, ganhador do Prêmio Innovare. “O Tribunal, sabemos todos, sempre deu passos significativos na busca da excelência e da modernização. Com o apoio da tecnologia da informação, foi aqui dado impulso à digitalização de milhões de páginas de processos, implantou-se o sistema que permite a tramitação processual eletrônica no âmbito da Casa, também se iniciou a etapa de integração dos tribunais brasileiros ao projeto”, afirmou o ministro.
Para o ministro Nilson Naves, a expectativa é que nunca faltem propostas assim, ousadas, propostas que façam correr a Justiça e que deem efetividade ao processo. “Enfim, propostas que nos façam ver a solução, em todos os sentidos, dos processos que, hoje, ainda lotam as prateleiras de todo o Judiciário”, finalizou o decano.
Trajetória de sucesso
Ministro do STJ desde a sua instalação em abril de 1989, já integrava o TFR, no qual ingressou em 1985 pelo quinto constitucional reservado a membros do Ministério Público. Formado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais e doutor em Direito Penal, Nilson Naves iniciou sua carreira como advogado em seu estado natal, mas foi em São Paulo que ingressou no Ministério Público, no cargo de promotor substituto, chegando a promotor público titular, em 1976, e, finalmente, a procurador de Justiça, em 1982. Ficou à disposição do Supremo Tribunal Federal, de 1972 a 1981, período em que foi secretário jurídico e assessor de ministro. De 1981 a 1985, foi assessor da chefia do Gabinete Civil da Presidência da República, de onde saiu para assumir o cargo de ministro do TFR.
No STJ, Nilson Naves presidiu a Terceira Turma e a Segunda Seção, foi membro do Conselho da Justiça Federal, de 1992 a 1993, e diretor da Revista do Superior Tribunal de Justiça, de 1993 a 1995. Entre as atividades exercidas, foi membro suplente e, posteriormente, efetivo do Tribunal Superior Eleitoral, de 1995 a 1998, e corregedor-geral da Justiça Eleitoral, de 1997 a 1998. Ao assumir a presidência do STJ, Nilson Naves ficou também à frente da Corte Especial e do Conselho da Justiça Federal (CJF). Também foi o primeiro ministro a ocupar o cargo de diretor-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam).
Inovar é preciso
Ao cumprir os dois anos de mandato à frente da presidência do STJ, encerrado em abril de 2004, Nilson Naves optou por permanecer no Superior Tribunal e, sobretudo, por inovar. Retornou às turmas e seções de julgamento, só que, dessa vez, decidiu se dedicar a sua paixão: o direito penal, ramo do direito no qual se formou doutor. O ministro anteriormente teve uma longa atuação em direito privado (Terceira Turma e Segunda Seção).
O trabalho desenvolvido pelo ministro Nilson Naves na Sexta Turma foi descrito pela ministra Maria Thereza de Assis Moura como criativo e brilhante. “Moderno, é um humanista em suas posições. É um paladino da liberdade e sonha com ela. Polidez no trato, a temperança, a doçura, a justiça, a coragem – sua marca. Nesta tarde, um homem de acentuado espírito humanista encerra sua participação nesta Sexta Turma, mas não sua carreira”, salientou a ministra sobre Nilson Naves.
Despedida
As despedidas promovidas na Corte Especial, Terceira Seção, Sexta Turma e o lançamento da obra “Algumas decisões memoráveis” emocionaram o experiente magistrado. Nilson Naves disse viver dois sentimentos: a tristeza e a alegria. “A tristeza de deixar o convívio dos magistrados e a excelente SextaTurma, na qual me realizei. Levarei comigo boas lembranças. E a alegria de dever cumprido. Acho que completei a carreira guardando minhas convicções”, salientou.
Em sessão da Corte Especial, a aposentadoria do ministro Nilson Naves foi lamentada pelo presidente do STJ, ministro Cesar Asfor Rocha, ao criticar o limite legal dos 70 anos para a continuidade das atividades dos juízes: “É um luxo caríssimo que uma Corte como essa possa dispensar de seus quadros um julgador como Nilson Naves, levada pela legislação, cuja lógica não se faz perceptível com facilidade e não se faz priorizar os equilíbrios de Justiça”.
Representando os integrantes da Terceira Seção, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho relembrou a trajetória jurídica do ministro. Ele destacou que o ministro sempre conseguiu limitar a influência da mídia com a verdadeira extensão dos casos julgados. Napoleão Maia desejou sucesso e realização pessoal, ressaltando sua admiração pelo amigo.
Em nome da equipe de gabinete, a servidora Maria Aparecida Caixeta de Bezerra afirmou que valeu todo o trabalho desenvolvido durante todos os anos de convívio. “Juntos trabalhamos, lutamos, vivemos, acontecemos. Somos agradecidos por existir em nossas vidas. Somos agradecidos por fazer mais bela a história de cada servidor do seu gabinete. Se hoje somos mais ricos, é porque convivemos com Vossa Excelência”, disse.
Ao se despedir do ofício de magistrado, Nilson Naves recomendou que os ministros continuem sonhando, realizando, mudando o mundo e as pessoas, afinal de contas, se ele pudesse, faria tudo de novo.
Fonte: STJ