De ladrões de galinha a ladrões de celular. O objeto-alvo do crime pode mudar ao longo dos anos ou variar de preço, mas o furto (quando não há contato com a vítima) continua sendo um dos que mais resultam em prisão em Minas. O sistema carcerário do Estado tem mais detentos enquadrados por essa e outras práticas de menor potencial ofensivo (como ameaça e dano) – 38,5% – que por tráfico de drogas – 32,7% –, além de superar o total de delitos contra a vida (assassinato, roubo e estupro) – 26,8%.
Os dados são da Secretaria de Estado de Defesa Social e mostram que, embora a população carcerária tenha aumentado 50% nos últimos cinco anos, a violência continua em alta – o roubo subiu 24,37% de janeiro a julho, em comparação com o mesmo período de 2013. Para especialistas, é preciso inverter a lógica de prisão e só colocar na cadeia os criminosos envolvidos em crimes contra a vida e corrupção, que geram grande dano ao país.
“Senão, de um prejuízo de R$ 200 por conta de um celular furtado, a sociedade paga mais cerca de R$ 3.000 por mês para manter o ladrão na cadeia”, afirmou o juiz do Grupo de Monitoramento do Sistema Carcerário do Maranhão e estudioso no tema Douglas de Melo – em Minas, o gasto médio por preso é de R$ 2.000 mensalmente, segundo a Seds.
Cenário. O Estado tem atualmente 53.800 presos enquadrados em cerca de 81.527 crimes – alguns estão envolvidos em mais de um delito. A maioria (cerca de 26 mil) está na cadeia por tráfico de drogas. “Temos cerca de 200 mil presos no Brasil por tráfico, mais ou menos três vezes a população carcerária da Argentina. Se todos fossem traficantes, o tráfico no país já teria acabado”, disse Melo.
Para ele, os presídios estão lotados de dependentes químicos que vendem drogas para sustentar o vício e de ladrões de celular. “A criminalidade diminuiria muito se mudássemos o sistema, concentrando nossas forças em homicídio e crimes contra a vida. Os presídios estão tão cheios que viram crime organizado. Sinal de que há uma deformação, com mais valor para o patrimônio que a vida”, disse o juiz.
Na lista de crimes mais recorrentes entre os detentos, o homicídio aparece em quarto lugar, responsável por 7,8% dos enquadramentos (cerca de 6.300 presos) – menos que o furto, com 10,5% (8.500). O roubo, que tem o uso de violência, aparece com 17,9% (14,5 mil), menos que o total de crimes de menor potencial ofensivo, que somam 28% (22,8 mil). Essa ordem se mantém desde 2009, quando o sistema tinha 35.894 presos – 17,9 mil a menos que hoje.
O juiz da Vara de Execuções Penais de Belo Horizonte Marcelo Pereira, por sua vez, defende que o crescimento da população carcerária é fruto da criminalidade crescente nas ruas, e não de uma decisão da Justiça. Ele argumenta ainda que há mais presos por furto que por homicídio pelo fato do primeiro crime ser mais comum que o segundo. “Cada juiz toma a decisão de acordo com sua convicção, mas observo que prisão é usada em crimes com violência ou grave ameaça”.
Insegurança
52.674 roubos foram registrados em Minas nos últimos sete meses
Apacs
Além de penas alternativas para presos de menor periculosidade, as Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APACs) são vistas com bons olhos por especialistas para melhorar o sistema prisional e, de fato, ressocializar os detentos – nelas, presos trabalham e são responsáveis por sua recuperação. “É uma pena que sejam tão poucas no país. Nas Apacs, não importa o crime praticado, mas, sim, sua disposição em se ressocializar”, afirmou o juiz Douglas de Melo.
Estrutura. Em Minas, as Apacs são mantidas desde 2001. Hoje, há 33 unidades, maior número entre os Estados brasileiros, segundo o governo. A meta é criar mais oito. Em 2013, o Estado investiu R$ 20 milhões na manutenção das Apacs.
Prevenção. Para evitar o aprisionamento, a Seds diz que a principal estratégia é investir em prevenção. Há hoje cinco programas: Fica Vivo!, Mediação de Conflitos, Central de Acompanhamento de Penas e Medidas Alternativas (Ceapa), Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (PrEsp) e Programa de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.
Fonte: O Tempo