A participação do representante da Ordem dos Advogados do Brasil em comissões organizadoras de concursos públicos para juízes não se resume apenas a um papel fiscalizatório, mas também como agente elaborador de todo o processo, mesmo nas questões formuladas para os candidatos.
O entendimento é de alguns dos membros do Plenário do Conselho Nacional de Justiça, que se manifestaram ao analisar recurso administrativo interposto contra decisão monocrática que anulou a correção das provas de concurso para o cargo de juiz substituto no Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Os conselheiros sequer chegaram a decidir sobre a questão de mérito — em que candidatos já aprovados pediam a manutenção de sua aprovação a despeito do cancelamento do procedimento de correção — porque entenderam que o concurso ocorreu sem a ampla e devida participação do representante da OAB, obrigação que decorre de norma constitucional.
Ao analisar recurso em procedimento de controle administrativo na manhã desta terça-feira (2/4), o Plenário do CNJ acabou suspendendo o julgamento após pedido de vista do corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão. O processo trata de recurso interposto por candidatos aprovados no concurso para juiz substituto no TJ-ES que pretendiam assegurar sua aprovação mesmo com o reconhecimento da nulidade da correção das provas subjetivas e das provas de sentença cível e criminal.
O concurso havia sido suspenso há mais de seis meses por inobservância de normas estabelecidas pelo próprio CNJ. Em dezembro de 2012, o relator do processo, conselheiro José Lucio Munhoz, autorizou a continuidade do processo de seleção, determinando, porém, que se refizesse a correção das provas. Munhoz reconheceu que as normas estabelecidas pela Resolução 65 do CNJ não haviam sido cumpridas, como a devida nomeação da banca examinadora, a publicação dos nomes escolhidos, o prazo para pedidos de impugnação dos membros da banca, a participação de um membro da OAB, a lavra secreta dos votos e sua devida publicação.
A decisão previa a anulação da correção das provas subjetivas e de sentença cível por queixas de ausência de critérios claros na correção pela entidade organizadora, o Cespe/UnB, ocorrendo, ainda, a inclusão, nas provas, de conteúdos não previstos no edital.
O conselheiro relator negou, nesta terça-feira, provimento ao recurso, mantendo a “recorreção” das provas para todos os candidatos. Os demais conselheiros questionaram, contudo, a manutenção do processo de seleção a despeito da correção ter sido cancelada, chegando também a discutirem o fato de a comissão central do concurso contar com a participação do representante da OAB, mas não a comissão examinadora.
Munhoz justificou dizendo que o CNJ não havia ainda se manifestado em definitivo sobre a competência e responsabilidade da OAB em concursos para juízes, embora concordasse que a participação da OAB compreendesse também as fases de elaboração do conteúdo e de exame das provas. Porém, o relator justificou que preferiu abordar apenas o mérito do recurso, lembrando que a prova foi tecnicamente bem elaborada, sendo anulada apenas uma questão pela comissão examinadora. Munhoz reiterou, contudo, que “a correção não foi plural, e que pecou pela falta de clareza e transparência”, já que teria sido feita por apenas um membro da banca.
O conselheiro Silvio Rocha sugeriu então a “solução técnica” de se estender a anulação a todo o processo seletivo. Alguns conselheiros aproveitaram para debater sobre o papel exercido pela OAB em concursos para juízes, com alguns deles argumentando que este deveria ser meramente fiscalizatório. O conselheiro Jorge Hélio ponderou que, ao se terceirizar a elaboração e a aplicação das provas ao Cespe, a participação da Ordem ficaria restrita naturalmente à comissão geral organizadora.
“Uma coisa é a elaboração científica das provas. A OAB participava da comissão organizadora, já a execução científica do concurso foi delegada ao Cespe”, disse ainda o conselheiro Wellington Saraiva.
“A banca deve gozar de autonomia científica. O Poder Judiciário não tem, em princípio, autoridade para decidir sobre os critérios científicos utilizados na elaboração da prova. Como ficaria essa autonomia se há uma comissão acima da banca?”, questionou o presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa. No entanto, o conselheiro Wellington Saraiva lembrou que cabe, sim, à banca fiscalizar a comissão elaboradora quando for verificada a ocorrência de irregularidades, como a cobrança de conteúdos não previstos em edital.
Divergindo do relator, o presidente do CNJ e os demais conselheiros reconheceram que havia questões preliminares que deveriam ser discutidas antes de se abordar o mérito específico do recurso em si. O relator reconheceu que, em razão de o representante da OAB não ter participado de todo o processo, cabia a anulação total do concurso, mas que, naquele momento, tratava apenas do recurso interposto pelos candidatos aprovados. Munhoz afirmou também que a conclusão sobre a competência da OAB na elaboração de processos seletivos para juízes repercutiria em um “entendimento novo” pelo CNJ.
O ministro Joaquim Barbosa insistiu, porém, que havia problemas graves em relação à organização do concurso para que apenas a fase da correção das provas fosse anulada e refeita. "Como vamos convalidar um concurso com essas características, com uma comissão [de correção] secreta?", disse o presidente do CNJ.
“A Ordem deve participar de todas as etapas, mesmo da elaboração das provas. A participação da Ordem agrega transparência, mas também tem o papel de contribuir com a elaboração do processo”, disse ainda o secretário-geral da OAB Nacional, Cláudio de Souza Neto, presente na manhã desta terça.
O Plenário do CNJ suspendeu o julgamento depois que o corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão, pediu vista. Os conselheiros seguiram por maioria, vencido o relator, a proposta do conselheiro Neves Amorim de acolher medida cautelar sugerida durante uma das sustentações orais, suspendendo, assim, provisoriamente o procedimento do concurso público.
Fonte: Conjur